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42 - Consulta pública do Programa de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais

Comentario

Consulta pública do Programa de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais

 

 

Periodo de realizacao:

Data Inicio: 22/07/2024                                                    Data Fim: 09/08/2024

 


A presente Consulta Pública tem o objetivo de coletar contribuições da sociedade para construção colaborativa do Programa de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais, que estabelece os parâmetros para a execução das medidas socioeducativas de internação provisória, internação sem tempo determinado, internação-sanção e semiliberdade, previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, no âmbito das Unidades Socioeducativas de Minas Gerais.

 


 

O Programa de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais estabelece os parâmetros para a execução das medidas socioeducativas de internação provisória, internação sem tempo determinado, internação-sanção e semiliberdade, previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, no âmbito das Unidades Socioeducativas de Minas Gerais. Nesse sentido, conforme estabelecido na Deliberação do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente de Minas Gerais nº 01/2022, o Programa de Atendimento Socioeducativo abarca o referencial para o funcionamento e a organização das condições necessárias para a execução das medidas socioeducativas a partir dos parâmetros obrigatórios e específicos definidos na legislação vigente. O Programa de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais se propõe a apresentar o desenho de uma dinâmica organizacional que fomente e promova a centralidade dos aspectos pedagógicos e a garantia de direitos no âmbito das medidas socioeducativas, oportunizando um melhor ambiente aos(às) adolescentes e aos (às) jovens que se encontram em Unidades de privação ou de restrição de liberdade ligadas à SUASE. Busca-se, ainda, o alinhamento das orientações que emanam das normas que regem o Sistema Socioeducativo, propondo, também, inovações, como a abordagem de temas até então não contemplados nos instrumentos normativos que regulam a execução das medidas socioeducativas em Minas Gerais.

 


 

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APRESENTAÇÃO

O Programa de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais estabelece os parâmetros para a execução das medidas socioeducativas de internação provisória, internação sem tempo determinado, internação-sanção e semiliberdade, previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, no âmbito das Unidades Socioeducativas de Minas Gerais. Nesse sentido, conforme estabelecido na Deliberação do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente de Minas Gerais nº 01/2022, o Programa de Atendimento Socioeducativo abarca o referencial para o funcionamento e a organização das condições necessárias para a execução das medidas socioeducativas a partir dos parâmetros obrigatórios e específicos definidos na legislação vigente.

O Programa de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais se propõe a apresentar o desenho de uma dinâmica organizacional que fomente e promova a centralidade dos aspectos pedagógicos e a garantia de direitos no âmbito das medidas socioeducativas, oportunizando um melhor ambiente aos(às) adolescentes e aos (às) jovens que se encontram em Unidades de privação ou de restrição de liberdade ligadas à SUASE. Busca- se, ainda, o alinhamento das orientações que emanam das normas que regem o Sistema Socioeducativo, propondo, também, inovações, como a abordagem de temas até então não contemplados nos instrumentos normativos que regulam a execução das medidas socioeducativas em Minas Gerais.

O artigo 227 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 enfatiza a responsabilidade compartilhada entre família, sociedade e Estado quando se trata de garantir a crianças e adolescentes a devida proteção e o respeito a seus direitos fundamentais. Nos casos de adolescentes a quem se atribui a autoria de ato infracional, a Lei Federal nº 12.594 de 2012, que institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), corrobora tal disposição e estabelece que a execução dasmedidas socioeducativas deverá agregar os aspectos sancionatório e pedagógico concomitantemente, de forma que seja possível alcançar os objetivos propostos a cada caso. O SINASE orienta, ainda, que a família e a sociedade precisam estar envolvidas no processo socioeducativo, corroborando com as disposições constitucionais.

No Estado de Minas Gerais, a Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo (SUASE), vinculada à Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública - SEJUSP, é órgão gestor da execução das medidas socioeducativas de privação e de restrição de liberdade. Cabe à SUASE/SEJUSP, de forma direta ou por meio de parcerias, realizar o atendimento aos(às) adolescentes a quem foi atribuída autoria de ato infracional em total observância à legislação e aos princípios vigentes no Brasil, além dos atos regimentais, normativos e à Política de Atendimento Socioeducativo estabelecidos em âmbito estadual. Desse modo, coube à SUASE a construção do presente Programa de Atendimento Socioeducativo, de modo a estruturar e a sintetizar neste documento a proposta pedagógica de atendimento aos(às) adolescentes que se encontram em Unidades Socioeducativas de privação e de restrição de liberdade, como forma de promover processos que visam a responsabilização dos(as) adolescentes, o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários e a promoção e a garantia de direitos individuais esociais estabelecidos na legislação brasileira.

Ao longo dos anos, a SUASE elaborou e aplicou vários documentos orientadores para a execução da política de atendimento socioeducativo, como as metodologias de atendimento e os regimentos próprios das medidas de internação e de semiliberdade, bem como as metodologias da internação provisória e internação-sanção. Desse modo, o presente Programa de Atendimento Socioeducativo parte de acúmulo de experiências práticas e de instrumentos teórico-metodológicos norteadores que foram adotados, executados e avaliados ao longo de anos no Estado de Minas Gerais.

Para a elaboração do Programa de Atendimento, inaugurou-se um processo de construção coletiva que visava ir além, incorporando temáticas pouco ou não abordadasaté o momento, como a visibilidade do público feminino e do público LGBTI1 (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis, queer, intersexo, assexuais e pansexuais), o temada letalidade de adolescentes e de jovens, a prevenção da violência institucional, o protagonismo juvenil, além do destaque à dimensão pedagógica das medidas socioeducativas.

O processo de construção do Programa de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais abarcou a mobilização de atores internos (gestores, trabalhadores e colaboradores do Sistema Socioeducativo) e externos (Ministério Público, Defensoria Pública, Poder Judiciário, Secretarias Estaduais, Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, organizações da sociedade civil, projetos vinculados a universidades, entre outros). Todos esses atores sociais compuseram a Comissão de Elaboração do Programa de Atendimento Socioeducativo, constituída pela SUASE em fevereiro de 2022. Tal Comissão se subdividiu em 11 (onze) grupos de trabalho temáticos (GTs), os quais se organizaram para pesquisar, estudar, discutir, desconstruir ideias e construir novas propostas para a socioeducação, o que foi sistematizado em forma de textos. Destaca-se que o GT que se dedicou à temática do Protagonismo Juvenil desenvolveu metodologia para envolver os(as) adolescentes na construção do Programa, de modo que o público destinatário da política pública participasse de maneira ativa nas discussões realizadas.

Em seguida, a Coordenação da Comissão, por meio da Diretoria de Orientação Socioeducativa (DOS/SUASE), realizou a organização e a revisão dos textos, buscando integrar e articular a multiplicidade de ideias e propostas construídas nos GTs, de forma coerente, coesa e alinhada às normas e às diretrizes já estabelecidas para o Sistema Socioeducativo. Várias discussões foram realizadas a partir da primeira versão do texto sistematizado, retornando aos GTs, às Unidades Socioeducativas e às Diretorias daSUASE para revisão e aprimoramentos. Por meio desse processo participativo, democrático, plural e inovador no âmbito do Sistema Socioeducativo estadual e nacional, construiu-se o presente Programa de Atendimento, amplamente discutido, pensado e redigido a várias mãos.

1 Neste documento usar-se-á a sigla LGBTI, conforme também utilizada na Resolução CNJ nº 348 de 23 de outubro de 2020. Contudo, todo o conteúdo e produção relativa a este Programa de Atendimento se estende à existência de outras orientações sexuais, expressões de gênero e identidades de gênero existentes e que ainda possam surgir ao longo do tempo.

Espera-se, pois, que este seja um marco na trajetória do Sistema Socioeducativo de Minas Gerais e que produza efeitos concretos, no sentido de fortalecer as medidas socioeducativas enquanto processo pedagógico de responsabilização e garantia de direitos aos(às) adolescentes, viabilizando condições reais para seu reposicionamento subjetivo e o rompimento com a dinâmica infracional.

A partir da publicação do Programa de Atendimento Socioeducativo, a SUASE promoverá a análise e a atualização dos demais documentos regimentais e orientadores já existentes no âmbito estadual. Dessa forma, todo o regimento estará alinhado às diretrizes estabelecidas neste Programa que se apresenta como farol a guiar os próximos anos do Sistema Socioeducativo em Minas Gerais, com foco na perspectiva garantista e na dimensão pedagógica das medidas socioeducativas.

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1. BASES LEGAIS E CONCEITUAIS DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO

A Doutrina da Proteção Integral foi inaugurada no Brasil a partir da década de 1990, após a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, em 1988. Em seguida, em âmbito internacional deu-se a assinatura da Convenção sobre os Direitosda Criança, da Organização das Nações Unidas, documento ratificado pelo Brasil em 1990, mesmo ano em que foi promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)

– Lei nº 8.069.

O ECA e a Doutrina da Proteção Integral promoveram importantes mudanças no direito e nas políticas públicas destinados às crianças e aos(às)adolescentes, garantindo a eles(as) o status de sujeitos de direitos e não mais de objetos da tutela do Estado. O ECA exigiu, também, um importante reordenamento institucional que separou em instituições de atendimento distintas às crianças e aos(às)adolescentes em situação de vulnerabilidade social e violações de direitos dos(as) adolescentes autores(as) de atos infracionais. Nessa perspectiva, surgiram os primeiros Centros Socioeducativos voltados exclusivamente ao atendimento de adolescentes aos (às) quais foram atribuídas a autoria de atos infracionais. Já às crianças e aos(às)adolescentes em situação de vulnerabilidade ou vítimas de violências, o atendimento socioassistencial passou a ser executado em rede própria, seja em equipamentos nos territórios, seja, em último caso, em instituições de acolhimento.

Nesse sentido, o ECA apresentou a definição legal de adolescência, considerando adolescente a pessoa “entre doze e dezoito anos de idade” (artigo 2º) e inaugurou uma nova fase de responsabilização do(a) adolescente a quem se atribui a autoria de um ato infracional no Brasil.

Os atos infracionais são ações relevantes, de caráter penal, que se configuram como transgressão a leis vigentes. O ato infracional é, pois, uma ação consideradacontrária à lei, descrita como crime ou contravenção penal, praticada por um(a) adolescente. Conforme previsto no ECA, os(as) adolescentes, enquanto sujeitos de direitos e também de obrigações, devem responder pelos atos infracionais que lhe foram atribuídos, respeitado o devido processo legal. Nesse sentido, a legislação brasileira busca garantir os direitos humanos dos(as) adolescentes e, também, formas adequadas de responsabilização aos(às) autores(as) de atos infracionais submetidos(as) à execução de medidas socioeducativas.

Quando um(a) adolescente pratica um ato infracional, ele(a) poderá ser submetido(a) às medidas socioeducativas elencadas no artigo 112 do ECA:

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

  1. - advertência;
  2. - obrigação de reparar o dano;
  3. - prestação de serviços à comunidade;
  4. - liberdade assistida;
  5. - inserção em regime de semiliberdade;
  6. - internação em estabelecimento educacional;
  7. – qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. (BRASIL, 1990)

A advertência e a reparação do dano são medidas socioeducativas que envolvem o Poder Judiciário e o(a) adolescente autor da infração. A execução das medidas de prestação de serviço à comunidade e de liberdade assistida são de competência dos Municípios, nos termos do ECA e do SINASE (art. 5º da Lei nº 12.594/2012). Já as medidas de semiliberdade e de internação, bem como a de internação provisória e a de internação- sanção, são da competência do Estado (art. 4º da referida lei) e, por isso, são objeto deste Programa de Atendimento.

As medidas que restringem ou privam o(a) adolescente de liberdade, ou seja, a semiliberdade e a internação, somente devem ser aplicadas quando esgotadas as possibilidades de aplicação de outra medida que possa ser cumprida em meio aberto (liberdade assistida e prestação de serviço à comunidade, por exemplo).

De acordo com o ECA (artigo 122), somente poderá ser aplicada a medida privativa de liberdade quando: a) o ato infracional for cometido mediante grave ameaça ou violência à pessoa; b) quando houver prática reiterada de outras infrações graves; c) devido ao descumprimento reiterado e injustificável de outra medida socioeducativa anteriormente imposta. Neste último caso, o prazo de internação não excederá a 3 (três) meses e é denominada internação-sanção. Além disso, o Estatuto é claro ao determinar que em hipótese alguma a medida de internação será aplicada se houver outra medida mais adequada.

A execução das medidas de restrição e de privação de liberdade traz para os Estados o desafio e a oportunidade de – enquanto o(a) adolescente se encontra sancionado(a), atravessado(a) pela responsabilização objetiva em decorrência do ato infracional praticado – fomentar autonomia, responsabilização subjetiva, fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários e promover o acesso a direitos fundamentais nuncaantes garantidos ou ofertados de forma precária pelo Estado, pela sociedade e pela família.

Nesse contexto, é preciso emergir formas de gestão e de execução das medidas socioeducativas que sejam garantidoras de direitos humanos aos destinatários da política de atendimento socioeducativo, tornando-se imprescindível a centralidade das práticas pedagógicas nas Unidades que, dentre outros objetivos, visam minimizar os efeitos nocivos da privação/restrição de liberdade e propiciar atendimento capaz de contribuir efetivamente para o retorno do(a) adolescente ao convívio social e familiar.

Esse encargo é atribuído ao Estado, cabendo a este, por seus agentes e equipamentos, adotar as ações e as estratégias adequadas, nos termos das obrigações expressamente definidas nos diversos diplomas legais, com destaque para a Lei Federal nº 12.594 de 2012 que instituiu o SINASE. Tal lei é balizadora deste Programa de Atendimento, pois apresenta os princípios a serem observados pelos Estados para a regular execução das medidas socioeducativas, a saber: legalidade; excepcionalidade da intervenção judicial e imposição de medidas; prioridade a práticas ou a medidas que sejam restaurativas; proporcionalidade em relação ao ato cometido; brevidade da medida; individualização, considerando-se a idade, as capacidades e as circunstâncias pessoais do(a) adolescente; mínima intervenção, restrita ao necessário para a realização dos objetivos da medida; não discriminação do(a) adolescente, em razão de etnia, de gênero, de nacionalidade, de classe social, de orientação religiosa, política ou sexual, ou de associação ou de pertencimento a qualquer minoria ou status; e fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários no processo socioeducativo (BRASIL, 2012, art. 35).

 

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2.COMPETÊNCIA INSTITUCIONAL DA SUASE

A SUASE é o órgão do governo do Estado de Minas Gerais que tem como competência planejar, disciplinar, organizar, coordenar, gerir, supervisionar e executar a política de atendimento socioeducativo, com vistas a promover a integração social e a interrupção da trajetória infracional do(a) adolescente em cumprimento de medida socioeducativa de restrição e privação de liberdade.

À SUASE cabe articular parcerias com instituições públicas, privadas e organizações da sociedade civil com o intuito de fortalecer a Política de Atendimento Socioeducativa; realizar o monitoramento, a avaliação e a fiscalização do atendimentonas Unidades Socioeducativas, a fim de verificar a efetividade e a qualidade das medidas socioeducativas executadas; além de garantir a aplicação das metodologias deatendimento da SUASE nos diversos modelos de gestão de Centros Socioeducativos, Casas de Semiliberdade, Centros de Internação Provisória e APACs.

A SUASE é composta por duas superintendências, sendo uma delas voltada ao atendimento e a outra à gestão administrativa do Sistema Socioeducativo, e se subdividem em diretorias que respondem por áreas temáticas, como: Educação e Profissionalização; Saúde do(a) Adolescente; Atendimento Técnico; Segurança Socioeducativa; Gestão de Parcerias; Gestão de Vagas; Monitoramento e Avaliação entre outras. Por meio das diretorias, superintendências e assessorias da SUASE, é que se dá a gestão, acompanhamento, monitoramento, avaliação e fiscalização da execução das medidas socioeducativas junto às Unidades que executam o atendimento inicial, a internação provisória, a internação-sanção, a internação por tempo indeterminado e a semiliberdade, sobre as quais abordaremos brevemente.

2.1 ATENDIMENTO INICIAL

A Comarca de Belo Horizonte conta com uma Unidade de atendimento inicial denominada Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente Autor de Ato Infracional de Belo Horizonte (CIA/BH).

O CIA-BH é um plantão interinstitucional para atendimento inicial integrado e célere aos (às) adolescentes a quem se atribui autoria de ato infracional, apreendidos(as) na Capital mineira, conforme preconiza o art. 88, V do Estatuto da Criança e do Adolescente. Inaugurado em dezembro de 2008, o CIA-BH tem por objetivo atender ao(à) adolescente na apuração da prática de atos infracionais, quanto na aplicação e execução das medidas socioeducativas, por meio da integração operacional de instituições públicos que compõem o Sistema de Justiça Infracional e as políticas públicas estadual e municipal responsáveis pela execução das medidas socioeducativas.

Desse modo, em um único prédio, estão alocados a Vara Infracional da Infância e Juventude, a Promotoria da Infância e Juventude, a Defensoria Pública da Capital, o setor técnico da Prefeitura de Belo Horizonte para atendimento às medidas em meio aberto, setor técnico e de segurança da Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo (SUASE).

A equipe da SUASE no CIA-BH é composta por servidores das carreiras de Agente de Segurança Socioeducativa, Analistas (equipe técnica) e Assistentes Executivos de Defesa Social (equipe administrativa), subordinados à Direção Geral vinculada à SUASE. Compete à SUASE no CIA-BH zelar pela integridade física, mental e emocional dos(as) adolescentes atendidos, realizar procedimentos de segurança socioeducativa, encaminhar o(a) adolescente ao alojamento e às demais repartições existentes nas dependências do CIA/BH quando solicitado, promover o encaminhamento de adolescentes aos Centros de Internação Provisória, Centros Socioeducativos e Casas de Semiliberdade, mediante determinação judicial; dentre outras atividades.

São, também, atribuições da SUASE no CIA-BH: realizar acolhida e atendimento qualificado aos(às) adolescentes, levantar informações do(a) adolescente e da rede relacionada ao caso; colher e registrar contatos de familiares; encaminhar informe técnico aos órgãos do Sistema de Justiça Infracional; contatar familiares ou responsáveis legais para promover a entrega do(a) adolescente liberado no CIA-BH, mediante termo; promover o retorno protegido do(a) adolescente à sua família, quando necessário; acionaros serviços e equipamentos da rede socioassistencial e de saúde para encaminhamentos necessários; além de outras atividades correlatas.

2.2 INTERNAÇÃO PROVISÓRIA

A internação provisória tem natureza cautelar e está prevista no artigo 108 do ECA. Pode ser aplicada pelo prazo máximo de 45 (quarenta em cinco dias), até que seja proferida sentença e segue os mesmos princípios da medida socioeducativa de internação, a saber: brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento

O Estatuto determina que a internação provisória deverá ser fundamentada ebasear- se em indícios suficientes de autoria e de materialidade, demonstrada a necessidade imperiosa da medida.

Não há um período mínimo estabelecido para a internação provisória, o que significa que os(as) adolescentes podem ser desligados em um curto prazo, o que, porsua vez, precisa ser observado pelas Unidades Socioeducativas na proposição e na execução de ações pedagógicas assertivas.

Como o processo judicial ainda se encontra em apuração, a autoria do ato infracional é suposta e este momento de indeterminação pode gerar expectativas eansiedade aos(às) adolescentes e às suas famílias, o que precisa ser acolhido e trabalhado pelas equipes socioeducativas, visando minimizar os efeitos negativos daprivação de liberdade.

As Unidades Socioeducativas que executam a internação provisória, sem desconsiderar as limitações de tempo que a medida cautelar impõe, devem possibilitar a garantia de acesso a direitos fundamentais, como a oferta de educação escolar na modalidade de acompanhamento pedagógico, o acesso à saúde, às atividades de cultura, de esporte e de lazer, o atendimento às referências familiares e afetivas dos(as) adolescentes, a articulação com a rede de atendimento ao(à) adolescente e à família no território de origem.

Deve ser garantido ao(à) adolescente atendimento individual e atividades coletivas durante sua permanência na internação provisória e, após o desligamento, cabe à equipe socioeducativa realizar o contrarreferenciamento para a Unidade de destino do(a) adolescente (nos casos de aplicação das MSE de internação ou de semiliberdade), à equipe de atendimento socioeducativo no território (no caso de aplicação de MSE em meio aberto) ou à rede de proteção do Município (caso não seja aplicada MSE).

2.3 INTERNAÇÃO-SANÇÃO

A internação-sanção, prevista no art. 122, inciso III, do ECA, constitui medida privativa de liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, que poderá ser aplicada quando houver descumprimento reiterado e injustificável da medida socioeducativa anteriormente imposta. Desse modo, a internação-sanção não se origina inicialmente da prática de um ato infracional, mas, sim, do descumprimento de uma medida socioeducativa anteriormente aplicada.

O prazo não poderá ser superior a 3 (três) meses e a sua execução implica em oferta de atividades pedagógicas obrigatórias e a manutenção de permanente articulação e integração entre a equipe socioeducativa da internação-sanção e a equipe socioeducativa da medida anteriormente imposta (semiliberdade, liberdade assistida ou prestação de serviços à comunidade), para onde o(a) adolescente retornará após o término do cumprimento da internação-sanção.

A internação-sanção tem como objetivo a responsabilização do(a) adolescente pelo descumprimento da medida socioeducativa a que foi anteriormente sentenciado e, por consequência, pelo ato infracional cometido. A partir disso, a sanção visa possibilitar a ele(a) a reinauguração de sua relação com a medida socioeducativa anterior e, ao mesmo tempo, permitir uma ressignificação de sua responsabilidade nos momentos de liberdade.

Com o término da internação-sanção, a equipe socioeducativa deverá realizar o contrarreferenciamento para a equipe da semiliberdade ou das medidas em meio aberto para onde retornará o(a) adolescente.

Historicamente, em Minas Gerais, a internação-sanção foi executada em Unidades Socioeducativas nas quais há internação-provisória. A partir da publicação deste Programa de Atendimento,serão construídos os parâmetros e revisão de ato normativo deforma que os(as) adolescentes cuja determinação judicial estabelecer o prazo de sanção entre 31(trinta e um) e 90 (noventa) dias, passem a ser alocados e incluídos nas atividades e rotinas da medida socioeducativa de internação sem tempo determinado. Os(as) adolescentes cuja determinação judicial estabelecer o prazo de sanção de até 30 (trinta) dias, permanecerão alocados e inseridos em atividades e rotinas da internação provisória. Essa importante mudança visa ampliar a garantia de direitos aos(às) adolescentes que cumprirão internação-sanção por maior período de tempo, podendo ser matriculados(as) em escola regular e inseridos(as) em cursos e atividades de profissionalização que exigem maior carga horária.2

2.4 INTERNAÇÃO 

A medida socioeducativa de internação, prevista no art.121 do ECA, constituimedida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. É a medida socioeducativa mais gravosa e somente deve ser imposta ao(à) adolescente quando não houver outra medida mais adequada.

Destina-se, pois, a adolescentes que cometeram reiterados atos infracionais graves, que praticaram atos mediante violência ou grave ameaça à vítima.Tal medida não comporta determinação de prazo de término, sendo legalmente limitada à duração máxima de 3 (três) anos, com desligamento compulsório no caso de jovens que completem 21 (vinte e um) anos em cumprimento de medida socioeducativa.Importa salientar que na execução da MSE de internação não há exigibilidade de tempo mínimo

2 A partir da publicação deste Programa de Atendimento a SUASE realizará adequação de outros documentos orientadores e metodologia de atendimento da internação-sanção. de cumprimento para a proposição do desligamento/progressão, considerando que a lei apregoa que a avaliação da medida pode ocorrer a qualquer tempo, e que o próprio caso, com suas peculiaridades, é que deve apontar para a necessidade de manutenção ou de finalização da privação da liberdade.

Durante o período de cumprimento da MSE de internação nenhum direito do(a) adolescente pode ser restringido senão em virtude de decisão judicial. Nesse sentido, embora privados(as) do direito à liberdade, os(as) adolescentes, deverão ter garantidosos demais direitos fundamentais, como: oferta de educação escolar regular; atenção à saúde; atividades de profissionalização; espaços de convivência familiar e comunitária, com atendimento técnico aos(às) adolescentes e às suas referências familiares e afetivas; articulação da rede de atendimento ao(à) adolescente e família no território de origem; atividades de cultura, esporte e lazer; garantia de segurança e inviolabilidade da integridade física no âmbito institucional; assistência religiosa entre outros.

Além das atividades internas, que compõem a rotina institucional das Unidades Socioeducativas, em Minas Gerais existe a previsão metodológica de que os(as) adolescentes em regime de internação possam realizar atividades externas tanto acompanhados(as) por representantes das Unidades Socioeducativas quanto desacompanhados(as). Nessa perspectiva, as atividades externas são essenciais ao processo de socioeducação, pois potencializam o exercício da cidadania, o fomento da autonomia e do protagonismo, além de fortalecer o processo de responsabilização, haja vista o contato do(a) adolescente com a liberdade e as experiências de acesso a direitos por meio dos serviços e equipamentos da cidade. A participação de adolescentes em atividades externas reverbera no interior das Unidades que, a partir do princípio da incompletude institucional, devem estar em permanente movimento de abertura e de fomento às atividades extramuros enquanto propostas pedagógicas.

Desta forma, salvo decisão judicial em contrário, cabe à equipe socioeducativa a avaliação e a inserção do(a) adolescente em tais atividades, conforme demandas e intervenções necessárias ao cumprimento dos eixos do Plano Individual de Atendimento (PIA). Nessa avaliação, faz-se fundamental observar os critérios para a realização de atividades externas previstos no Regimento Único dos Centros Socioeducativos do Estado de Minas Gerais.

A MSE de internação deve ser reavaliada de forma sistemática, no máximo a cada 06 (seis) meses, podendo, contudo, tal reavaliação ser realizada a qualquer momento, a partir da construção e dos estudos de caso que embasam a produção dos relatórios, essenciais para o processo de avaliação da medida socioeducativa.

Nos casos em que for determinada a progressão para a semiliberdade ou a medida em meio aberto, cabe à equipe socioeducativa do Centro Socioeducativo realizar o contrarreferenciamento para a Unidade/equipe de destino do(a) adolescente. Nos casos de desligamento por extinção/cumprimento da medida socioeducativa, deve-se realizar o contrarreferenciamento para as redes de atendimento no território de origem do(a) adolescente (escolar, de saúde, assistência social, profissionalização etc.).

2.5 SEMILIBERDADE

A medida socioeducativa de semiliberdade, prevista no art.120 do ECA, pode ser determinada desde o início ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial. A execução da semiliberdade deve se dar priorizando, sempre que possível, os recursos disponíveis na comunidade (escola, saúde, educação, profissionalização, assistência social), o que faz do momento de liberdade a questão central da medida.

Nesse sentido, a localização geográfica das Casas de Semiliberdade busca atender, de preferência, adolescentes do entorno ou territórios próximos, de modo a favorecer os vínculos socioafetivos, culturais e institucionais locais. Na execução da medida de semiliberdade, tais vínculos se constituem enquanto amparos sociais a fim de favorecer o processo de desligamento dos(as) adolescentes e auxiliar na interrupção de sua trajetória infracional.

Tal medida não comporta determinação de prazo de término, sendo legalmente limitada à duração máxima de 3 (três) anos, com desligamento compulsório no caso de jovens que completem 21 (vinte e um) anos em cumprimento de medida socioeducativa. Salienta-se que na execução da MSE de semiliberdade não há exigibilidade de tempo mínimo de cumprimento para a proposição do desligamento/progressão, considerando que a lei apregoa que a avaliação da medida pode ocorrer a qualquer tempo, e que o próprio caso, com suas peculiaridades, é que deve apontar para a necessidade demanutenção ou de finalização da restrição da liberdade.

Durante o período da semiliberdade, todos(as) os(as) adolescentes deverão ter garantidos: a oferta de educação escolar regular, a atenção à saúde, as atividades de profissionalização e a inserção no mercado de trabalho, os espaços de convivênciafamiliar e comunitária, com atendimento técnico aos(às) adolescentes e às suas referências familiares e afetivas; a articulação da rede de atendimento ao(à) adolescentee à família no território de origem; as atividades de cultura, de esporte e de lazer; a garantia de segurança e de inviolabilidade da integridade física no âmbito institucional, a assistência religiosa, entre outros. Além da oferta interna de tais garantias na rotina institucional das Casas de Semiliberdade, é imprescindível a oferta externa, por meio da rotina individual do(a) adolescente.

A rotina individual, que inclui as saídas e as atividades externas de cada adolescente, deve ser elaborada com base no PIA, de modo a propiciar a execução dos resultados esperados a partir da oferta da liberdade inerente a esta medida. Quando há impeditivos de circulação do(a) adolescente no município ou em territórios específicos,cabe à equipe socioeducativa daCasa de Semiliberdade construir as estratégias necessárias a fim de garantir oferta qualificada e segura dos dispositivos metodológicos aos(às) adolescentes.

A MSE de semiliberdade deve ser reavaliada de forma sistemática, no máximo a cada 06 (seis) meses, podendo, contudo, tal reavaliação ser realizada a qualquer momento, a partir da construção e dos estudos de caso que embasam a produção dos relatórios, essenciais para o processo de avaliação da medida socioeducativa.

Nos casos em que for determinada a progressão para as medidas em meio aberto, cabe à equipe socioeducativa daCasa de Semiliberdade realizar o contrarreferenciamento para a equipe de destino do(a) adolescente.

Em se tratando de determinação judicial de regressão da medida socioeducativa de semiliberdade para a internação – nos casos em que o(a) adolescente foiinicialmente progredido(a) da internação para a semiliberdade, mas descumpriu tal medida, por exemplo, ensejando a regressão -, cabe também à equipe socioeducativa daCasa de Semiliberdade realizar o contrarreferenciamento para a equipe do Centro Socioeducativo de destino do(a) adolescente. A regressão de medida é a retomada da medida originalmente aplicada, por reiteração no cometimento de outras infrações graves e/ou por descumprimento reiterado e injustificável da medida atualmente em curso. Quando de sua aplicação prevalece, em qualquer caso, o princípio da excepcionalidade.

Nos casos de desligamento por extinção/cumprimento da medida socioeducativa, deve-se realizar o contrarreferenciamento para as redes de atendimento no território de origem do(a) adolescente (escolar, de saúde, assistência social, profissionalização etc.).

 

Comentario

3. MODELOS DE GESTÃO ESTADUAL DO ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO

O atendimento socioeducativo no Estado de Minas Gerais, em qualquer modelo de gestão, assenta-se na observância dos princípios norteadores da Administração Pública explicitamente previstos no art. 37 da Constituição Federal de 1988.

Entende-se por modelo de gestão a forma adotada para a execução de determinada política pública. No caso específico da execução da política de atendimento socioeducativo no Estado de Minas Gerais, vigoram, atualmente, quatro modelos degestão, quais sejam:

a) Modelo de gestão direta: a Administração Pública é a responsável pela execução integral da medida socioeducativa, estabelecendo as diretrizes metodológicas, o monitoramento e a avaliação da execução da medida socioeducativa; garantindo a integralidade dos recursos humanos, insumos e equipamentos necessários ao funcionamento das Unidades;

b)     Modelo de cogestão: gestão em parceria com entidades privadas sem fins lucrativos, no qual a Administração Pública é a responsável pelas diretrizes metodológicas, pelo monitoramento e pela avaliação da medida socioeducativa, com descentralização da execução para a entidade privada sem finalidade lucrativa;

c)   Modelo híbrido: gestão em parceria com entidades privadas sem fins lucrativos, no qual a Administração Pública é a responsável pelas diretrizes metodológicas, pelo monitoramento e pela avaliação da medida socioeducativa, bem como pela execução exclusiva de atividades específicas de manutenção da ordem e da segurança nas Unidades Socioeducativas, com descentralização das demais atividades necessárias à execução dos eixos da medida socioeducativa para a entidade privada sem finalidade lucrativa;

d)   Modelo APAC: gestão em parceria com a Fraternidade Brasileira de Assistência aos Condenados(FBAC) na qual a Administração Pública é a responsável pelo monitoramento e pela avaliação da medida socioeducativa, com descentralização da execução para a associação civil de direito privado sem fins lucrativos.

 

No que tange aos modelos de gestão adotados pelo Estado de Minas Gerais em parceria com entidades privadas sem fins lucrativos (cogestão e gestão híbrida), estas podem se dar por meio de Termo de Colaboração celebrado com Organização da Sociedade Civil (OSC), com fulcro na Lei Federal nº. 13.019/2014 e no Decreto Estadual nº 47.132/2017 (Modelo MROSC); ou por meio de Contrato de Gestão celebrado com Organização Social (OS), com fulcro na Lei Estadual nº 23.081/2018 e no Decreto Estadual nº 47.553/2018 (Modelo OS).

Além disso, o Estado de Minas Gerais encontra-se em tratativas para implementação de Unidades Socioeducativas por meio de parceria público-privada na modalidade concessão administrativa, que prevê a construção, a implantação, a operação e a manutenção de duas novas Unidades Socioeducativas. Trata-se de projeto de iniciativa do Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos - UNOPS, escolhido como estudo de caso no Fórum Internacional de Parcerias Público-Privadas (PPPs), no intuito de qualificar a execução das medidas socioeducativas de internação no âmbito do Estado, visando maior efetividade no rompimento da trajetória infracional.

Importante destacar que todas as Unidades Socioeducativas, independentemente do modelo de gestão adotado, estão submetidas às diretrizes metodológicas, normativas, regimentos, orientações, monitoramento e fiscalização da Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo.

 

Comentario

4. UNIDADES SOCIOEDUCATIVAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS

O Sistema Socioeducativo de Minas Gerais é regionalizado, buscando dar efetividade ao disposto no art. 124, VI do ECA que garante ao(à) adolescente o direito de permanecer em localidade mais próxima de seu domicílio ou de seus pais durante o cumprimento da medida socioeducativa. Desse modo, há 41 (quarenta e uma) Unidades Socioeducativas em 20 (vinte) municípios distintos, sendo 23 (vinte e três) Centros Socioeducativos (executam medida socioeducativa de internação, de internação- sanção e de internação provisória), 17 (dezessete) Casas de Semiliberdade (executam medida socioeducativa de semiliberdade), e 01 (uma) APAC Juvenil (executa medida socioeducativa).

A APAC Juvenil de Frutal inaugurou um projeto, de ordem experimental,de um Centro Socioeducativo com base na metodologia APAC, tornando-se parte do Sistema Socioeducativo mineiro sem prescindir do método desenvolvido ao longo dos anos nas APACspara o público adulto, aliando o método APAC às diretrizes e orientações metodológicas da SUASE.

Dentre os Centros Socioeducativos que atendem adolescentes em cumprimento de medidas de internação provisória, de internação-sanção e de internação por tempo indeterminado, há uma Unidade em Belo Horizonte destinada ao atendimento de adolescentes do sexo feminino e, também, à população transgênero (homens trans, mulheres trans e travestis), sendo, pois, considerada uma Unidade mista.

A Tabela 1 apresenta os Centros Socioeducativos, a medida executada, o público atendido, o município onde estão situados, o modelo de gestão adotado e a capacidade de atendimento.

Tabela 1 – Centros Socioeducativos de Minas Gerais

Fonte: Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo – SUASE, 2023

 

Dentre as 17 (dezessete) Casas para atendimento exclusivo da medida de semiliberdade, 01 (uma) delas, a Casa Santa Amélia, é destinada ao atendimento de adolescentes do sexo feminino e, também, à população transgênero (homens trans, mulheres trans e travestis), sendo, pois, considerada, uma Unidade mista situada em Belo Horizonte. A Tabela 2 apresenta as Casas de Semiliberdade que executam exclusivamente a medida socioeducativa de semiliberdade e também a APAC que, emsua estrutura, destina espaços específicos para a execução das medidas privativas de liberdade, além da semiliberdade.

Tabela 2 – Casas de Semiliberdade de Minas Gerais

Fonte: Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo – SUASE, 2023.

A capacidade total e oficial de atendimento do Sistema Socioeducativo de Minas Gerais é de 1.606 (mil seiscentos e cinquenta e seis) adolescentes, sendo 1.259 (mil duzentas e cinquenta e nove) vagas para adolescentes em privação de liberdade (internação provisória, internação-sanção e internação por prazo indeterminado) e 347 (trezentas e quarenta e sete) vagas de semiliberdade.

4.1 GESTÃO DE VAGAS

A gestão das vagas disponíveis nas Unidades Socioeducativas de Minas Gerais se dá por meio do serviço da Central de Vagas, com fulcro nas diretrizes da Resolução nº 367, de 19/01/2021, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Em 15 de dezembro de 2021 foi assinada a Resolução Conjunta SEJUSP/TJMG/MPMG/DPMG/PCMG Nº 18, relativa à implementação e à regulamentação da Central de Vagas no Sistema Socioeducativo mineiro. Participaram daconstrução e da formulação da referida Resolução os representantes máximos das instituições que participam do procedimento de atribuição de ato infracional a adolescentes, quais sejam: Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (SEJUSP), Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG), Corregedoria-Geral deJustiça do Estado de Minas Gerais (CGJ/TJMG), Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) e Polícia Civil do Estado de Minas Gerais (PCMG).

Conforme disposto no art. 1º da mencionada Resolução Conjunta, a Central de Vagas se constitui em serviço de gestão e de coordenação das vagas para cumprimento de internação provisória, de internação-sanção, de medida socioeducativa de internação e de semiliberdade nas Unidades mineiras e está alocada no âmbito da Diretoria de Gestão de Vagas e Atendimento Jurídico (DVJ) da SUASE.

Assim, a partir de 26 de abril de 2022 iniciaram-se as operações da Central de Vagas, que abarcam: recepção e cadastramento, no sistema informatizado próprio, das solicitações de ingresso de adolescentes nas UnidadesSocioeducativas, contendo a determinação judicial; atualização permanente dos cadastros de adolescentes que aguardam vagas nas UnidadesSocioeducativas; diligência junto às direções das Unidades para que cumpram a obrigação de manter o sistema atualizado no que se refere às vagas disponíveis e ocupadas; acessar os dados de adolescentes em sistemas informatizados, mantendo as informações atualizadas e respeitando seu sigilo; e fornecimento de informações, disponibilizando-as ao Poder Judiciário, ao MPMG e à DPMG, quando solicitadas, ressalvadas as regras previstas no art. 144 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.

A Central de Vagas tem por finalidade tornar objetivos os procedimentos relativos à gestão de vagas para adolescentes a quem se atribui autoria de ato infracional junto às Unidades Socioeducativas, fornecendo parâmetros concretos para verificação da possibilidade de atendimento das solicitações de vaga, bem como apontando, de pronto, a Unidade Socioeducativa mais adequada. Isso se dá por meio da aplicação de fórmula matemática, que leva em conta aspectos como: gravidade do ato infracional; se o ato se deu na forma tentada ou consumada; se houve emprego de violência ou grave ameaça à pessoa; se houve uso de arma de fogo; a situação de apreensão do adolescente; a faixa etária; se houve aplicação anterior de uma ou de mais medidas socioeducativas; adistância entre o território de origem do(a) adolescente e as Unidades Socioeducativas com vagas disponíveis. Tais informações são extraídas da documentação enviada pelo Poder Judiciário.

Por meio da Central de Vagas processam-se, também, os pedidos de transferências de adolescentes entre as Unidades Socioeducativas, observando-se ofluxo de análise conjunta e interna da SUASE, que envolve a Diretoria de Segurança Socioeducativa (DSS), a Diretoria de Orientação Socioeducativa (DOS) e, quando couber,a Diretoria de Atenção à Saúde do Adolescente (DAS). Também são registrados, pormeio da Central de Vagas, situações de evasão, de fuga e de desligamento por cumprimento de medida.

4.1.1 Fluxo de transferência entre Unidades Socioeducativas

Transferência é a movimentação do adolescente entre Unidades Socioeducativas. Não se trata de um dispositivo metodológico para execução da medida e, portanto, não devem ser usadas como alternativa nos casos em que a unidade tem dificuldade de enlaçaro(a) adolescente na execução da medida ou em que as intervenções com o(a) adolescente estão limitadas ou esgotadas.

As transferências dos(as) adolescentes em cumprimento de medida de internação e de semiliberdade, além da internação provisória, podem ser provocadas pelas próprias unidades executoras, pelo Poder Judiciário, ou até mesmo pela SUASE, a partir de uma avaliação gerencial do Sistema Socioeducativo.

Os pedidos de transferência formulados pelas Unidades Socioeducativas devem ser embasados na necessidade do caso, considerando, especialmente, a possibilidade de qualificação da execução da medida em razão da aproximação com o município de moradia da família, garantindo-se a convivência familiar e comunitária ou, como recurso estratégico diante de algum evento de segurança, visando a preservação da integridade física e psicológica dos(as)adolescentes.

Para ordenar as movimentações de adolescentes no Sistema Socioeducativo mineiro, em 2019 a SUASE instituiuum fluxo de transferência que estabelece que a Unidade deverá encaminhar à SUASE um relatório contendo a apresentação do caso e o motivo que ensejou o pedido de transferência, além do impacto que a movimentação trarápara o cumprimento da medida/eixos. O relatório deve ser construído com as equipes técnicas e de segurança, de forma analítica, e assinado por todo o corpo diretivo da Unidade. É importante destacar que o pedido de transferência representa a posição institucional da equipe socioeducativa frente ao caso e, por isso, é de suma importância que todos os atores estejam envolvidos nessa construção.

Os pedidos realizados pelas Unidades devem ser direcionados à Diretoria deGestão de Vagas e Atendimento Jurídico (DVJ), que acionará o fluxo interno da SUASE, que ocorre da seguinte forma: as Diretorias de Orientação Socioeducativa (DOS) e de Segurança Socioeducativa (DSS) analisam a dimensão qualitativa de favorecimento da execução da medida institucionalmente, de acordo com a necessidade do caso, além de uma perspectiva de continuidade da medida considerando todas as ações anteriormente realizadas. Nos casos em que as questões de saúde precisam ser consideradas, as Diretorias envolvidas no fluxo poderão acionar ainda a Diretoria de Atenção à Saúde do Adolescente (DAS). Para a avaliação qualitativa das Diretorias sobre o caso, são realizados contatos com os diretores das Unidades e, quando necessário, poderão ser realizados estudos de caso para emissão do parecer de transferência.

Os pareceres produzidos pelas diretorias são registrados nos processos que tratam das transferências e encaminhados para a Superintendência de Atendimento ao Adolescente (SAAD) e após, à Diretoria de Gestão de Vagas e Atendimento Jurídico. Em seguida, a DVJ, por meio da Central de Vagas, executa os procedimentos administrativos para a transferência.

Salienta-se que, conforme previsto na Resolução Conjunta SEJUSP/TJMG/MPMG/DPMG/PCMG Nº 18, que regulamenta a Central de Vagas do Sistema Socioeducativo mineiro, as vagas demandadas via fluxo de transferência terão precedência em relação às demais solicitações de vaga. Além desse ponto, faz-se importante mencionar que as vagas solicitadas, via fluxo de transferência, que visam garantir a integridade física dos adolescentes e jovens ou preservar os casos em risco iminente de morte são priorizadas.

Além disso, ainda em conformidade com os trâmites estabelecidos para funcionamento da Central de Vagas, tem-se que as transferências determinadas pelo Poder Judiciário também detêm prioridade de atendimento, conforme disponibilidade de vaga nas Unidades de destino.

Ademais, a depender do motivo que fundamentou o pedido de transferência, pode se fazer necessária, após a prolação de parecer favorável pela SUASE, a obtenção de autorização judicial para efetivação da movimentação do(a) adolescente, com manifestação do Ministério Público e da defesa. Trata-se das transferências motivadas pela pertinência da  aproximação  do(a)  adolescente  ao  domicílio  dos  pais  ou responsáveis, pela necessidade de adequação da capacidade de Unidades Socioeducativas ou outras razões diversas. Somente após autorização do Juízo realiza-seo cadastro da transferência no sistema informatizado da Central de Vagas, com consequentes trâmites administrativos.

Quanto às transferências realizadas para gerenciamento de crises ou emergências identificadas pelas equipes das Unidades, no intuito de garantir a integridade física e psíquica dos adolescentes, não se faz necessária prévia autorização judicial, mas tão somente comunicação posterior ao Juízo competente, dada a urgência e a precedência concedidas a tais casos.

Outrossim, a normativa que regulamentou a Central de Vagas no Sistema Socioeducativo mineiro prevê, ainda, o procedimento relativo às transferências decorrentes de modificação de medida socioeducativa, seja na hipótese de substituição da semiliberdade por internação (regressão) ou desta pela semiliberdade (progressão),em razão de recurso, por decisão do Juiz da Execução, ou ainda por imposição de medida mais grave em outro processo.

Nos casos de regressão e progressão, as vagas destinadas às transferênciasserão direcionadas preferencialmente a estas, em face das solicitações de vaga, conforme regra geral prevista no ato normativo.

Já quando há imposição de medida mais gravosa em outro processo, é necessário que o Juízo da Execução que acompanha a medida vigente seja notificado, para eventualmente realizar a reavaliação do programa socioeducativo, no prazo de 5 (cinco) dias. Se nesse ínterim não sobrevier retorno quanto à reavaliação, a vaga deve ser disponibilizada para cumprimento da medida relativa à solicitação de vaga mais recente. Todavia, se houver reavaliação, com entendimento judicial pela manutenção da medida anterior, menos gravosa, procede-se à comunicação do Juízo que impôs a medida mais gravosa acerca da não movimentação do(a) adolescente.

Por fim, destaca-se que, mesmo com precedência sobre os pedidos de vaga, as transferências são atendidas conforme disponibilidade de vaga nas Unidades Socioeducativas de destino, podendo ocorrer de um caso ser direcionado à fila de espera para aguardar o surgimento de vaga disponível. Nesses casos, a Diretoria de Gestão de Vagas e Atendimento Jurídico da SUASE é encarregada de informar ao solicitante sobre a inserção da demanda na fila e, assim que houver alteração no cenário, promover a liberação de vaga para realizar a movimentação.

4.2 EQUIPE SOCIOEDUCATIVA

A equipe socioeducativa é formada pelos profissionais (gestores, técnicos, agentes de segurança socioeducativos, socioeducadores, monitores, auxiliares educacionais, oficineiros, administrativos, serviços gerais) que atuam nas Unidades Socioeducativas de privação ou restrição de liberdade e é responsável por executar a proposta pedagógica da socioeducação, em conformidade com a legislação e diretrizes vigentes.

Cada Unidade conta com sua própria equipe socioeducativa, que deve ser organizada conforme os parâmetros do SINASE e, ainda que composta por profissionais de áreas diversas e que possuem atribuições diferentes e específicas na prática socioeducativa, deve estar alinhada ao propósito institucional de ofertar condições adequadas de atendimento para que os(as) adolescentes possam cumprir a medida socioeducativa judicialmente imposta. 

Equipe Diretiva

Nos Centros Socioeducativos a equipe diretiva é composta por: Direção Geral, Direção de Atendimento e Direção de Segurança.

A Direção Geral é a responsável pela gestão da Unidade Socioeducativa, função essa que envolve as questões administrativas e de recursos humanos, mas também técnicas, no que se refere à garantia de um atendimento qualificado ao adolescente e em consonância com as legislações pertinentes e as diretrizes da SUASE. Compete ao(à) diretor(a) geral a função primordial de garantir que haja um trabalho integrado entre a equipe de atendimento e a de segurança. Estes dois pilares devem caminhar juntos na execução do trabalho dentro da Unidade.

A Direção de Atendimento está subordinada à Direção Geral e tem como função assegurar a execução qualificada do atendimento ao(à) adolescente, em consonância com as determinações legais e as orientações da SUASE. Tem como missão transmitir os fundamentos norteadores do atendimento e assegurar a execução qualificada dos dispositivos metodológicos. Estão sob a orientação do(a) Diretor(a) de Atendimento os profissionais das equipes técnica, de saúde, de auxiliares educacionais e oficineiros. Além dessa gestão de recursos humanos, o(a) Diretor(a) de Atendimento deve orientar e supervisionar os técnicos quanto ao atendimento prestado ao(à) adolescente e aos familiares, realizar a articulação com a equipe de segurança socioeducativa da Unidade, a escola e a rede de atendimento externo.

A Direção de Segurança está subordinada à Direção Geral e tem como função assegurar o trabalho qualificado da equipe de segurança da unidade, garantindo que ele se dê em consonância com as determinações legais e as orientações da SUASE.

O(a) Diretor(a) de Segurança tem sob sua direção toda a equipe de segurança socioeducativa (supervisores de segurança, coordenadores de equipe, agentes de segurança socioeducativa, socioeducadores e monitores) e, além de realizar a gestão de recursos humanos, deve orientar, organizar e supervisionar o trabalho dessa equipe de modo que a segurança socioeducativa garanta as condições necessárias para o devido cumprimento dos eixos da medida socioeducativa pelos(as) adolescentes, buscando permanente integração e articulação com a equipe técnica e Direção de Atendimento.

Nas Casas de Semiliberdade a equipe diretiva é composta pela Direção Geral e pela Direção de Segurança, inexistindo a figura da Direção de Atendimento, cujas atribuições são desenvolvidas pelo(a) Diretor(a) Geral. Desta maneira, além das mesmas funções inerentes à Direção Geral dos Centros Socioeducativos, o(a) Diretor(a) Geral da Casa de Semiliberdade também é referência imediata para a equipe técnica e para os auxiliares educacionais, devendo orientar e supervisionar os profissionais quanto ao atendimento prestado ao(à) adolescente e aos familiares, realizar a articulação com a equipe de segurança socioeducativa da Unidade, a escola e a rede de atendimento externo. O Diretor de Segurança na semiliberdade desempenha funções correlatas à s do(a) Diretor(a) de segurança dos Centros  Socioeducativos,  respeitadas as especificidades da medida socioeducativa.

Processo de Escolha dos Dirigentes 

O processo de escolha dos dirigentes de Unidades Socioeducativas é realizado em observância às exigências da Lei do SINASE (art. 17), que estabelece como requisitos mínimos para o exercício da função de dirigente de semiliberdade e internação: “[...] I - formação de nível superior compatível com a natureza da função; II - comprovada experiência no trabalho com adolescentes de, no mínimo, 2 (dois) anos; e III - reputação ilibada.” (BRASIL, 2012). Além disso, a SUASE pode estabelecer editais próprios de seleção de dirigentes para Unidade Socioeducativa sob gestão direta do Estado. 

No caso de Unidades de cogestão, de gestão híbrida e da APAC Juvenil, as organizações parceiras realizam processo seletivo próprio, também em observância às exigências do SINASE.Cumpre destacar que a SUASE, no seu dever de acompanhar, monitorar e fiscalizar a execução das medidas socioeducativas no estado, poderá recomendar à instituição parceira a substituição do corpo diretivo de Unidade Socioeducativa caso identifique desalinhamento metodológico que comprometa o trabalho inerente à socioeducação.

Equipe de Segurança Socioeducativa

A prática da equipe de segurança nas Unidades Socioeducativas de Minas Gerais se baseia no princípio legal que norteia o trabalho nas medidas socioeducativas, disposto no art. 125 do ECA: “É dever do Estado zelar pela integridade física e mental dos internos, cabendo-lhes adotar as medidas adequadas de contenção e segurança”. (BRASIL, 1990). A atuação do agente de segurança socioeducativa de que trata a Lei nº 15.302 de 10 de agosto de 2004 pauta-se em ações de prevenção e na promoção de direitos, não se configurando em uma segurança de viés tradicionalista e repressiva. Por analogia, a atuação dos socioeducadores e dos monitores segue a mesma perspectiva. Dessa maneira, o agente de segurança socioeducativo, o socioeducador e o monitor devem criar condições para que as medidas de semiliberdade, de internação, de internação provisória ou de internação-sanção possam ser cumpridas a partir de um viés educativo, em consonância com as legislações vigentes e as diretrizes da SUASE.

Compete a esses profissionais acompanhar o(a) adolescente na sua rotina diária: autocuidado, escolarização, cursos profissionalizantes, oficinas, atendimentos técnicos, atividades esportivas, culturais e de lazer, dentre outras.

O papel da equipe de segurança em uma Unidade Socioeducativa é fundamental, pois tais profissionais atuam diretamente na garantia da segurança física, psicológica e emocional dos(as) adolescentes por meio da mediação das relações e dos conflitos entre os(as) adolescentes, observação ativa da movimentação e das interações sociais dos(as) adolescentes, favorecimento do diálogo e da comunicação não violenta, prevenção ao agravamento dos conflitos, intervenção imediata diante de situações e de eventos de segurança, respeitados os limites das competências de cada categoria profissional.

Desta maneira, a atuação da segurança socioeducativa pauta-se pela mediação de conflitos e o diálogo, exercendo-se o uso moderado da força apenas quandoextremamente necessário.

No que se refere às atribuições gerais e específicas a serem desempenhadas por cada componente da equipe de segurança das Unidades Socioeducativas, estas estão pormenorizadas na Política de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais (2012), nas Normas e Procedimentos de Segurança do Sistema Socioeducativo de Minas Gerais (NORPSS-2022), bem como nos Regimentos dos Centros Socioeducativos e das Casas de Semiliberdade de Minas Gerais (2017).

Com a adoção de modelos diversos de gestão das Unidades Socioeducativas (gestão direta, cogestão e gestão híbrida), existem, também, distintas configurações para as equipes de segurança, de modo que nas Unidades de gestão direta a equipe de segurança é composta em sua totalidade por agentes de segurança socioeducativa; as Unidades de cogestão contam com socioeducadores; e as Unidades de gestão híbrida há agentes de segurança socioeducativa e monitores.

Independentemente da configuração da equipe, essa deve trabalhar pautando-se em ações de prevenção e na promoção de direitos, com intervenções socioeducativas pautadas no viés pedagógico das medidas socioeducativas, por meio do diálogo e da observância aos procedimentos operacionais que, por sua vez, visam garantir o cumprimento da rotina institucional com pleno atendimento aos eixos da medida socioeducativa preconizada na Política de Atendimento da SUASE. A equipe de segurança está subordinada ao Diretor de Segurança, trabalhando de forma integrada com as demais áreas e equipes.

Equipe de Atendimento

Para atingir os objetivos das medidas socioeducativas faz-se necessária a formação de uma equipe capaz de atender o(a) adolescente a partir do que ele(a)apresenta sobre si mesmo e sobre suas relações sociais. Considerando a complexidade dos casos, isso exige a consolidação de uma equipe interdisciplinar, de modo que cada área de formação, com suas especificidades, possa contribuir na construção de conhecimento sobre os casos, havendo, obrigatoriamente, a necessidade de interlocução entre todas as áreas.

Importante destacar que a noção de equipe não se restringe à coexistência de vários profissionais em uma mesma situação de trabalho ou à simples troca de informações. Equipe pressupõe reciprocidade e necessidade de enriquecimento mútuo, de modo que, por meio de diálogo compreensível, os saberes dos diversos campos do conhecimento se aproximem e promovam, efetivamente, a socioeducação.

As equipes de atendimento nos Centros Socioeducativos são compostas pelos seguintes profissionais: Analista de Qualquer Formação Superior, Analista Técnico Jurídico, Assistente Social, Psicólogo, Pedagogo, Terapeuta Ocupacional, Enfermeiro, Auxiliar de Enfermagem, Dentista, Auxiliar em Saúde Bucal e Auxiliares Educacionais, Oficineiros. Nas Casas de Semiliberdade as equipes possuem: Advogado, Assistente Social, Psicólogo, Pedagogo, Terapeuta Ocupacional, Auxiliares Educacionais e Oficineiros.

Ressalta-se que, para definição do quantitativo de profissionais da equipe de atendimento, a SUASE considera os parâmetros estabelecidos na Resolução nº 119 de 2006 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), sem prejuízo a adequações fundamentadas em estudos de força de trabalho conforme a natureza e necessidades específicas de cada Unidade Socioeducativa.

No que se refere às atribuições gerais e específicas a serem desempenhadas por cada componente da equipe técnica das Unidades de internação e de semiliberdade, registre-se que elas estão elencadas pormenorizadamente na Política de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais (2012), bem como no Regimento Único dos Centros Socioeducativos do Estado de Minas Gerais e no Regimento Único das Unidades de Execução MSE de Semiliberdade.

Equipe Administrativa e Equipe de Serviços Gerais

As Unidades Socioeducativas precisam ter como retaguarda uma equipe administrativa responsável por prover as condições necessárias ao bom funcionamento da Unidade no tocante à parte administrativa, às finanças, à organização de documentações dos(das) adolescentes e dos(as) trabalhadores(as), das diárias de viagens, do almoxarifado, entre outros.

A equipe de serviços gerais, também imprescindível à execução das medidas socioeducativas, tem por atribuição realizar atividades de lavanderia, de transporte, de manutenção de bens e de equipamentos, de telefonia, de alimentação, de serviços gerais, entre outros. Essa equipe é formada por auxiliares de serviços gerais, por porteiros e motoristas. Reitera-se que tais profissionais compõem a comunidade socioeducativa, de modo que o desempenhar de suas funções deve estar alinhado com a proposta pedagógica desenvolvida na instituição.

O detalhamento das atribuições e das responsabilidades de cada cargo/função dos membros da equipe socioeducativa (corpo diretivo, equipe técnica, equipe de segurança, equipe de auxiliares educacionais e de serviços gerais) está contido no Regimento Único dos Centros Socioeducativos do Estado de Minas Gerais (2018) e no Regimento Único das Unidades de Execução da Medida Socioeducativa de Semiliberdade (2017).

4.3 COMUNIDADE SOCIOEDUCATIVA

A comunidade socioeducativa é formada pelo coletivo de atores envolvidos na dinâmica de execução das medidas socioeducativas, os quais estão em constante interação no ambiente institucional. Dessa forma, compõem a comunidade socioeducativa o corpo diretivo da Unidade; as equipes de atendimento, de segurança, administrativa e de serviços gerais, os profissionais vinculados à escola; os parceiros externos, as famíliase os(as) próprios(as) adolescentes.

É imprescindível que todos os atores se reconheçam parte da comunidade socioeducativa, visto que tal compreensão é terreno fértil para ampliar as possibilidades de intervenções pedagógicas e abordagens preventivas, tratando de temas afetos às relações interpessoais, aos propósitos das normas, procedimentos e da rotina institucional e promovendo discussões e alinhamentos sobre as responsabilidades compartilhadaspela comunidade socioeducativa no cotidiano das medidas.

O senso de comunidade propicia que cada ator se aproprie de sua parcela de responsabilidade e possa contribuir, a partir de suas capacidades e potencialidades, para o incremento de um ambiente institucional favorável ao desenvolvimento de práticas verdadeiramente pedagógicas, que viabilizem, em seu curso, o encontro do(a) adolescente com a responsabilização e com a garantia de direitos, criando condiçõespara que este(a) possa retomar sua vida em liberdade ao final da medida.

Com essa perspectiva, a Unidade Socioeducativa precisa investir na promoção e na qualificação de espaços coletivos, tais como oficinas, assembleias, rodas de conversa, grupos e eventos, bem como deve se valer de intervenções por meio de práticas restaurativas e de mediação de conflitos visando favorecer a cultura de paz, a comunicação não violenta, o protagonismo juvenil, a responsabilização dos(as) adolescentes e a corresponsabilização da comunidade socioeducativa.

4.4 POLÍTICA DE FORMAÇÃO E QUALIFICAÇÃO CONTINUADA

Os parâmetros executivos do SINASE consolidam a perspectiva de que o êxito das medidas se materializa na concretização de seu caráter pedagógico e garantista e está relacionado à qualidade da gestão dos programas e do atendimento ofertado. Nesses termos, torna-se fundamental promover formação continuada aos profissionais, visto que este é um importante pilar de sustentação do Sistema Socioeducativo. No âmbito da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (SEJUSP), a Superintendência Educacional de Segurança Pública (SESG) é responsável pelas atividades de recrutamento e seleção, formação, capacitação e de treinamento contínuo dos(as) servidores(as).

As ações formativas são planejadas e estruturadas desde a seleção de pessoal que atuará no atendimento ao(à) adolescente. Busca-se qualidade e efetividade em consonância com normativas e legislações, orientações do SINASE e os parâmetros da Escola Nacional de Socioeducação (ENS), para que a metodologia e os conteúdos curriculares garantam aos profissionais condições para uma atuação qualificada na promoção e defesa dos direitos dos(as) adolescentes.

A Educação Profissional da SEJUSP é desenvolvida por meio da formação e do treinamento de profissionais para desenvolver competências necessárias ao desempenho das funções e se baseia no respeito às leis e na promoção e na proteção dos Direitos Humanos.

As atividades formativas obedecem ao disposto nas Diretrizes de Educação Profissional, nos atos normativos e nos instrumentos operacionais e pedagógicos.Assim, são princípios que fundamentam a Educação Profissional da SEJUSP: pluralismo deideias e concepções pedagógicas; valorização profissional; formação e qualificação profissional continuada; garantia do padrão de qualidade;qualificação profissional de basehumanística, técnica, científica e estratégica, permitindo o acompanhamento da evolução das diversas áreas do conhecimento; e valorização das boas práticas desenvolvidas na área da segurança pública.

Nesse sentido, as atividades formativas da Educação Profissional da SEJUSP são desenvolvidas nas modalidades presencial, semipresencial e à distância, sendo certo que a Formação no âmbito da SEJUSP compreende:

  • Curso de Formação Técnico Profissional (CFTP): destinado à formação dos Agentes de Segurança Socioeducativa, conforme previsão legal, aprovados em etapas de concurso público, habilitando-os para o exercício de suas atividades profissionais;
  • Curso Introdutório: destinado aos demais servidores não contemplados no CFTP, que ingressarem na SEJUSP aprovados em concursos públicos ou por meio de processo seletivo simplificado para contratação temporária de excepcional interesse público, observada a legislação vigente;
  • Curso de Habilitação: destinado a habilitar servidores para o desempenho defunções e atividades específicas, como por exemplo para integrar o Grupo de Ações Rápidas (GAR).

Além dessas ofertas, promovem-se treinamentos, que são eventos de educação continuada e complementar, com as atividades que fomentam a melhoria ou a atualização de competências relativas à prática profissional, e o estágio supervisionado, que é a prática profissional desenvolvida no ambiente de trabalho para a preparação do novo profissional para desempenhar uma função.

Durante o estágio os profissionais devem ser orientados e supervisionados por servidor(a) qualificado, atuante na área, sendo certo que os estágios são realizados mediante planejamentos específicos da SESG, observados os planos de ensino dos cursos.

As ações da SESG se iniciam com a elaboração do perfil profissiográfico3do cargo, que busca analisar competências necessárias à realização das atividades e ao melhor desempenho da função. As etapas no processo de construção do perfil são:

3 O Perfil Profissiográfico é um instrumento de levantamento de informações que tem como objetivo analisar quais as competências necessárias para o desenvolvimento das funções das carreiras.

  • 1ª etapa: aplicação de questionários e, a partir dos dados obtidos e analisados, investigação dos eixos que carecem de maior aprimoramento;
  • 2ª etapa: reuniões presenciais e escuta por meio da metodologia brainstorming, sendo os(as) participantes estimulados(as) a responder sobre as ações e as atividades executadas no cotidiano profissional no âmbito da segurança pública;
  • 3ª etapa: verificação, por meio de entrevista com equipe de gestores diretamente ligados ao cargo em estudo, das principais lacunas nas atividades desempenhadas e da expectativa do gestor quanto ao desempenho do servidor ocupante do cargo.

O processo de análise viabiliza a identificação das áreas de maior interesse e de menor conhecimento, definindo os temas que necessitam capacitação e ampliação de saber.Assim, dá-se início à elaboração do Plano de Ensino e, posteriormente, à construção do Caderno Educacional, documento guia do aluno e material didático docurso ou treinamento, que podem ser elaborados pela SUASE, pelos docentes ou pela SESG.

Sob essa perspectiva, o planejamento anual de cursos e de treinamentos doSistema Socioeducativo é realizado pela SESG junto à SUASE, fomentando a participação de profissionais com conhecimento especializado sobre as temáticas solicitadas.

O ingresso nas atividades formativas ocorre por processo seletivo ou por disponibilização direta de vagas, garantindo-se publicidade prévia dos critérios de acesso.Podem atuar como docentes/instrutores servidores da SUASE, convidados de outros órgãos públicos e da sociedade civil, respeitando-se os critérios descritos nos instrumentos normativos.

Além das ações de formação realizadas pela SESG, a SUASE realiza, desde 2021, o projeto #ConexãoSocioeducativa, um espaço integrado voltado ao debate e à produção de estudos técnicos e científicos sobre a socioeducação com o objetivo de propor reflexões quanto aos modelos, aos processos e os procedimentos no âmbito da Política de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais. O #ConexãoSocioeducativa busca oportunizar o intercâmbio de saberes, a construção de conhecimentos e a proposição de novas práticas entre os diversos atores que integram a rede de atendimento ao adolescente autor de ato infracional, as equipes socioeducativas, as universidades, as organizações da sociedade civil e os(as) próprios jovens e adolescentes.

O projeto é composto por duas frentes: webinários ou encontros presenciais temáticos, cujos pontos de discussão são levantados por meio do acompanhamento da SUASE junto às Unidades Socioeducativas; e as rodas de conversa virtuais com servidores públicos e colaboradores contratados de todas as Unidades do Estado, abordando temas atinentes ao fazer profissional de cada área de formação.Os webinários temáticos podem ser acessados por meio da plataforma da SESG, no formato de Trilhade Aprendizagem. Instituições parceiras do Sistema Socioeducativo também realizam ações de formação profissional para os trabalhadores das Unidades, como o Núcleo de Pesquisa Psicanálise e Laço Social no Contemporâneo (Psilacs/UFMG), que executa o ProgramaJá É. Nesse projeto, é ofertado o atendimento psicanalítico individual supervisionado a adolescentes e jovens em cumprimento de medida socioeducativa de internação e de semiliberdade em Belo Horizonte e Ribeirão das Neves, a partir da demanda das Unidades. Além das ações específicas com os(as) adolescentes, o Programa Já É também oferta seminários para os trabalhadores de Unidades Socioeducativas nas áreas de adolescência, saúde mental, violência e letalidade juvenis, no sentido de proporcionar espaços onde os atores possam refletir sobre a prática e se sintam capazes de construir alternativas frente aos desafios que a adolescência traz ao cotidiano do trabalho.

Outro parceiro importante para o Sistema Socioeducativo é o Instituto Alair Martins (IAMAR), responsável pelo financiamento dos materiais didático-pedagógicos dos programas desenvolvidos pela OSC Junior Achievement Minas Gerais (JAMG), que é uma das maiores organizações sociais incentivadoras de adolescentes e jovens no mundo, estimulando e desenvolvendo-os para o mercado de trabalho,por meio do método "aprender-fazendo". O IAMAR também financia cursos eZAPe para adolescentes que se encontram em cumprimento de medida socioeducativa e, anualmente, os servidores/colaboradores das Unidades Socioeducativas que se voluntariam são capacitados para aplicação desses cursos aos(às) adolescentes. Os treinamentos ocorrem no formato presencial ou à distância, com certificação, e são planejados eacompanhados pela SUASE, por meio da Diretoria de Formação Educacional, Profissional, Esporte, Cultura e Lazer (DFP).

No que concerne às Unidades Socioeducativas geridas em cogestão ou em gestão híbrida, as instituições que atuam como parceiras na execução das medidas socioeducativas devem promover atividades de treinamento/formação continuada com temáticas alinhadas às metodologias e às diretrizes da política de atendimento adotadas pela SUASE, com vistas a aprimorar e qualificar cada vez mais o atendimento aos (às) adolescentes.

As ações de treinamento/formação continuada promovidas pelas entidades parceiras a seus trabalhadores não excluem a possibilidade de participação destes nas ações formativas da SESG/SEJUSP e, de forma complementar, oportuniza aos profissionais acesso a diversificados espaços de formação.

4.5 PESQUISAS CIENTÍFICAS EM SOCIOEDUCAÇÃO

A Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública - SEJUSP conta com o Observatório de Segurança Pública que, entre suas atribuições, é responsável por gerenciar a realização de pesquisas acadêmicas no âmbito da Secretaria.

Alunos de graduação e pós-graduação, bem como pesquisadores e instituições interessados em realizar pesquisas em Unidades Socioeducativas devem apresentar a demanda ao Observatório de Segurança Pública que, por conseguinte, acionará a SUASE para análise do projeto e emissão de parecer acerca da viabilidade de execução. Tal análise é pautada por critérios técnicos, bem como pelos princípios e garantias de direitos dos(as) adolescentes estabelecidos na legislação brasileira. Ao(à) adolescente que participa de pesquisa acadêmica deve ser assegurada a plena ciência e compreensão acerca da pesquisa e seus objetivos, a livre adesão, o anonimato e a vedação dedivulgação de qualquer dado que possa identificá-lo(a).

As Unidades Socioeducativas, a partir do princípio da incompletude institucional, devem buscar parcerias com instituições de ensino superior, contudo a realização de pesquisa acadêmica deve ser previamente autorizada pelo Observatório de Segurança Pública da SEJUSP. Cabe às Unidades e à SUASE incentivar e promover a produção de conhecimento sobre o atendimento socioeducativo, em observância aos fluxos e procedimentos já estabelecidos.

Concluídas as pesquisas acadêmicas, a SUASE organiza banco de trabalhos de conclusão de curso (TCC), dissertações de mestrado e teses de doutorado que foram elaborados a partir de pesquisas em Unidades Socioeducativas de Minas Gerais. Além disso, autores de tais trabalhos são convidados a apresentar suas pesquisas em eventos, rodas de conversa, webinários e seminários organizados pela SUASE, de modo a dar visibilidade aos temas e autores, bem como oportunizar o debate com os trabalhadores do Sistema Socioeducativo.

4.6 ESTRUTURA FÍSICA

A estrutura física das Unidades Socioeducativas deve apresentar conformidade com os parâmetros arquitetônicos adotados pelo SINASE, que define que elas devem atender e “respeitar as exigências de conforto ambiental, de ergonomia, de volumetria, de humanização e de segurança” (CONANDA, 2006, p.67), além de se atentarem para as especificidades da medida socioeducativa em execução.

Em Minas Gerais há Unidades Socioeducativas construídas em observância aos princípios e às diretrizes do SINASE estabelecidas na Resolução 119 de 2006 do CONANDA de 2006 e há, também, Unidades Socioeducativas que foram fundadas antes da definição de tais parâmetros arquitetônicos, mas que foram ou que estão sendo adaptadas de modo que a estrutura física favoreça o desenvolvimento das práticas pedagógicas inerentes à socioeducação.

4.6.1 Centros Socioeducativos

A estrutura física dos Centros Socioeducativos deve garantir condições de ambiência e de habitabilidade para que a prática cotidiana contemple todos os aspectos do atendimento socioeducativo, ou seja, a estrutura física deve conter espaços adequados para a realização das atividades individuais e coletivas; pedagógicas e de segurança; para adolescentes, familiares e trabalhadores da instituição.

Assim, as Unidades Socioeducativas de Minas Gerais devem conter, em consonância com o SINASE (CONANDA, 2006), os espaços destinados a:

  • acesso e controle (portaria, revista e segurança interna e externa);
  • salas para direção e administração;
  • sala de coordenação de segurança;
  • sala para equipe técnica
  • áreas destinadas a serviços (cozinha, lavanderia, almoxarifado, garagem, depósito de resíduos, vestiário para funcionários);
  • alojamentos em condições adequadas de habitabilidade;
  • alojamento protegido;
  • salas de atendimento individual e coletivo;
  • auditório / anfiteatro / salão para atividades coletivas;
  • refeitório;
  • local para visita familiar;
  • área de saúde;
  • escola;
  • oficinas profissionalizantes;
  • campo de futebol / quadra poliesportiva; e
  • sala multiuso / espaço ecumênico.

O corpo diretivo e equipes dos Centros Socioeducativos devem utilizar a estrutura física existente de modo a garantir a execução da proposta pedagógicacontida neste Programa de Atendimento, inerente à socioeducação. Devem, pois, utilizar os espaços disponíveis de forma a garantir a realização de práticas educativas. Cabe aos gestores zelar para que os(as) adolescentes não permaneçam restritos aos alojamentos, garantindo-lhes a convivência em grupo e a inclusão em atividades pedagógicas.

4.6.1.1 Alojamento protegido

O alojamento protegido é destinado a adolescentes em situação de vulnerabilidade (situação de risco,tentativa de autoextermínio, entre outras que inspiram cuidados contínuos). Além de atender às exigências dispostas no inciso VII do Art. 94 do ECA - que se refere à oferta de instalação física em condições adequadas de habitabilidade, higiene, salubridade e segurança, com os objetos necessários à higiene pessoal do adolescente -, o alojamento protegido deve localizar-se em ponto estratégico, que propicie a visibilidade constante da equipe de segurança, e de fácil acesso, de modo a favorecer a prestação de socorro ou a realização de intervenções, caso seja necessário.

Sua utilização deve ser, exclusivamente, em caráter protetivo, para garantir a manutenção da integridade física e psicológica dos(as) adolescentes, não sendo cabível seu uso com escopo sancionatório, disciplinar ou de isolamento.A equipe socioeducativa deve empreender esforços para garantir a participação do(a) adolescente na rotina da Unidade, ainda que necessária sua permanência em alojamento protegido. Nesse sentido, destaca-se que as equipes, de forma integrada, devem garantir a participação de todos(as) os(as) adolescentes nas atividades da rotina institucional, colaborando com a manutenção ou reequilíbrio da saúde integral do público atendido, por meio da participação em oficinas, atividade escolar, formação para o trabalho, cursos profissionalizantes, práticas esportivas, momentos de lazer e cultura.

É fundamental que as equipes considerem os fatores de risco para o autoextermínio em cada caso, bem como os fatores de proteção que, em geral, estão relacionados à promoção da integração do(a) adolescente em espaços de escuta econexão com o outro (integração em grupos, práticas coletivas, atendimentos técnicos, apoio familiar etc.). Desse modo, nos casos de utilização do alojamento protegido por motivo de ideação ou tentativa de autoextermínio, deve-se evitar que o(a) adolescenteseja mantido sozinho ou em alojamento individual, mesmo que por pequeno período de tempo, salvo por orientação de profissional da área de saúde em contrário. Ressalta-se, ainda, que é vedada aplicação de medidas sancionatórias diante de tentativa de autoextermínio, ato preparatório e/ou lesão por automutilação.

Os atendimentos de saúde, internos e externos, devem ser mantidos e as equipes de atendimento e de segurança devem se pautar nos parâmetros e orientações contidas no Plano de Prevenção ao Suicídio nas Unidades Socioeducativas de Minas Gerais (2020), como dispositivo de auxílio cotidiano do atendimento socioeducativo, principalmente na vivência de situações relacionadas a violências autoprovocadas.

Identificada a necessidade de alocação de adolescentes no alojamento protegido, a Unidade Socioeducativa deverá encaminhar à SUASE, nas primeiras horas ou no prazo máximo de 24 horas, o Informe de Agravo de Saúde; e, em até 48 horas, deve ser enviado Relatório Circunstanciado para a SUASE e órgãos do Sistema de Justiça (Defensoria Pública, Ministério Público, Pode Judiciário) para fins de ciência eacompanhamento.

A permanência estratégica do(a) adolescente no alojamento protegido não deve ocorrer em caráter permanente, mas sim pelo menor tempo possível.Posterior ao prazo de 48 horas, caso a permanência no alojamento protegido enseje alteração na participação do(a) adolescente na rotina de atividades da Unidade, considerando a restrição parcial ou integral da convivência e inserção nas atividades cotidianas, o fato deve ser formalizado à SUASE e órgãos do Sistema de Justiça por meio de novo relatório circunstanciado.

Quando não houver demanda, o alojamento protegido poderá ser considerado vaga regular para a Unidade Socioeducativa.

4.6.2 Casas de Semiliberdade

Em Minas Gerais, as Unidades que executam a medida socioeducativa de semiliberdade são casas situadas em bairros residenciais, com fácil acesso ao transporte coletivo municipal e aos equipamentos públicos das redes de educação, de saúde e de assistência social. Tal estrutura favorece a circulação dos(as) adolescentes pela cidade, bem como a interação permanente entre a Casa de Semiliberdade e a comunidade.

A lotação máxima de cada Casa é de 20 (vinte) vagas e o espaço físico é composto por:

  • acesso e controle (portaria e revista);
  • salas para direção e administração;
  • sala para equipe técnica;
  • áreas destinadas a serviços (cozinha, lavanderia, garagem e banheiro para funcionários);
  • quartos    e    banheiros   para    adolescentes    em    condições   adequadas   de habitabilidade;
  • sala de atendimento individual e coletivo;
  • refeitório;
  • local para visita familiar;
  • sala multiuso;
  • sala de inclusão digital/ acesso a computadores para atividades;
  • espaço ao ar livre/área externa para atividades e circulação.

Assim como os Centros Socioeducativos, as Casas de Semiliberdade devem garantir condições físicas adequadas à execução plena da Política de Atendimento e das práticas pedagógicas, visando alcançar os objetivos da medida socioeducativa.

4.6.3 Apac Juvenil

A estrutura física da APAC Juvenil de Frutal contém 1.200 m² (mil e duzentos metros quadrados) de área construída em terreno de 4.000m² (quatro mil metros quadrados). Como mencionado, a APAC Juvenil executa a internação provisória, a internação por tempo indeterminado e a semiliberdade. A estrutura física é composta por:

  • Acesso e controle (portaria, revista e segurança interna e externa);
  • Sala de administração;
  • Sala de coordenação;
  • Dormitórios com capacidade para 10 adolescentes cada;
  • Lavanderia;
  • Quadra/pátio;
  • Sala de TV;
  • Cozinha;
  • Banheiro;
  • Sala de atendimento técnico;
  • Sala de atividades/aula;
  • Sala de arquivo.

A Unidade também conta com alojamento protegido, localizado em área que propicia a visibilidade constante pela equipe de segurança.

Em relação à MSE de semiliberdade, registra-se que apesar da execução ocorrer dentro dos limites físicos da APAC, são proporcionadas condições plenas para o desenvolvimento de práticas pedagógicas e atividades externas, conforme determina a legislação.

Comentario

5. PERFIL DO(A) ADOLESCENTE EM UNIDADES SOCIOEDUCATIVAS DE MINAS GERAIS

O aprimoramento da Política de Atendimento Socioeducativo exige que se lance um olhar atento ao público atendido, que precisa ser visto, acolhido e compreendido enquanto sujeito de direitos.

Para tanto, é essencial conhecer os dados sociodemográficos dos(das) adolescentes, tendo em vista que a conjuntura econômica e social, a etnia, o sexo, a orientação sexual, assim como a idade, o território de origem, as vivências sócio comunitárias e familiares desses(essas) adolescentes marcam a história e a trajetória desses indivíduos, tanto de formas objetivas (vulnerabilidades, risco social, violações de direitos, por exemplo) quanto subjetivas (construção da identidade).

Nessa perspectiva, será apresentado um breve perfil sociodemográfico dos(as) adolescentes inseridos(as) em Unidades Socioeducativas de Minas Gerias, a partir de dados referentes aos anos de 2018 a 2021.Cabe ressaltar que metade do período considerado para o levantamento, coincide com o período da pandemia engendrada pela Covid-194.

Na realização do levantamento dos dados, cada adolescente foi contabilizado(a) apenas uma vez no período citado. Na existência de mais de uma admissão do(a) adolescente na Unidade no período, considerou-se a mais recente. Isso resultou no total de 9.400 (nove mil e quatrocentos) adolescentes distintos. Algumas informações do perfil foram obtidas por meio do questionário socioeconômico aplicado no acolhimento dos(as) adolescentes que se encontravam em cumprimento das medidas de internação, de internação-sanção e de semiliberdade, não contemplando, pois, adolescentes em cumprimento da medida de internação provisória. Por fim, cada pergunta do questionário foi respondida de maneira voluntária, resultante de autodeclaração, e registrada no sistema informatizado da SUASE, a saber: o Painel SUASE.

4A COVID-19 caracteriza-se como uma doença viral que se manifesta nos seres humanos, causada pelo agente infeccioso SARS-CoV-2; uma doença potencialmente grave, com elevada transmissibilidade e que teve distribuição global, sendo classificada a nível de pandemia pela Organização Mundial de Saúde no dia 11 de março de 2020. Em virtude deste cenário, as adequações sanitárias e medidas de prevenção instauradas a nível mundial também impactaram significativamente a rotina das Unidades Socioeducativas do estado de Minas Gerais. Para fins de controle da transmissão da doença, em consonância com as recomendações expressas dos órgãos de saúde e do setor judiciário, houve diminuição da lotação das Unidades Socioeducativas, suspensão temporária de saídas externas e entrada de parceiros nas instituições, bem como redução e revezamento de visitas familiares até fevereiro de 2022.

 

A população atendida pelo Sistema Socioeducativo mineiro compõe-se de adolescentes de 12 (doze) a 18 (dezoito) anos e jovens adultos até os 21 (vinte e um) anos incompletos, sendo que 69,5% (sessenta e nove e meio por cento) possuem idades entre 16 (dezesseis) a 17 (dezessete) anos; a expressiva maioria de adolescentes é do sexo masculino [95% (noventa e cinco por cento)] e apenas 4% (quatro por cento) do sexo feminino. 

No que se refere ao gênero, o levantamento apenas foi sensível ao público trans que se declara do gênero feminino, totalizando 15 (quinze) adolescentes atendidas entre 2018 e 2021. Referem-se a adolescentes travestis e transexuais (aquelas que nasceram com o sexo biológico masculino, cuja identidade de gênero é feminina), admitidas no Sistema Socioeducativo para cumprimento da medida de internação, de semiliberdade, de internação-sanção ou para acautelamento provisório, encaminhadas, considerando a identidade de gênero autodeclarada, ao Centro Socioeducativo São Jerônimo ou à Casa de Semiliberdade Santa Amélia, conforme artigo 6º da Resolução SESP nº 18/2018. Quanto ao público trans que se declara do gênero masculino, ainda não foram contabilizados no levantamento de dados. Além disso, também não há levantamento de dados sobre a orientação sexual e/ou sobre os demais integrantes da população LGBTI.

Com relação à raça/cor, a partir do preceito da autodeclaração, observa-se uma população majoritária de adolescentes negros(as)5 no Sistema Socioeducativo mineiro: mais de 78% (setenta e oito por cento), sendo que 55,41% se autodeclararam pardos e 22,97% pretos, enquanto 17,85% dos(as) adolescentes e jovens se autodeclararam brancos.

5 Adotamos a forma mais convencional de utilização dos termos “negra/o” e “preta/o”, se referindo ao termo “negro” quando se trata da população, e utilizando os termos “preto”, “pardo” e/ou “branco”, quando se trata da cor da pele autodeclarada, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, compreendendo, porém, que os termos “negro” e “preto” são intercambiáveis em nosso país. Desta forma, quando foi mencionado o termo “negro” nesta sessão, este englobou a população que se autodeclara como “pretos” e “pardos”.

 

Quanto à escolarização, 69,5% (sessenta e nove por cento) dos(as) adolescentes atendidos responderam que não estudavam no momento da admissão na Unidade Socioeducativa. Outro aspecto importante é a considerável distorção entre a idade dos adolescentes e a série em que se encontram: 56% (cinquenta e seis por cento) dos(as) adolescentes se encontravam entre o 6º (sexto) e o 8º (oitavo) anos do ensino fundamental, apesar de terem entre 16 (dezesseis) e 17 (dezessete) anos, idades a partir das quais eles(as) deveriam estar no ensino médio.

No que se refere à composição familiar dos(as) adolescentes, observa-se que são, majoritariamente, formadas por famílias monoparentais femininas, em que são as mães as principais provedoras e, também, responsáveis pelos cuidados com os(a) filhos(as), sem a ajuda ou a participação dos genitores. Entre 2018 e 2021, 48,6% das mães dos(as) adolescentes que passaram por Unidades Socioeducativas de Minas Gerais eram chefes de família e 40,6% dos(as) adolescentes moravam apenas com a mãe.

Mais da metade dos(as) adolescentes (54,31%) não souberam responder sobre a renda familiar. Entre os que responderam, a maioria possuía uma renda familiar abaixo de 2 (dois) salários mínimos, ou seja, fazem parte da classe E, que se configura a classe dos mais pobres da sociedade brasileira.

No que se refere a adolescentes com alguma deficiência, 99,5% (noventa e nove e meio por cento) da população atendida não registra nenhum tipo de deficiência. Dentre aqueles que apresentam deficiências, 42,9% são portadores de deficiência do tipo cognitiva, 31,3% visual e 22% (vinte e dois por cento) motora.

No tocante aos atos infracionais praticados pelos(as) adolescentes, há predominância de atos análogos aos crimes de roubo (21,9%), roubo a mão armada (19,6%) e de tráfico de drogas (20,6%), conforme demonstrado na Tabela 3. Apenas em quarto e em quinto lugares, com cerca de 9% (nove por cento) e 5% (cinco por cento), respectivamente, identificam-se as práticas de atos infracionais análogos aos crimes de homicídio e de tentativa de homicídio.

 

Tabela 3 – Adolescentes nas medidas de internação, internação provisória, internação- sanção e semiliberdade por ato infracional, 2018-2021

 

Fonte: Painel Suase. Elaboração: Diretoria de Planejamento e Monitoramento Socioeducativo/Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo – DMS/SUASE

 

Considerando-se o perfil dos(as) adolescentes apresentado, identificam-se questões específicas e fundamentais que atravessam a vida desses sujeitos e que não podem ser desconsideradas pelo Sistema Socioeducativo, seja pela expressiva prevalência dentre o público - como é o caso da população negra privada de liberdade, asrelações étnico-raciais e seus impactos sociais -, seja pelas situações de invisibilidade que algumas temáticas experimentaram até o momento, como o atendimento à populaçãofeminina e à população LGBTI, bem como as especificidades dos primeiros anos da adolescência.

O olhar atento por parte do Sistema Socioeducativo e a compreensão acerca do público atendido exigem a discussão e o fortalecimento dessas temáticas visando garantir um atendimento adequado, coerente, respeitoso e garantidor de direitos a todos(as)os(as) adolescentes, sem descuidar das singularidades dos diferentes recortes do público atendido.

5.1 RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS E SEUS IMPACTOS SOCIAIS

A desigualdade étnico-racial existente na sociedade pode ser observada em vários campos, notadamente entre a população encarcerada.

No sistema socioeducativo tem-se a mesma evidência. Os jovens que são levados às Unidades são de maioria preta ou parda, evidenciando que existe uma correlação entre grupos populacionais marginalizados, exclusão social e aprisionamento.

Conforme dados de classificação étnico-racial autodeclarada pelos adolescentes do Sistema Socioeducativo de Minas Gerais, conforme já mencionado, 55,41% se autodeclaram pardos e 22,97% se autodeclaram pretos. Em contrapartida, aproximadamente 17% (dezessete por cento) dos(as) adolescentes e dos(as) jovens se autodeclaram brancos.

Paralelamente a estes dados, cabe retomar os altos índices de homicídios que atingem a juventude negra, configurando o reflexo da discriminação e violência racial que os acomete. Mediante esse cenário, vários movimentos sociais e campanhas se formam a partir da organização da sociedade civil, tendo como foco o fomento de ações de combate ao racismo e ao genocídio da população negra, através e articulações intersetoriais com o poder público. Cabe destacar que tais movimentos também abarcam a correlação entre a questão racial e a desigualdade socioeconômica do país, sendo de suma importância que a temática do racismo também seja discutida no âmbito da distribuição de recursos e renda no Brasil.

Nesse sentido, considerando os aspectos que perpassam a criminalização da pobreza, realidade inerente ao público atendido no Sistema Socioeducativo, emerge um ponto essencial: é preciso atentar-se às vulnerabilidades e riscos a que estão expostos(as) os(as) adolescentes atendidos, mapeando, identificando e intervindo, tanto no escopo do atendimento individual quanto em grupos e em ações coletivas nas Unidades Socioeducativas.

É fundamental a construção de espaços que possibilitem o acesso ao conhecimento e orientação sobre os direitos étnico-raciais, as repercussões da violação dos mesmos, bem como a problematização das questões raciais, sociais, econômicas e culturais que atravessam o contexto das medidas socioeducativas.Desse modo, as equipes devem desenvolver estratégias rotineiras para que temas como o racismo, as desigualdades sociais, educacionais e os preconceitos sejam trabalhados de forma que os(as) adolescentes possam se ver como protagonistas de suas histórias.

As Unidades Socioeducativas têm, portanto, muito a oferecer por meio das oficinas, atividades escolares, nos atendimentos individuais, na promoção da convivência familiar e comunitária, no acesso igualitário a direitos humanos aos(às) adolescentes, sem distinção de qualquer espécie. A atuação das equipes deverá, portanto, oportunizar possibilidades de reconstrução de vida a esses(as) adolescentes e favorecer condições de ocuparem lugares e espaços de forma justa e igualitária.

5.2 VISIBILIDADE LGBTI NO SOCIOEDUCATIVO

Crianças e adolescentes são destinatários de proteção normativa nacional e internacional especial, possuidoras que são de todos os direitos inerentes à pessoahumana e, ainda mais, em razão de sua peculiar condição de desenvolvimento. Quando apresentam múltiplas situações de vulnerabilidade, a atenção deve ser ainda maior, comono caso de adolescentes LGBTI que se envolvem no cometimento de atos infracionais, amparando-se a atuação de todo o Sistema Socioeducativo nos diplomas de direitos humanos a eles e elas relacionados.

Desse modo, adolescentes LGBTI devem ter sua individualidade e seus direitos resguardados, assim como todos(as) os(as) demais adolescentes e jovens ao longo de sua permanência em Unidades Socioeducativas, sendo vedada toda e qualquer prática discriminatória em razão de sua sexualidade, orientação afetivo-sexual, identidade ou expressão de gênero.

O direito à não discriminação e ao respeito à sua personalidade, liberdade, igualdade e identidade pessoal está previsto, como a qualquer pessoa humana, desde a Declaração Universal de Direitos Humanos (1948), reforçado no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, na Convenção Americana de Direitos Humanos e na ConvençãoInteramericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher.

O mais importante documento internacional relacionado à pessoa LGBTI e que ampara, também, adolescentes, foi elaborado em 2006, no Painel Internacional de Especialistas em Legislação Internacional de Direitos Humanos, Orientação Sexual e Identidade de Gênero, e elencou, detalhadamente, importantes princípios a serem adotados para proteção dos direitos desta população – Princípios de Yogyakarta.

No que se refere ao(à) adolescente autor(a) de ato infracional, as normativas estabelecem todo um arcabouço protetivo que respeita a individualidade da pessoa em desenvolvimento para romper com o ciclo de violência social em que estão inseridos e com a trajetória infracional, resgatando e/ou promovendo a construção de projetos saudáveis de vida. Para tanto, respeitam a personalidade do(a) adolescente que não deve sofrer discriminação, opressão, violência ou negligência de qualquer espécie.

A Lei do SINASE, especificamente, prevê que preconceitos relacionados à orientação afetivo-sexual, identidades ou expressões de gênero distintas de norma, não devem pautar o atendimento ao(à) adolescente. Princípios da igualdade, da não discriminação, do respeito à autonomia e do livre desenvolvimento amparam todo osistema socioeducativo.

Em âmbito estadual, tem-se a Resolução SESP Nº 18, de 25 de Abril de 2018, outro importante marco regulatório no que se refere ao tratamento da pessoa LGBTI e à garantia dos direitos dessa população inseridos no âmbito do sistema socioeducativo de Minas Gerais. Essa resolução estabelece, de modo pioneiro no País, diretrizes para o atendimento de adolescentes LGBTI no âmbito do Sistema Socioeducativo. Tal normativa contempla todas as manifestações de sexualidade e gênero, proibindo qualquer forma de discriminação e preconizando a autodeclaração como a maneira dos(as) adolescentes se determinarem quanto ao gênero e à sexualidade perante a gestão de justiça juvenil. Dessa forma, busca-se estabelecer o respeito ao nome social, o encaminhamento às Unidades adequadas ao atendimento aos(às) adolescentes trans e travestis e à realização da revista dos(as) adolescentes conforme a identidade de gênero apresentada, dentre outros importantes direitos.

Além da Resolução SESP Nº 18/2018, o Sistema Socioeducativo mineiro pauta-se, também, na Resolução 270 de 2018 do CNJ, que dispõe sobre o uso do nome social pelas pessoas trans, travestis e transexuais usuários dos serviços judiciários.

No âmbito do atendimento ao público LGBTI, conforme abordado no Capítulo 4 deste Programa de Atendimento, Minas Gerais conta com apenas 2 (duas)Unidades Socioeducativas que se caracterizam como Unidades mistas, que atendem à população feminina e à população transgênero (homens trans e mulheres trans), sendo elas o Centro Socioeducativo São Jerônimo e a Casa de Semiliberdade Santa Amélia, localizadas em Belo Horizonte.

Reconhecendo que, assim como a sociedade brasileira, o Sistema Socioeducativo ainda tem muito a avançar quanto à garantia de direitos à população LGBTI, a SUASE, em conjunto com uma rede de atores e de instituições parceiras, está elaborando o Plano de Prevenção e Enfrentamento à Transfobia no Sistema Socioeducativo, que apresenta reflexões e ações voltadas à propagação de informações adequadas, à formação continuada e ao enfrentamento de casos de violação de direitos no âmbito das Unidades Socioeducativas. O referido Plano será publicado no primeiro trimestre de 2023.

5.3 VISIBILIDADE DA POPULAÇÃO FEMININA NO SOCIOEDUCATIVO

Ao se tratar da relação entre o envolvimento infracional e o gênero, é importante considerar as dinâmicas sociais que incluem riscos e desafios específicos que interferem na construção da identidade de gênero, envolvendo o papel social e a posição atribuídos às mulheres na sociedade, considerando, ainda, as desigualdades sociais em diversos segmentos da população (CARVALHO, 2017).

Tironi (2021) aponta o impacto das questões de gênero e de classe social nas jovens que passam pelo Sistema Socioeducativo de Minas Gerais, enfatizando diferentes formas de opressão e de desigualdades sociais que se relacionam ao ato infracional. A autora ressalta os aspectos da sociedade colonialista, patriarcal e classista que geram restrições e vulnerabilidades que submetem essas jovens a diversas violações de direitos antes de chegarem às medidas socioeducativas, como a pobreza, a ausência de proteçãoe de segurança, a dificuldade de acessar e de permanecer na escola, a exploração no trabalho ou escassez de oportunidades e a formação profissional, além de diversasformas de violência (doméstica, sexual, entre outras) (TIRONI, 2021, p. 106)

Entre os anos de 2018 e 2021 foram atendidas 399 (trezentas e noventa e nove) adolescentes do sexo feminino no Sistema Socioeducativo mineiro, sendo que a maioria delas permaneceu em internação provisória.

A análise dos dados socioedemográficos dessas adolescentes demonstrou que 57,1% das adolescentes foi admitida com idades entre 16 (dezesseis) e 17 (dezessete) anos; a maioria delas, 62,4%, se autodeclararam negras e 20% (vinte por cento) brancas. Quanto à escolaridade, 56,4% se encontrava entre o 6º (sexto), 7º (sétimo) e 8º (oitavo) anos do ensino fundamental, com uma defasagem escolar de aproximadamente 4 (quatro) a 5 (cinco) anos. Sobre a composição familiar, 49,4% delas declararam que apenas a mãe era a chefe de família. Em relação ao estado civil, a maioria das adolescentes se declara como solteira; entretanto, o número de adolescentes que se declaram como casadas, coabitando com companheiro(a) ou em união estável é mais relevante na população feminina, em relação aos dados dos adolescentes do sexo masculino.

Quanto ao território de origem das adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas de privação e de restrição de liberdade em Minas Gerais, entre janeiro de 2015 e dezembro de 2019, 68,6% [142 (cento e quarenta e duas) adolescentes] eram de cidades do interior do Estado e apenas 31,4% [65 (sessenta e cinco) adolescentes] eram oriundas da capital ou da região metropolitana de Belo Horizonte (TIRONI, 2021), onde estão situadas as duas Unidades que atendem a esse público.

Aproximadamente 13% (treze por cento) das adolescentes atendidas no Sistema Socioeducativo de Minas Gerais entre 2018 e 2021 declararam possuir filhos e 4,7% estavam grávidas durante a permanência em Unidades Socioeducativas. O Levantamento Anual do SINASE (2019) apontou que as adolescentes grávidas que se encontram no Sistema Socioeducativo necessitam de espaço adequado para cuidar de seus bebês nos primeiros meses de vida.

Nessa senda, foi criado em Minas Gerais, no ano de 2016, o Espaço Mamãe-Bebê no Centro Socioeducativo São Jerônimo, com vaga para 3 (três) adolescentes e 3 (três) bebês, bem como pautado na garantia dos direitos reprodutivos das adolescentes, em consonância com o ECA (1990), o SINASE (2012), a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes em Conflito com a Lei (PNAISARI) (Portaria nº 1.082/2014) e as diretrizes da Organização Mundial de Saúde (OMS), em parceria com o Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), que, por sua vez, recomendam o aleitamento materno exclusivo até os 6 (seis) meses de idade.

A partir da implementação deste espaço foi criada a Metodologia de Atendimento para a Adolescente Mãe com Criança até os Seis Meses de Idade (2016), sendo esse o primeiro documento específico para o atendimento à população feminina no Sistema Socioeducativo mineiro. Dessa forma, o Espaço Mamãe Bebê e a Metodologia de Atendimento para Adolescente Mãe com Criança até os Seis Meses de Idade são importantes marcos para a socioeducação em nosso estado.

Em 2016 foi promulgada a Lei Federal n° 13.257, que dispõe sobre os direitos para a primeira infância, bem como altera o ECA (1990) e o artigo 318 do Código de Processo Penal – CPP, assegurando o Princípio do Melhor Interesse, que garante o convívio e a permanência da criança com a mãe, fora de estabelecimentos de cumprimento de medidas socioeducativas, de forma a preservar seus direitos fundamentais (BRASIL,2019, p. 42).

Além da diferença biológica, as demandas e os acompanhamentos das garotas divergem, em vários âmbitos, dos garotos ao longo do processo de socioeducação. Dessa maneira, na condução do trabalho com o referido público é imprescindível considerar as especificidades e os contextos, compreendendo, e não silenciando, as singularidades das adolescentes do sexo feminino — não de forma a homogeneizar a população feminina privada/restrita de liberdade, mas, ao contrário, oportunizando o reconhecimento de sua pluralidade.

É fundamental, portanto, que as equipes socioeducativas permaneçam em constante aprimoramento profissional acerca das especificidades do feminino, por meio de capacitações continuadas, e que se apropriem das legislações específicas, notadamente a Resolução 225 de 2021 do CONANDA, que dispõe sobre diretrizes para o atendimento socioeducativo às adolescentes privadas de liberdade.

Cabe às equipes socioeducativas e à SUASE compreender e construir novasformas para o adequado cumprimento das medidas de internação e de semiliberdade voltadas às adolescentes do sexo feminino, considerando as especificidades e as singularidades do recorte de gênero. Assim, o fato de, muitas vezes, os anseios e os desejos das adolescentes serem invisibilizados ou vistos a partir de uma ótica patriarcal é o primeiro elemento a ser considerado nas discussões e nas análises do atendimento ofertado às meninas e às mulheres nas Unidades Socioeducativas.

Nesse sentido, cabe ao Sistema Socioeducativo não se pautar por um contexto organizador único, um balizador universal que considere os(as) destinatários das medidas socioeducativas como uma categoria homogênea. Faz-se necessário estabelecer um recorte dentro da Política de Atendimento que possibilite a construção de novas metodologias, diretrizes e práticas pedagógicas endereçadas ao público feminino, de modo que a construção dos casos e os encaminhamentos sejam sensíveis ao gênero eàs necessidades do feminino.

Assim, cabe às equipes socioeducativas atuar visando a garantia de direitos e o empoderamento feminino, abordando, além dos eixos e das temáticas inerentes à socioeducação, temas concernentes ao feminino, como: a saúde reprodutiva e sexual da mulher; o respeito à identidade e às formas de expressão do feminino; as violências contra a mulher; as relações interpessoais no espaço de privação/restrição de liberdade; as rivalidades e os conflitos que se apresentam de forma singular nas Unidades destinadas a esse público; o esgarçamento dos vínculos sociofamiliares e o abandono afetivo; as questões no campo da saúde mental; o histórico de institucionalização; a procura por se reconhecer e ser reconhecida em um lugar e em um papel que lhe é socialmente exigido; a escuta atenta e ativa acerca dos aspectos objetivos e simbólicos que perpassam representações e papéis sociais de sexo e de gênero, de modo que o contexto institucional de privação e de restrição de liberdade não seja reprodutor de violências já sofridas pelas adolescentes em sua trajetória de vida.

5.4 PRIMEIROS ANOS DA ADOLESCÊNCIA

Os primeiros anos da adolescência, compreendidos entre os 12 (doze) e os 15 (quinze) anos de idade, abarcam uma série de transformações importantes na vida dos indivíduos, desde alterações físicas, psíquicas, biológicas, além os processos de vinculação social, profissional e econômica, que precisam ser considerados ao longo do processo de socioeducação do(a) adolescente.

É uma exigência legal que a execução das medidas socioeducativas compreenda e promova intervenções junto ao(à) adolescente enquanto sujeito em situação peculiar de pessoa em desenvolvimento. Atenção ainda mais especial quanto ao processo de construção da identidade, de tornar-se adolescente (adolescer) e das exigências e necessidades dessa fase da vida deve ser dada pelas equipes socioeducativas aos(às) adolescentes entre 12 e 15 anos de idade.

Nessa perspectiva, o Sistema Socioeducativo de Minas Gerais conta com 03 (três) Unidades Socioeducativas em Belo Horizonte destinadas ao atendimento específico do público que se encontra nos primeiros anos da adolescência: o Centro de Internação Provisória São Benedito (MSE de internação provisória e de internação-sanção) e a Casa de Semiliberdade Planalto (MSE de semiliberdade) que recebem adolescentes com até 15 anos de idade na data de admissão e o Centro Socioeducativo Lindeia (MSE de internação) que recebe adolescentes com até 14 anos de idade na data de admissão. Tais Unidades foram implementadas no intuito de dar cumprimento ao estabelecido noart. 123 do ECA:

Art. 123 A internação deverá ser cumprida em entidade exclusiva paraadolescentes, em local distinto daquele destinado ao abrigo, obedecida rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e gravidade da infração. (BRASIL, 1990)

A separação, em Unidades específicas, dos adolescentes que se encontram nos primeiros anos da adolescência favorece a implementação de práticas pedagógicas destinadas ao público, respeitando a individualidade e a capacidade de crescimento,tendo em vista as características peculiares dessa faixa etária. É essencial, pois, que as equipes socioeducativas compreendam que as mudanças biológicas e cognitivas são atreladas ao desenvolvimento psicossocial, cultural e à construção da identidade. Nesse sentido, a maturidade física/fisiológica pode prevalecer e não ser acompanhada, no mesmo tempo, pela maturidade psicossocial, o que indica possibilidade de conflitos de identidade e maior produção de cortisol (o hormônio do estresse).

O fenômeno da puberdade, que está relacionado a transformações físicas e biológicas do indivíduo (mudanças na estatura, na composição corporal, desenvolvimento do aparelho reprodutor), gera uma imagem corporal em transformação, que pode ser afetada por emoções, por percepções, por sensações físicas, por experiências e por humores, além de ser fortemente influenciada pelo padrão cultural e social no qual o(a) adolescente se encontra. A relevância da separação dos adolescentes de acordo com idade e compleição física também está relacionada ao modo como cada adolescente passa pela experiência da puberdade. Paralelamente às mudanças na imagem corporal, os amadurecimentos emocional e cognitivo também variam entre um e outro, demandando olhar atento das equipes de atendimento no que se refere à condução dos casos.

Nessa fase da vida dos(as) adolescentes são perceptíveis as alterações no campo das relações sociais, inclusive com as referências parentais/familiares. A crítica às regras e às orientações, o confronto com as instituições e as figuras de autoridade aparecem enquanto forma de manifestação da subjetividade, de maneira que os questionamentos fazem parte do processo de amadurecimento e devem ser incentivados dentro de um viés dialógico, não repressivo. Isto posto, no âmbito da socioeducação torna-se propício sempre oportunizar espaços de problematização, de reflexão e de debate de ideias dentroda lógica do reconhecimento e do respeito à diversidade de opiniões e do estabelecimento de regras sociais de convivência.

Diante deste cenário, a equipe socioeducativa responsável pelo atendimento aos adolescentes entre 12 e 15 anos de idade precisa considerar as peculiaridades deste público, planejar e executar ações pedagógicas adequadas às necessidades dos(as) adolescentes, respeitando o desenvolvimento integral dos(as) mesmos(as) como forma de potencializar processos de autoconhecimento, tomada de decisões e autonomia. É importante pensar, ainda, em práticas educativas que produzam sentido para o sujeito, que estabeleçam conexões com a sua vivência e que incorporem seus valores, linguagem e realidade, por meio de um projeto pedagógico próprio para a faixa etária, a fim de proporcionar uma ressignificação de suas trajetórias.

Feitas a apresentação e a discussão acerca do perfil dos(as) adolescentes, passa- se à exposição, nos próximos capítulos, dos dispositivos metodológicos para a execução das medidas no âmbito dos Centros Socioeducativos e Casas de Semiliberdade de Minas Gerais.

 

Comentario

6. MÉTODOS, TÉCNICAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

As medidas socioeducativas são compostas por 3 (três) dimensões distintas e interrelacionadas, como destacam Costa e Rudnicki (2016): a responsabilização individual objetiva, enquanto resposta do Estado a uma conduta sancionada; a responsabilização subjetiva, enquanto possibilidade de vivência de um processo pessoal e social de apropriação ou compreensão acerca de sua trajetória e do cumprimento da medida socioeducativa; e um processo de aquisição de direitos sociais que foram violados ou nunca garantidos ao(à) adolescente.

Sua execução tem, portanto, um viés sancionatório e, também, de importância central, um viés pedagógico, que deve nortear todo e qualquer projeto, ação e/ou intervenção da política de atendimento socioeducativo. A centralidade do viés pedagógico das medidas socioeducativas traz à tona a importância do protagonismo juvenil e, nessa perspectiva, a exigência de individualização do processo socioeducativo dos sujeitos que são atingidos por essa política pública.Somente a partir da individualização da medida socioeducativa é possível ofertar espaços adequados e efetivos que fomentem autoconhecimento, reflexões, ressignificação, novas vivências e perspectivas que possam culminar em mudanças de percurso e de rompimento com a trajetória infracional.

Assim, o trabalho das equipes envolvidas deve consistir em construir e em executar propostas e intervenções que compreendam as particularidades de cada adolescente, sendo necessária atenção para que o cumprimento de medida não se torne um espaço padronizado de atendimento, ou que o(a) adolescente tente corresponder ao que ele(a) entende que a instituição espera dele(a), como uma forma de alcançar o desligamento, sem qualquer reflexão sobre sua história pessoal e social, sua trajetória infracional e a prospecção de um projeto de vida.

Por isso, é imprescindível que seja garantida aos(às) adolescentes a individualização do processo socioeducativo, de modo que as intervenções os(as) alcancem a partir de sua história de vida e das demandas necessárias à construção de uma reflexão quanto ao ato e à trajetória infracional, bem como de sua capacidade de resposta às provocações técnicas. Isso porque cada adolescente apresenta uma condição diferenciada de compreensão e de prospecção, o que deve ser considerado pelas equipes das Unidades.

Importante considerar que a medida socioeducativa será desenvolvida em meio a uma dinâmica e a rotinas construídas, atravessadas por diversas questões que constituem a organização da instituição de privação ou de restrição de liberdade. Necessária, portanto, a compreensão do contexto e ainda mais imprescindível que a equipe socioeducativa não perca de vista o(a) adolescente em meio a esse emaranhado institucional, tendo-o(a) como foco da prática socioeducativa. Ou seja, no centro dasocioeducação precisa estar o(a) adolescente e,direcionadas a ele(a), estão as ações construídas com ele(a) e para ele(a), de forma participativa, responsável, pedagógica e garantidora de direitos. Nesse viés, as Unidades Socioeducativas devem manter-se alertas para não reproduzirem práticas de apagamento e silenciamento dos sujeitos que não considerem a diversidade, as singularidades e a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento dos(as) adolescentes.

Esse direcionamento da política de atendimento socioeducativo possibilita que os eixos da medida não se desenvolvam de forma meramente objetiva e distanciada das especificidades de cada caso atendido. Com isso, no processo de reflexão do(a) adolescente é preciso considerar os saberes construídos por esse sujeito, como se

posiciona na vida, o seu modo de viver e se relacionar e, a partir daí, auxiliá-lo(a) em novos processos que exigem esboçar ou construir um projeto de vida, fazer escolhas e se responsabilizar por elas.

Nesse sentido, as Unidades Socioeducativas devem lançar mão de uma série de dispositivos metodológicos que abarcam métodos, técnicas e práticas para executar a socioeducação de modo a garantir e potencializar a dimensão pedagógica das medidas socioeducativas, tais como atendimento técnico individual, estudo de caso, responsabilização do(a) adolescente, PIA, atividades coletivas, assembleias, atividades externas, protagonismo juvenil e rotina institucional.

6.1 ATENDIMENTO TÉCNICO INDIVIDUAL

O atendimento técnico individual constituiu-se em um dispositivo dinâmico executado por profissionais das diversas áreas de formação que compõem a equipe técnica das Unidades Socioeducativas.

Trata-se de uma intervenção direta junto ao(à) adolescente, a partir de sua história de vida, buscando desenvolver e trabalhar no âmbito individual os eixos da medida, ofertando um espaço privilegiado de escuta durante a permanência nas Unidades de semiliberdade e internação. Ao longo dos atendimentos, busca-se construir o processo de responsabilização do(a) adolescente acerca da medida socioeducativa imposta e do cometimento do ato infracional.

Desse modo, o atendimento individual é um meio de promoção de reflexões aprofundadas com o(a) adolescente sobre sua trajetória e sobre seu processo de cumprimento de medida, bem como para a construção de novas perspectivas para sua vida. O espaço do atendimento também é essencial para a identificação de demandas e pontos que apontem para possibilidades de intervenção com o(a) adolescente.

Nas medidas de internação e semiliberdade, os atendimentos têm como ponto de partida construir uma compreensão acerca do(a) adolescente, sua família, sua história, seu percurso nos equipamentos e serviços da rede, a partir dos olhares das diversasáreas que compõem a equipe técnica da Unidade. O atendimento individual é um dispositivo imprescindível para a construção e avaliação do Plano Individual de Atendimento com a participação ativa do(a) adolescente.

Na internação provisória, por sua natureza, o atendimento individual não tem por objeto a responsabilização do(a) adolescente ou a construção do PIA, haja vista que o processo judicial se encontra em apuração.A partir dos atendimentos aos(às) adolescentes em internação provisória é necessário levantar informações acerca da história de vida e familiar, a trajetória infracional, se houver, as relações socioafetivas dos(as) adolescentes, o percurso escolar e profissionalizante, os interesses e as perspectivas.

O atendimento técnico individual na internação provisória é fundamental para a produção do relatório interdisciplinar que dará conhecimento ao Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública, no âmbito do processo judicial, acerca de informações contextualizadas da história de vida do(a) adolescente para além do ato que lhe foi atribuído. Os atendimentos aos(às) adolescentes em internação provisória também têm por objetivo acolher e contribuir para a redução de efeitos negativos inerentes à privação de liberdade.

Devido à imprevisibilidade temporal da internação provisória, é fundamental que os atendimentos tenham caráter pontual e assertivo. A equipe de atendimento deve identificar as principais questões apresentadas pelo(a) adolescente para, assim, intervir com a celeridade que o acautelamento provisório e o caso exigem. Lado outro, é necessário ter cautela em relação às questões tratadas e expectativas de resolução, considerando a iminente possibilidade de desligamento ou transferência.

Na internação-sanção, o atendimento técnico individual é o espaço onde a equipe multidisciplinar tem a oportunidade de trabalhar a importância da implicação do(a) adolescente no cumprimento da medida anteriormente imposta e trazer à tona os impasses apontados pelo sujeito em seu discurso, bem como fomentar a construção de alternativas frente a esses impasses.

É fundamental que o atendimento individual executado pela equipe que atende o(a) adolescente na internação-sanção seja construído em diálogo com a equipe multidisciplinar que executa a medida anterior (semiliberdade ou liberdade assistida), já que esta também possui elementos constitutivos do caso. Durante a internação-sanção,os técnicos da equipe da medida de origem podem atender o(a) adolescente em alguns momentos, com o intuito de manter ou reconstruir o vínculo, bem como de abordar o retorno à medida após a conclusão da sanção. Contudo, é atribuição da equipe que executa a internação-sanção realizar atendimentos individuais regulares e periódicos.

O espaço do atendimento técnico, em toda e qualquer medida socioeducativa, é fundamental para acolher e trabalhar os efeitos das atividades coletivas internas, das atividades externas, do encontro com a família, com a cidade e com a liberdade, nos momentos em que os(as) adolescentes participam de tais atividades dentro e fora da instituição. Todos esses processos e construções vão compor os relatórios que serão produzidos acerca do cumprimento da medida socioeducativa.

Frisa-se, portanto, que não há execução e, muito menos, cumprimento de uma medida socioeducativa sem o atendimento técnico por equipe multidisciplinar especializada. O atendimento individual é um dispositivo metodológico fundamental para assegurar que o(a) adolescente cumpra a medida socioeducativa imputada a ele(a) a partir de sua história, de seus impasses, suas potencialidades e seu projeto de vida, de forma individualizada.

Durante o atendimento individual os(as) técnicos devem adotar postura de escuta ativa, atentos(as) a todos os pontos apresentados pelo(a) adolescente, buscando construir e fortalecer vínculo, garantindo um espaço seguro, de acolhimento e de reflexão. O atendimento não deve se pautar por práticas de controle dos corpos e comportamentos, mas favorecer a livre narrativa, de forma respeitosa e cuidadosa, observando os preceitos éticos de cada categoria profissional. Nesse sentido, o(a) técnico(a) deve pautar-se pelos direitos do(a) adolescente de liberdade de expressão, igualdade e respeito às diferenças de toda espécie, sendo vedadas práticas ou conduções marcadas por preconceitos, discriminação ou violações de direitos, sob pena de responsabilização.

Nesse espaço de atendimento, será possível à equipe técnica intervir de modo a contribuir com a construção de importantes reflexões, de responsabilização pelas escolhas, protagonismo e autonomia dos(as) adolescentes. É o lugar de oferta da escutae da palavra, no qual os(as) destinatários da Política de Atendimento Socioeducativo podem falar sobre si e sobre suas interações sociais, sobre seus percursos de vida e apresentar seus interesses, dificuldades, expectativas e projetos em relação à família, à escola, formação para o trabalho, vida social e comunitária, entre outros.

A partir dos atendimentos técnicos, a equipe multidisciplinar construirá o planejamento de outros dispositivos metodológicos adequados ao caso, fazendo surgir o singular do(a) adolescente para além do emaranhado institucional.

6.2 ESTUDOS DE CASO

O estudo de caso é um dispositivo metodológico fundamental para o desenvolvimento do trabalho nas Unidades Socioeducativas, tendo por objetivo analisar e dar direcionamento para os pontos que se apresentam no encontro entre o(a) adolescente e a medida socioeducativa.

Os estudos de caso devem ser realizados com a participação de toda a equipe socioeducativa (representantes das equipes técnica, de segurança, de saúde, da escola, de esporte, de auxiliares educacionais, entre outros), garantindo a integração das intervenções e o alinhamento das ações a serem pactuadas. Os estudos de caso também podem ser realizados com instituições vinculadas às políticas públicas (de saúde, educação, assistência social, programas de proteção e de prevenção, entre outras) e com o Sistema de Justiça, conforme necessidade do caso.

O estudo de caso é um dispositivo que possibilita a discussão e construção de conhecimento acerca do(a) adolescentes, é espaço multidisciplinar, dialógico e não hierarquizado, de modo que todo saber que se apresenta sobre o sujeito possui igual importância.Trata-se de um espaço para composição da história do(a) adolescente, de suas diversas trajetórias (familiar, comunitária, educacional, profissionalizante, infracional etc.), a partir dos fragmentos que cada profissional da Unidade e cada instituição parceira convidada conseguiu compreender e registrar ao longo dos atendimentos e acompanhamento do(a) adolescente.

A Direção de Atendimento, nas Unidades de internação, e a Direção Geral, nas Unidades de semiliberdade, são responsáveis pela condução dos estudos de caso e devem favorecer a compreensão acerca do(a) adolescente em sua integralidade, a construção do caso de forma interdisciplinar e intersetorial.

A fragmentação dos casos pelas equipes técnicas é danosa ao(à) adolescente e inviabiliza o adequado cumprimento das medidas socioeducativas. Desse modo, cabe ao(à) gestor(a) da equipe técnica buscar o alinhamento, a integração das áreas, a interdisciplinaridade e o zelo pelo cumprimento das diretrizes metodológicas da socioeducação. Nesse contexto, o estudo de caso é ferramenta fundamental para a Unidade Socioeducativa, além de ser momento propício para que a equipe se interrogue sobre seu próprio trabalho e as respostas do(a) adolescente à instituição, avaliando-se a necessidade de adequações e mudança de rumos.

Por se tratar de um dispositivo fundamental para o direcionamento do trabalho com os(as) adolescentes, os estudos de caso devem ser registrados, assim como os encaminhamentos pactuados, favorecendo a retomada dos pontos discutidos e a continuidade das ações e acompanhamentos.

6.3 PLANO INDIVIDUAL DE ATENDIMENTO

O Plano Individual de Atendimento (PIA) é um instrumento técnico e dinâmico que tem como finalidade planejar e avaliar o processo de socioeducação dos(as) adolescentes a quem se atribuiu a autoria de um ato infracional. Nele devem constar as intervenções pensadas, programadas e construídas para cada um dos eixos da medida pelo(a) adolescente, por sua família e pela equipe do programa de semiliberdade ou de internação, contando com a participação dos profissionais da Unidade Socioeducativa, além de representantes da rede de atendimento, quando possível.

O PIA é, portanto, o principal instrumento para dar vida ao processo de responsabilização do(a) adolescente, ao mesmo tempo em que deve fomentar o (re)estabelecimento de laços sociais por meio do acesso a direitos e a garantias fundamentais, convocando as referências familiares, afetivas e sociais do(a) adolescente, bem como outras instituições e políticas públicas, a assumirem seus papéis de garantidores de direitos, o que, por sua vez, contribui para o fortalecimento e a sustentabilidade dos projetos construídos com o(a) adolescente.

Deverá constar no PIA o registro do trabalho pedagógico desenvolvido pela Unidade Socioeducativa. Conforme expresso no parágrafo único do art. 55 da Lei do SINASE (BRASIL, 2012), a construção do PIA deve ocorrer dentro dos 45 (quarenta e cinco) dias iniciais da medida e pressupõe a realização prévia de uma análise diagnóstica do caso, que consiste no levantamento de informações sobre o ato infracional praticado, o contexto de vida do(a) adolescente — incluindo aspectos familiares, sociais, laborais, escolares e de saúde —, bem como dados existentes nos sistemas referentes a outras políticas públicas.

Essa análise deve partir das informações trazidas no procedimento de apuração de ato infracional (sentença, relatórios, outras fontes), bem como de outras informações coletadas durante o tempo de internação provisória, quando o(a) adolescente cumpriu essa medida em local diverso da qual cumprirá a medida de internação, assim como por meio do atendimento presencial ao(à) adolescente, às referências familiares e à rede socioassistencial do território de origem.

A redação do PIA é de responsabilidade da equipe técnica da Unidade Socioeducativa, que deverá realizar uma análise diagnóstica prévia, a qual deve contemplar informações referentes ao contexto de vida do(a) adolescente colhidas por meio dos dados trazidos pelo procedimento de apuração de ato infracional, pela fala do(a)adolescente, de familiares e pelos contatos realizados com a rede de atendimento (de saúde, educação, socioassistencial etc.) que referencia ou já referenciou o(a) adolescenteem algum momento de sua vida.

Nessa perspectiva, a acolhida e o atendimento inicial do(a) adolescente são extremamente importantes, pois nesse primeiro contato com a equipe técnica é necessária uma escuta ativa e cuidadosa, bem como uma presença acolhedora e empática que favoreçam a construção de vínculos do(a) adolescente com os profissionais e com a medida, conforme já mencionado na seção 6.1.

Destaca-se, também, a visita domiciliar como uma importante ferramenta que traz significativas contribuições para vinculação e o conhecimento da realidade sociofamiliar do(a) adolescente, permitindo à equipe a realização de análise de contexto e a construção de estratégia de intervenção no PIA adequada ao caso. Este ponto será aprofundado no capítulo 7, seção 7.5.

Reunidas as informações pessoais e sociais do(a) adolescente e de suas referências familiares, sociais e afetivas, é imprescindível a realização de estudo de caso, conforme já mencionado na seção 6.2.

Concluído o diagnóstico inicial e partindo das experiências trazidas pelo(a) adolescente, a equipe técnica deve construir e pactuar com ele (a), sua família e, se possível, com a rede de atendimento os objetivos da medida socioeducativa. Esses objetivos serão divididos por eixos, como consta no formulário do PIA, e devem ser estabelecidas metas claras e bem definidas em cada um deles, bem como os prazos para execução

No plano de intervenções que integra o PIA deve-se descrever as ações a serem executadas para atingir as metas, sendo detalhadas quais dessas intervenções serão de responsabilidade da equipe técnica, quais serão atribuições do(a) adolescente e quais serão destinadas à família ou à rede de atendimento. Deverão constar, ainda, atividades individuais e coletivas que estejam de acordo com os objetivos do(a) adolescente(a) e caberá à equipe, sempre que possível, buscar parceiros que ofereçam o que for proposto e pactuado com/pelo(a) adolescente.

O resultado das intervenções propostas servirá de base para a avaliação da medida socioeducativa, devendo ser indicativo para o desligamento ou progressão do(a) adolescente para medida menos gravosa, quando os objetivos definidos no planejamento forem total ou parcialmente atingidos, respectivamente.

O PIA é construído sob a orientação da Direção de Atendimento nas Unidades de internação e da Direção Geral nas Unidades de semiliberdade. Tais gestores são, também, responsáveis por interligar as informações das diferentes áreas de conhecimento, transformando-as em algo articulado que permita a compreensão do caso em sua integralidade. Importante destacar, também, que o PIA é um instrumento dinâmicoque deve ser repensado e alterado caso o(a) adolescente apresente novas demandas e necessidades, sendo recomendável que essas novas pactuações sejam informadas à defesa técnica do(a) adolescente, ao Ministério Público e ao Poder Judiciário, caso sejam substanciais.

Por fim, salienta-se que as ações planejadas no PIA podem não se encerrar com o término da medida socioeducativa, haja vista que se tratam de pactuações que envolvem direitos fundamentais e, por isso, deve-se garantir a continuidade de ações e dos acompanhamentos após o desligamento do(a) adolescente da Unidade Socioeducativa. Nesse sentido, é fundamental que a equipe socioeducativa realize o contrarreferenciamento do caso junto às redes de saúde, de educação e de assistência social, entre outras, do território de origem do(a) adolescente.

6.4 RESPONSABILIZAÇÃO DO(A) ADOLESCENTE

A Política de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais (2012) destaca que a responsabilização é um dos objetivos da medida socioeducativa, que não pode ser meramente retributiva e punitiva. Nesse processo, o(a) adolescente precisa ser considerado(a) pelas equipes e abordado(a) enquanto sujeito de direito e protagonista de sua história, além de detentor de obrigações próprias de sua condição de pessoa em desenvolvimento.

Destacam-se dois aspectos abarcados no conceito de responsabilização, a saber: o jurídico e o subjetivo. Quanto ao primeiro, há que se considerar que a construção das intervenções na vida desse sujeito se inicia a partir da imposição da sentença para cumprimento da medida socioeducativa. Trata-se de uma intervenção nas atuações, apresentando a esse sujeito um limite legal quanto ao cometimento de práticas infracionais. O(A) adolescente é chamado a uma reflexão e reposicionamento a partir de uma interposição que rege a vida em sociedade por meio de instrumentais relacionados a um viés normativo.

Quanto ao aspecto subjetivo faz-se primordial ressaltar o caráter pedagógico da medida socioeducativa, que por meio de eixos apresenta possibilidades de reposicionamento a partir do que é singular a cada sujeito. O(A) adolescente deve acessar um conjunto de ações socioeducativas que contribuam com sua formação, de modo a alcançar autonomia, sendo-lhe oportunizado espaços de desenvolvimento da capacidade de tomar decisões fundamentadas e aprendendo com a experiência individual e social.

Tais considerações remetem ao esforço de se pensar sobre o trabalho que viabilize o processo de responsabilização nas diferentes medidas socioeducativas, tendo em vista a natureza diferenciada de cada uma delas, assim como das metodologias e as diversas abordagens técnicas que podem contribuir para que o(a) adolescente se encontre e cresça nessas elaborações.

Assim, é necessário que as equipes tenham atenção quanto ao acautelamento provisório, uma vez que o ato infracional ainda se encontra em apuração e não há decisão judicial proferida. Importante referenciar, neste ponto, a Metodologia do Provisóriona qual consta que o escopo do atendimento não se trata de trabalhar a responsabilização pelo ato infracional praticado, conforme já mencionado.

Da mesma forma, na internação-sanção também é exigida atenção quanto às elaborações a serem construídas com o(a) adolescente, uma vez que o trabalho de responsabilização se encontra diretamente relacionado ao descumprimento de medida anteriormente aplicada, seja ela em meio aberto, seja ela semiliberdade. Com isso, para que as intervenções técnicas voltadas à responsabilização sejam possíveis, conforme especificidades de tal Metodologia, é necessária uma construção em conjunto à equipe e ao PIA da medida anterior

Na semiliberdade e na internação por tempo indeterminado visa-se construir junto com o(a) adolescente caminhos para a responsabilização acerca do cumprimento da medida socioeducativa, de suas escolhas e decisões, buscando auxiliá-lo em um processo de ressignificação a partir de sua própria história de vida, permitindo um processo reflexivo quanto à relação estabelecida com a ilicitude e a construção de novas perspectivas de vida. Para tanto, é importante considerar os aspectos econômicos, sociais, étnico-raciais, culturais e subjetivos que atravessam os indivíduos e, consequentemente, suas escolhas, seus planos, seus sonhos e suas perspectivas.

Como forma de favorecer essas construções e a condução dos eixos da MSE, alguns espaços se fazem essenciais na rotina e na dinâmica de trabalho da equipe, com destaque para o atendimento técnico, conforme já mencionado. Esse dispositivo permite dar atenção aos aspectos em que é possível conduzir o(a) adolescente a questionamentos mais aprofundados quanto à sua implicação no cometimento do ato, seuengajamento no cumprimento da medida,bem como outras reflexões necessárias. Nesse processo busca- se ofertar ao(à) adolescente um espaço de escuta que possa contribuir para reflexões sobre as circunstâncias de sua inserção no contexto infracional, bem como compreender o significado disso em sua vida para, a partir daí, alcançar condições de construções diferenciadas.

A responsabilização aqui tratada diz do encontro do(a) adolescente com as elaborações a respeito do envolvimento infracional, de sua implicação com a medida socioeducativa e das proposições futuras de vida, o que se expressa por meio de seu envolvimento com os eixos da medida, as ações e metas pactuadas.Desse modo, a responsabilização não pode ser abordada pela equipe técnica sob uma perspectiva meramente abstrata, de difícil compreensão para o(a) adolescente, mas vinculada ao seu Plano Individual, à sua história, às suas escolhas e compromissos assumidos ao longo do cumprimento da medida socioeducativa.

Fundamental que a equipe socioeducativa também considere a importância da corresponsabilização de outros atores, por meio de construções estabelecidas em rede (de proteção, de apoio etc.) que serão essenciais para o retorno do(a) adolescente ao seu território de vivência. Nesse sentido, os profissionais devem se pautar na Constituição Federal de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente que estabelecem que a proteção integral da criança e do(a) adolescente é uma responsabilidade compartilhada entre a família, o Estado e a sociedade enquanto uma obrigação solidária entre essas partes. Isso implica compreender que as intervenções construídas com e para os(as) adolescentes exigem um esforço de articulação permanente entre as políticas públicas destinadas ao(à) adolescente e à família, as referências familiares e socioafetivas dos(as) adolescentes e a comunidade e os territórios (de origem e de localização da Unidade Socioeducativa).

Por fim, a responsabilização do(a) adolescente, a individualização de seu processo socioeducativo e a corresponsabilização dos atores necessários nas construções são aspectos que precisam ser consolidados no PIA. Além disso, conforme já destacado neste Programa de Atendimento, é preciso reforçar o aspecto garantidor de direitos da medida socioeducativa para que a autonomia a ser desenvolvida pelo(a) adolescente possa estar ancorada em ações intersetoriais, fortalecendo as possibilidades por ele(a) construídas.

6.5 ATIVIDADES COLETIVAS

As atividades coletivas, tais como grupos, oficinas, rodas de conversa, práticas esportivas, culturais e de lazer, dentre outros, são espaços pedagógicos que compõem a rotina institucional e são terreno fértil para o exercício do protagonismo juvenil na medida socioeducativa, pois possibilitam aos(às) adolescentes a oportunidade de discutir, refletir e construir ideias, conhecimento e se posicionar junto a seus pares.

As atividades coletivas configuram-se um importante instrumento de trabalho da equipe socioeducativa, pois possuem grande potencial socializador, por viabilizar a expressão voluntária dos sujeitos, promover a comunicação e dar espaço para o surgimento da criatividade, desenvolvendo habilidades e competências que contribuem para o crescimento pessoal dos(as) adolescentes.

Ademais, as atividades coletivas possibilitam a abordagem tanto de temáticasafetas aos eixos da medida socioeducativa (família e relações sociais; escolarização, profissionalização; saúde; cultura, esporte e lazer) como de temas transversais, mas que se mostrem pertinentes à socioeducação e interessantes para o coletivo de adolescentes, tornando-se espaços de ampliação do repertório sociocultural e de construção de conhecimento.

As atividades coletivas precisam ser planejadas considerando-se o público-alvo e o objetivo a ser alcançado. O planejamento deve contemplar aspectos técnicos e de segurança para definições objetivas, tais como: tipo de atividade, tema, quem fará a mediação, qual abordagem será utilizada, quantidade de participantes, se será interna ou externa à Unidade Socioeducativa, qual o local adequado à atividade, se envolverá instituições parceiras, qual profissional fará o acompanhamento etc.

É essencial garantir que a realização de uma atividade coletiva seja, efetivamente, pedagógica, de forma a promover condições de participação e reflexão dos(as) adolescentes a partir de um tema de interesse e da mediação qualificada e assertiva de profissional da equipe socioeducativa ou de parceiros externos. Destaca-se que a atividade coletiva não é um dispositivo de atuação exclusiva da equipe de atendimento, sendo possível e desejável que toda a equipe socioeducativa se envolva na execução de tais atividades.

A Unidade Socioeducativa deverá realizar avaliação das atividades coletivas ofertadas, com participação dos(as) adolescentes e profissionais envolvidos na prática, com vistas a acolher críticas, realizar ajustes e a aprimorar as práticas propostas, tornando-as cada vez mais atrativas e significativas para os(as) adolescentes atendidos.

6.6 ASSEMBLEIAS

As assembleias com adolescentes também possuem grande potencial para a promoção do protagonismo juvenil nas Unidades Socioeducativas, uma vez que se propõem a serem espaços de diálogo e de construção coletiva, oportunizando que a percepção dos(as) adolescentes acerca do cotidiano institucional seja traduzida em palavras, em discussões e em reivindicações que, acolhidas pela comunidade socioeducativa, possam reverberar na rotina institucional e nas condições de cumprimento e execução da medida.

Conforme a Metodologia de Atendimento da MSE de Internação (2012), denomina- se assembleia o espaço de discussão que agrega os(as) adolescentes, o corpo diretivo, os representantes das equipes de atendimento e de segurança em que são discutidos aspectos do funcionamento institucional e da convivência entre os(as) adolescentes.Trata- se, pois, de um espaço de mediação e de negociação no qual as necessidades e as demandas dos(as) adolescentes podem ser expressas por eles(as) mesmos(as) e discutidas, coletivamente, com vistas a subsidiar a deliberação do corpo diretivo sobre a pertinência e a viabilidade de seu acolhimento na organização da Unidade, o que, obviamente, deve ocorrer com foco no aprimoramento das condições para cumprimento dos eixos da medida pelos(as) adolescentes.

Embora seja um espaço de tensões entre os interesses individuais, o aspecto coletivo das pautas é que deve conduzir as discussões. Devem ser espaços sistemáticos na organização institucional e ocorrem indispensavelmente com a participação dos(as) adolescentes e ocasionalmente, com a presença da família (CONANDA, 2006, p.42).

Ressalta-se que as assembleias precisam promover o protagonismo para cumprir o objetivo ao qual se prestam. Para tanto, é importante evitar que elas reproduzam as formas de não protagonismo já mencionadas, sob pena de se tornarem encenações de caráter protocolar, realizadas apenas para legitimar a demanda institucional. Nessa perspectiva, cabe à Unidade Socioeducativa esclarecer aos(às) participantes acerca do funcionamento e dos objetivos das assembleias, de forma que esses(as) possam se apropriar do espaço e do lugar de fala, participando ativamente das discussões, contribuindo com questões e propostas a partir das vivências e percepções próprias.

6.7 ATIVIDADES EXTERNAS

As atividades externas se configuram como importante dispositivo para viabilizar a execução pedagógica da medida socioeducativa, pois oportunizam o encontro do(a) adolescente em privação ou restrição de liberdade com o meio externo à instituição, seja este(a) acompanhado(a) ou não por profissional da Unidade.

São oportunidades de fomento à circulação comunitária do(a) adolescente com vistas a promover a ressignificação dos espaços sociais e das relações do sujeito com a cidade. Trata-se de construir novas possibilidades de interação e de uso dos espaços públicos e privados, proporcionando ao(à) adolescente a vivência de territórios e experiências diversificadas, que se prestam a ampliar horizontes e, consequentemente, o reconhecimento e o acesso a direitos.

Importante salientar que a promoção das atividades externas se apóia na garantia de direitos, no exercício da cidadania, no acesso do(a) adolescente ao território e na oferta de possibilidades que contribuam com seu processo de responsabilização. Portanto, é fundamental que as atividades externas façam parte da rotina institucional dasUnidades, como dispositivo essencial para o cumprimento da medida.

As atividades externas auxiliam no cumprimento dos diversos eixos da medida e precisam ser planejadas e programadas levando-se em consideração tanto os aspectos particulares do caso (interesses e necessidades do(a) adolescente) como os aspectos institucionais, tais como logística exigida para sua realização, necessidade de acompanhamento e recursos materiais que possam ser necessários, dentre outros.

Importante destacar que, na semiliberdade, a atividade externa é inerente ao processo de cumprimento da medida desde a admissão do(a) adolescente, respeitadosos prazos estabelecidos em Regimento próprio das Casas de Semiliberdade.

Salienta-se que as atividades externas não se aplicam, a priori, aos(às) adolescentes que se encontram em acautelamento provisório, devido à natureza da medida e a imprevisibilidade temporal.

Na medida de internação por tempo indeterminado, a equipe deve iniciar essa construção já no primeiro estudo de caso para elaboração do PIA, tendo em vista o princípio da incompletude institucional e as diretrizes estabelecidas neste Programa de Atendimento e em outros documentos orientadores do Sistema Socioeducativo mineiro, no sentido de que as medidas socioeducativas devem ser construídas com a comunidade socioeducativa e pautadas por práticas pedagógicas, garantindo-se o direito de acessar a cidade e os recursos ofertados pelo município.

Nessa perspectiva, toda a equipe socioeducativa precisa participar do processo de construção e promoção das atividades externas, devendo a avaliação da inserção do(a) adolescente não se pautar somente em critérios objetivos e comportamentais, masconsiderar a importância dessa ação enquanto recurso pedagógico que faça sentido para o cumprimento da medida socioeducativa pelo(a) adolescente.

Transitar e reconhecer diferentes espaços sociais, lugares de constantes produções, provoca efeitos diversos nos(as) adolescentes e, a partir desse encontro coma liberdade, a comunidade socioeducativa poderá colher percepções e comportamentos que poderão subsidiar a construção e o desenvolvimento, individual e coletivo das juventudes, nos eixos das medidas. As atividades externas devem ser articuladas aqualquer tempo, não somente frente ao processo de desligamento, isso porque, durante oprocesso socioeducativo, é fundamental para a avaliação da equipe compreender como o(a) adolescente se relaciona com a possibilidade de circular pela cidade.

Considerando-se os princípios que norteiam a execução das medidas de privação e restrição de liberdade, as atividades externas devem ser previstas em todos os casos, salvo quando da existência de fundamentada decisão judicial em contrário. A previsão de participação dos(as) adolescentes em atividades externas deve constar no plano de intervenção construído na pactuação do PIA, de modo que este explicite quais atividades foram pensadas a partir do discurso inicial do adolescente, sendo que, no decorrer da medida, o plano pode ser revisto e requalificado conforme a evolução ou o surgimento de novas demandas do caso.

A comunidade socioeducativa deverá planejar e executar, mensalmente, as atividades externas para os(as) adolescentes da internação sem tempo determinado seja desacompanhado ou não, que envolvam a realização de ações:

  • culturais, esportivas, de lazer e de assistência religiosa;
  • de educação, profissionalização, trabalho;
  • que promovam o exercício da cidadania;
  • promovam a convivência familiar e comunitária.

As saídas poderão acontecer a qualquer momento, desde que avaliadas pela equipe, seguindo critérios judiciais e técnicos, com o devido registro qualificado nosrelatórios de acompanhamento de medida enviados ao Poder Judiciário. Na MSE de Internação, a avaliação de quais adolescentes estão aptos(as) a participar das atividades externas deve considerar o previsto no regimento dos Centros Socioeducativos quanto aos prazos e critérios, bem como a indicação técnica que avalie a atividade como fundamental para o processo socioeducativo do(a) adolescente, reconhecendo o cumprimento satisfatório dos requisitos estabelecidos, principalmente, a partir do interesse e significado da atividade para o(a) adolescente, bem como as ações estratégicas pactuadas no PIA.

Nos casos em que for constatada circunstância impeditiva ou que contraindique a saída do(a) adolescente para atividade externa, a equipe socioeducativa deverá fundamentar tal avaliação e decisão. A suspensão da autorização para atividades externas deverá ser reavaliada em até 30 (trinta) dias.

Isto posto, reitera-se o preceito de que, ao avaliar esse encaminhamento, a Unidade precisa considerar não somente critérios objetivos para o planejamento das atividades ou aspectos comportamentais dos(as) adolescentes, mas prioritariamente, se a atividade externa faz sentido para aquele(a) adolescente e o momento em que ele(a) está no cumprimento da medida socioeducativa, a fim de que seja uma vivência significativa nasua trajetória e promova sentido ao seu projeto de vida.

Ademais, cabe ressaltar que o percentual de adolescentes inseridos(as) em atividades externas é um dos indicadores de desempenho acompanhados pela SUASE em cada uma das Unidades Socioeducativas. Ao ser estabelecido como indicador, esta ação afirma-se como componente da metodologia que orienta a política de atendimento socioeducativo. Ou seja, não se trata de uma ação pontual e isolada, mas sim de um dispositivo pedagógico que deve perpassar todo o processo da socioeducação, trabalhando importantes pontos com o(a) adolescente como o pertencimento a umacomunidade, a coletividade, a responsabilidade e a relação com a liberdade durante o cumprimento da medida socioeducativa.

6.8 PROTAGONISMO JUVENIL

As Unidades Socioeducativas, pautadas na dimensão pedagógica das medidas, deve favorecer e criar espaços para que o protagonismo dos(as) adolescentes e jovens atendidos(as) possa emergir. Ao destacar que o processo de socioeducação deve oportunizar autoconhecimento, reflexões, ressignificações e novas perspectivas que possam conduzir ao rompimento com a trajetória infracional, este Programa de Atendimento direciona olhares e intervenções para o fomento ao protagonismo juvenil.

Sob essa ótica, protagonismo pode ser entendido como a capacidade de um indivíduo em reger suas próprias decisões e solucionar seus próprios conflitos (DICIO, 2022). O sujeito encontra-se numa posição de evidência, na qual exerce o papel de ator principal das ações que executa.

A partir do advento da Constituição Federal de 1988 e o ECA, crianças e adolescentes deixaram de ser tratados como meros objetos da intervenção do Estado, alcançando o status de sujeitos de direitos. Essa mudança de paradigma favoreceu a perspectiva do fomento e o suporte ao protagonismo juvenil por meio das diversas políticas sociais.

Nessa conjuntura, as diretrizes pedagógicas do SINASE estabeleceram que a socioeducação tem o papel de promover a participação ativa e efetiva dos(as) adolescentes nas ações que os envolvam (BRASIL, 2012). Na mesma perspectiva COSTA (2001) pontua que o protagonismo é a “modalidade de ação” em que se possibilita ao sujeito, em uma área propícia de atuação, a criação de estratégias capazes de resultar na solução de controvérsias que vierem a surgir, considerando os aspectos da “iniciativa, liberdade e compromisso”.

Ainda segundo COSTA (2001), quando se trata de protagonismo juvenil há de se observar uma peça-chave na construção dessa definição: os(as) jovens.Assim, é imprescindível que eles(as) estejam presentes nos projetos e nas atividades que os(as) envolvam, em toda e qualquer política pública, incluindo o Sistema Socioeducativo, pois é impossível promover a socioeducação na ausência do sujeito adolescente.

6.8.1 Formas de não-protagonismo

O desafio que se coloca aos adultos, quando trabalham com a premissa do protagonismo juvenil, é deixar que os(as) adolescentes se planejem, encontrem soluções e vivenciem as situações do dia a dia, sem agir e resolver o conflito por eles(as). Nesse sentido, a participação dos adultos deve se limitar a interferências pontuais e diretivas.

Sob esse prisma, Costa (2006) destaca as principais formas de não-protagonismo que podem ser forjadas por adultos nas relações com adolescentes, a saber: a manipulação, o simbolismo e a decoração. A manipulação se dá quando se influencia o(a) adolescente a agir e a pensar de determinada forma, reproduzindo as direções dadas por adultos. Essa forma de não-protagonismo reduz as oportunidades de reflexão e ação do outro, não favorecendo a compreensão completa do que está acontecendo.

Já o simbolismo consiste em conduzir os(as) adolescentes até instâncias coletivas somente para lembrar aos adultos que eles(as) existem e são importantes. Nestas situações eles(as) até podem dizer algo e se manifestar, mas suas falas não têm relevância e não serão utilizadas na hora de definir algo (COSTA, 2006). Trata-se de um artifício simbólico que instrumentaliza os(as) adolescentes e não favorece o ProtagonismoJuvenil.

Por sua vez, a decoração é um nível abaixo do simbolismo, uma vez que, nesse caso, os(as) adolescentes só se fazem presentes, mas não podem falar ou expressar sua opinião (COSTA, 2006). Sob esse viés, quando não se oportuniza ao(à) adolescente o direito de escolha ou de tomar suas próprias decisões de forma consciente, ele(a) tende a não assumir uma posição de protagonismo. Dessa forma, é possível que, posteriormente, sejam identificados comportamentos de dependência, de falta de motivação e de dificuldade em dizer o que se pensa.

O não protagonismo pode até ser involuntário, mas isso não significa que seja menos prejudicial. Por isso, todos os envolvidos na execução das medidas socioeducativas devem estar atentos para evitar atitudes que estimulem essa prática.

Cabe à equipe socioeducativa fomentar e desenvolver estratégias que promovam e potencializem a autonomia e a emancipação dos(as) adolescentes, por meio de práticas pedagógicas mais interessantes, criativas e participativas. Busca-se, com isso, tornar as atividades mais atrativas e efetivamente protagonizadas pelos(as) adolescentes, de modo que encontrem espaços nos quais suas vozes possam ser ouvidas e reverberem em ações concretas.

Com o intuito de promover a participação dos(as) adolescentes na construção deste Programa de Atendimento, instituiu-se o grupo de trabalho (GT)Protagonismo Juvenil, que desenvolveu proposta metodológica para abarcar as contribuições dos(as) destinatários(as) das medidas socioeducativas, como será apresentado na próxima seção.

6.8.2 Participação     dos(as)    adolescentes    na    elaboração    do    Programa    de Atendimento

Visando promover a construção coletiva sobre o protagonismo juvenil nas medidas socioeducativas, o GT responsável por desenvolver o tema no âmbito da Comissão de Elaboração do Programa de Atendimento contou com a vivência e o conhecimento de atores engajados na socioeducação em Minas Gerais.

O GT construiu o roteiro de pesquisa/entrevista, intitulado “Eu protagonista”6, que norteou a realização de atividades que abordaram os temas protagonismo juvenil, participação social e cidadania, sendo utilizadas múltiplas abordagens, como rodas de conversa, dinâmica de grupo e atendimentos individuais. Tais ações tinham como objetivo oportunizar a participação direta dos(as) adolescentes por meio de atividades individuais e coletivas que possibilitaram agregar suas contribuições a este Programa.

Foi contabilizada a participação de 155 (cento e cinquenta e cinco) adolescentes vinculados(as) às Unidades Socioeducativas, com representatividade das medidas de internação, semiliberdade e internação provisória.Como resultado, apresenta-se a

6 O roteiro de pesquisa/entrevista encontra-se disponível no Apêndice A deste Programa de Atendimento.

 

O roteiro “Eu Protagonista” foi elaborado de modo a contemplar os eixos que orientam a execução d concepção do protagonismo juvenil pela perspectiva da socioeducação, na qual o(a) adolescente precisa se descobrir como o sujeito central na construção da medida socioeducativa. as medidas socioeducativas, com vistas a estimular o(a) adolescente a empreender uma análise acerca do trabalho da socioeducação e a elencar propostas em que possa se reconhecer parte ativa e corresponsável pelo processosocioeducativo.

A partir dos relatos dos(as) adolescentes nas atividades desenvolvidas pelo GT, as informações foram sistematizadas e organizadas conforme cada eixo da medida socioeducativa, de maneira a evidenciar aquelas que tiveram predominância no discurso dos(as) adolescentes. Assim, no capítulo que detalha os eixos da medida, conta-se, além das considerações técnicas e legais, com a perspectiva qualitativa dos(as) adolescentes na construção acerca dos aspectos norteadores da medida socioeducativa.

6.8.3 Achados do “Eu Protagonista”

A partir das ações realizadas pelo GT Protagonismo Juvenil foi possível perceber que há certo desconhecimento por parte dos(as) adolescentes acerca do significado da palavra “protagonismo”. Além disso, os(as) jovens não souberam verbalizar como poderiam se tornar protagonistas de suas próprias histórias, ficando evidenciada a escassez de participação em ações e em projetos nas comunidades onde residem e o pouco diálogo com a família sobre seus desejos, anseios e projetos de vida.Quando a pauta do Projeto de Vida foi posta em discussão, foi necessária a exemplificação do que se tratava para que, assim, os(as) adolescentes conseguissem dizer sobre seus sonhos e planos para o futuro. Importante destacar que, durante a realização das rodas de conversa pelo GT Protagonismo Juvenil, houve adolescentes que optaram pela abstenção, não respondendo a alguns pontos colocados pelos(as) facilitadores(as). Tal posição foi respeitada, sendo mencionado que o silêncio também pode ser uma forma de desenvolvimento do protagonismo enquanto exercício do poder de escolha do indivíduo.

Lado outro, o silêncio, a abstenção, o desconforto em espaços de debate, podem se dar, também, por se tratar de um lugar e uma posição relativamente novos na trajetória dos(as) adolescentes. Necessário, pois, que as equipes socioeducativas garantam que espaços de diálogo e participação dos(as) adolescentes façam parte do cotidiano das Unidades Socioeducativas, por meio da construção e da execução de eventos, de festividades, mostras culturais, de rodas de conversa temáticas, assembleias, entre outros.

 

Imagem 1: Roda de Conversa com adolescentes do Centro Socioeducativo de Ribeirão das Neves, maio de 2022.

 

Fonte: GT Protagonismo Juvenil da Comissão de Elaboração do Programa de Atendimento. Maio de 2022.

 

A promoção de espaços participativos que envolvam, conjuntamente, a equipe socioeducativa, os(as) adolescentes e suas famílias têm o potencial de fortalecer os vínculos, possibilitando maior sensibilização, mudanças de atitudes e promoção dereflexões propostas na própria vida.Assim, cabe à equipe socioeducativa, visando a promoção do protagonismo juvenil de forma plena, desenvolver ações que possibilitem também às famílias exercerem sua função socializadora e se fortalecerem enquanto fator de proteção na vida dos(as) adolescentes, apoiando-os(as) em suas decisões em relação aos novos projetos de vida e mudanças de rumos para rompimento com a trajetória infracional.

Ao longo do processo de socioeducação, a equipe socioeducativa deve propor, construir e executar com e para os(as) adolescentes ações e estratégias que potencializem o autoconhecimento, a responsabilização e o engajamento dos(as) adolescentes na construção de um projeto de vida em que seja sujeito desse percurso e se reconheça enquanto protagonista de sua própria história. Para que as equipes de atendimento possam contribuir com esse processo, faz-se imprescindível a escuta qualificada, buscando-se alcançar o equilíbrio entre o saber técnico e o saber de si, visto que um encaminhamento tecnicamente correto não é, necessariamente, o mais legítimo e sustentável para o(a) adolescente e sua família.

É preciso, pois, que os profissionais envolvidos no atendimento aos(às) adolescentes estejam abertos a reconhecer e a acolher, empaticamente, as necessidades dos(as) adolescentes, a se despir dos preconceitos e a se permitir conhecer os saberes trazidos por eles(as) para que os encaminhamentos pretendidos tenham maiores chances de efetivação.

A socioeducação precisa, portanto, basear-se na singularidade do caso, uma vez que o percurso de execução da medida socioeducativa deve ancorar-se na perspectiva da individualização do atendimento. Isso somente é possível de ser alcançado a partir do fomento e da promoção do protagonismo do(a) adolescente, que, assim, terá condições de participar ativamente do seu processo de socioeducação, bem como de elaborar e sustentar, de forma autoral e com apoio de sua rede de proteção, seu projeto de vida fora da instituição.

6.9 ROTINA INSTITUCIONAL: A CONSTRUÇÃO DIALÓGICA DA UNIDADE

Ao longo deste capítulo foram apresentados métodos e técnicas essenciais para nortear o trabalho da equipe socioeducativa na perspectiva da construção dialógica, partindo do princípio de que cada adolescente carrega consigo uma bagagem peculiar, composta por suas experiências, vivências e por suas características pessoais, considerando também o meio familiar e sociocultural em que vive. A equipe socioeducativa, ao planejar as práticas pedagógicas, deve ter clareza quanto aos objetivos que pretende alcançar, seja em uma rotina individual ou coletiva, que se concretizam na rotina institucional.

Tal rotina trata do planejamento detalhado das ofertas institucionais para efetivar a execução da medida socioeducativa. É composta por atividades individuais e coletivas, internas e externas, que são sistematizadas e organizadas cronologicamente ao longo dos dias, de forma que a equipe socioeducativa tenha compreensão da programação prevista para cada momento (horário de acordar, autocuidado, atividades escolares, oficinas, refeições, atendimento técnico, visitas da família, ligações etc.).

Nesse sentido, a rotina se torna uma ferramenta essencial para garantir que os(as) adolescentes consigam cumprir de forma mais efetiva e equivalente os eixos das medidas socioeducativas, pois é neste dispositivo que será organizada a participação de cada adolescente em atividades que perpassam todos os eixos. Para que seja alcançado o objetivo principal da rotina, que é garantir acesso aos direitos e ampliar a perspectiva do seu projeto de vida, considerando o perfil do(a) adolescente, não pode se configurar em um instrumento engessado, mas sim flexível e adaptável quando necessário.

A partir do planejamento é que a equipe socioeducativa pode proporcionar ao(à) adolescente o melhor aproveitamento de seu tempo, ou seja, a rotina institucional é, também, um instrumento a ser considerado no processo de individualização do atendimento, associando-se os interesses ou demandas dos(as) adolescentes às ofertas institucionais.

No processo de construção da rotina institucional é preciso avaliar se as atividades consideram, em seu planejamento, os saberes, habilidades, competências e defasagens de cada adolescente a quem a atividade é proposta.

A função da equipe socioeducativa é definir, inicialmente, os processos de ensino e aprendizagem, individuais e coletivos dos(as) adolescentes, que os envolvam como protagonistas, refletindo sobre o que as juventudes sabem frente ao que se desejatrabalhar, suas experiências, seus interesses, como motivá-los(as) e quais ferramentas e métodos poderão facilitar a aprendizagem. Compete também à equipe socioeducativa avaliar os processos para qualificar a atuação dos mediadores/educadores, refletindo sobre a ação desenvolvida, como os indivíduos aprendem e quais meios para ajudá-los em seu crescimento.

Portanto, a rotina institucional exige planejamento integrado e organização prévia, uma vez que é o dispositivo que irá estruturar o processo socioeducativo fomentando o acesso aos direitos e incentivando a participação dos(as) adolescentes em cumprimento de medida. Uma construção dialógica, composta por membros da comunidade socioeducativa, nos quais as suas atribuições estejam relacionadas com o que será ofertado pela instituição e, sempre que possível, representantes dos(as) adolescentes, corrobora para a consolidação de uma concepção pedagógica que incentiva o protagonismo e articula-se com os objetivos contidos nos Planos Individuais de Atendimento, contemplando os eixos da medida de maneira qualificada.

De acordo com Antônio Carlos Gomes da Costa (1977) “A medida socioeducativa é uma decisão; o programa socioeducativo a ser desenvolvido junto ao adolescente é ação.”. Assim, atender com qualidade e de forma articulada com as diversas políticas públicas se faz necessário para que a rotina institucional seja construída na perspectiva da ressignificação do projeto de vida, em consonância com os preceitos estabelecidos nas normativas internacionais das quais o Brasil é signatário, com a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Sistema Nacional de AtendimentoSocioeducativo, bem como com o Projeto Pedagógico institucional.

Em consonância com o que é preconizado por essas legislações e diretrizes, a rotina deve contemplar o desenvolvimento: da formação educacional e profissional; de promoção do esporte, do lazer e da cultura; de promoção ao exercício da cidadania; de convivência e espaço coletivo; de diversidade étnico-racial, de gênero e de orientação sexual; de atendimento técnico especializado; de garantia aos cuidados e atenção à saúde através da rede de atendimento local; e de fortalecimento de vínculos familiares e comunitários. Visando contemplar a todos(as) os(as) adolescentes durante o cumprimento da medida, essas temáticas devem ser integradas e distribuídas na composição da rotina. Além disso, faz-se necessário que esteja previsto na rotina a garantia da oferta de assistência religiosa, tendo em vista a condição de privação de liberdade do(a) adolescente(a) e jovem, sendo direcionada apenas àqueles(as) que manifestarem o desejo de receber suporte religioso de acordo com suas crenças, sendo respeitados(as) os(as) que não desejarem participar.

Vale destacar que o espaço e o tempo são elementos determinantes para o desenvolvimento das atividades e oficinas socioeducativas na perspectiva de maior alcance para a aprendizagem e organização institucional da equipe. É preciso que a organização desse espaço seja pensada como um ambiente acolhedor, em que os(as) adolescentes possam se sentir estimulados(as), pertencentes e autônomos(as).

Por isso, é fundamental o uso de ambientes individuais e coletivos preparados para o desenvolvimento das aprendizagens. Como por exemplo, o tempo que se destina na rotina para o uso do refeitório pelos(as) adolescentes: a alimentação sempre teve, ao longo da história, uma função social, seja para compartilhar um prazer ou um modo de sere viver, assim como os aspectos afetivos entrelaçados nesta ação. Cabe à Unidade ampliar os conceitos da intencionalidade educativa nas horas das refeições, propiciando um momento de socialização entre todos da comunidade socioeducativa, assim como o desenvolvimento psíquico e social dos(as) adolescentes.

Insta salientar que toda essa construção da rotina institucional deve possibilitar que o(a) adolescente aprenda a selecionar e eleger prioridades, expor o seu ponto de vista, a posicionar-se de acordo com as suas preferências, compreendendo as suas habilidades e competências, de tal modo que aprenda a lidar com frustrações e limites, o que fortalece o aprendizado do respeito ao outro e a si mesmo, com igualdade de direitos e deveres.

Torna-se evidente que para garantir a execução da rotina, é essencial uma equipe socioeducativa qualificada e que busque superar os desafios de maneira articulada e estratégica. Importante destacar, ainda, a necessidade de ações de segurança planejadas e a prontidão de resposta qualificada e oportuna a eventos de segurança e, que visam propiciar condições favoráveis ao desenvolvimento das atividades escolares, profissionalizantes, sociais, saúde, culturais, esportivas, recreativas, bem como as atividades de autocuidado, sejam internas ou externas à unidade

A rotina institucional, assim como os demais dispositivos, métodos e práticas pedagógicas apresentados neste capítulo visam instrumentalizar as Unidades Socioeducativas para que promovam condições de efetivo cumprimento das medidas socioeducativas pelos(as) adolescentes, por meio da execução dos eixos norteadores da socioeducação, que serão apresentados no próximo capítulo.

 

Comentario

7. EIXOS NORTEADORES DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS

Os eixos norteadores das medidas socioeducativas são pautados em garantias fundamentais que devem ser asseguradas aos(às) adolescentes a quem foi atribuída autoria de ato infracional, com o intuito de promover protagonismo, acesso a direitos sociais e o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários.

Conforme mencionado no capítulo 6, devem estar contidos no PIA de cada adolescente os eixos que orientam a execução da medida socioeducativa, a saber:

  • Educação;
  • Profissionalização;
  • Esporte, Cultura e Lazer;
  • Saúde; e
  • Família e relações sociais e comunitárias.

Destaca-se que a responsabilização pela medida socioeducativa deve ser construída a partir do desenvolvimento e do enlaçamento do(a) adolescente com os eixos,conforme o pactuado no PIA. Estabelecem-se, assim, diretrizes ou caminhos para que o(a) adolescente possa se responsabilizar a partir de uma construção individualizada e transversal, por meio das ações estratégicas em cada eixo.

A seguir serão apresentadas as diretrizes para execução dos eixos da medida socioeducativa, bem como as contribuições dos(as) adolescentes que participaram das atividades desenvolvidas pelo GT que abordou o tema do protagonismo juvenil e outras colhidas junto às Unidades Socioeducativas.

7.1 EDUCAÇÃO

Sobre a escola, eu acho muito importante para mudar de vida. Quero estudar para conseguir novas oportunidades. Na escola eu gosto de Matemática e Educação Física, mas Português eu não gosto. Nunca tive nenhuma discriminação na escola e minha relação com os professores e outros adolescentes é boa, tranquila. Otempo que eu estive na escola me fazia pensar no futuro, conversava muito com os professores. Acho que a escola me ajuda a ocupar o meu tempo com mais sabedoria. (relato de adolescente em cumprimento de MSE durante oficinas do GT Protagonismo Juvenil, 2022).

A Educação é um direito fundamental de toda criança e adolescente, como preveem a CRFB/88, o ECA e o SINASE que, por sua vez, instituem a obrigatoriedade da oferta da educação escolar aos(às) adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa, garantindo os princípios de uma formação humana, ética e cidadã.

Do mesmo modo, a oferta da educação escolar para adolescentes e jovens em cumprimento de medida socioeducativa deve estar em consonância com o que preceitua a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Federal nº 9.394/1996), a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o Currículo Referência de Minas Gerais (CRMG) que visam oportunizar que todos os estudantes, independente da rede em que estejam matriculados, tenham garantia e acesso à aprendizagem mínima do que está previsto, assim como uma política similar vigente. Nesse contexto, insta esclarecer que nas Unidades de internação, internação provisória e internação-sanção o atendimento escolar é viabilizado por meio de escolas situadas no interior dos Centros Socioeducativos, o que não exclui a possibilidade do(a) adolescente em cumprimento de medida de internação ser matriculado (a) em rede de ensino externa, diante de encaminhamento para participação em cursos externos, para o mercado de trabalho ou outras oportunidades relacionadas aos demais eixos da medida que possam gerar incompatibilidade de horário na frequência escolar.

O atendimento escolar nas Unidades Socioeducativas leva em consideração a característica de cada medida. Assim, por se tratar de uma medida mais breve, com prazo máximo de 45 dias, aos(às) adolescentes em cumprimento de internação provisória no estado de Minas Gerais, é ofertado o acompanhamento pedagógico empreendido por meio de oficinas pedagógicas de Matemática, de Língua Portuguesa e temáticas transversais. Essas oficinas devem criar oportunidades de interação que qualifiquem o processo de construção de conhecimentos, além de aprimorar seu letramento, por meio de projetos estruturados que tenham a sua execução célere com início, meio e fim.

Nesse período, a matrícula escolar do(a) adolescente não é efetivada, mas a SEE/MG orienta que as escolas estaduais que funcionam nas Unidades devem preencher a Declaração de Frequência e Participação em Oficinas de Acompanhamento Pedagógico Provisório, cujo documento deverá conter a identificação da escola e do(a) estudante, bem como a informação sobre a carga horária cumprida e o plano de atividades desenvolvido. Outro aspecto importante que a comunidade socioeducativa deve refletir é sobre aquele(a) adolescente que tem o vínculo escolar ativo, ao chegar no cumprimento de medida de internação provisória, deve ser garantida a continuação dos seus estudos.A equipe técnica da Unidade, principalmente o(a) pedagogo(a), deverá articular com a instituição de ensino com a qual o(a) adolescente possui vínculo escolar ativo, o envio de um plano de atividades diferenciadas para ser desenvolvido na unidade, através damediação do professor regente que atua no Acompanhamento Pedagógico.

Para os(as) adolescentes em cumprimento de MSE de internação é ofertado o ensino regular. Considerando-se que os(as) adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa podem apresentar significativa distorção idade/ano escolar e, para amenizar as deficiências escolares dos(as) educandos(as), foi adotado o seguinte sistema de correção de fluxo:

  • Ensino Fundamental - anos iniciais: realizado em 1 (um) ano 1° (primeiro) ao 5° (quinto) ano;
  • Ensino Fundamental - anos finais: divididos em 2 (duas) etapas: 6° (sexto)/7° (sétimo) ano e 8º (oitavo)/9° (nono) ano;
  • Ensino Médio: realizado por área de conhecimento com duração anual.

Ressalta-se que, os(as) adolescentes(as) em cumprimento de MSE de internação sanção cuja determinação judicial estabelecer o prazo de sanção de até 30 (trinta) dias, permanecerão inseridos em atividades e rotinas da internação provisória, ou seja, será ofertado a esses(as) adolescentes o acompanhamento pedagógico. Mas, os(as) adolescentes que receberam internação sanção por prazo superior a 31 (trinta e um) dias, deverão ser matriculados(as) na rede de ensino interna ao Centro Socioeducativo.

Já o atendimento escolar aos(às) adolescentes que cumprem medida socioeducativa de semiliberdade, conforme previsto na metodologia e tendo em vista a característica da medida, deve ocorrer em escolas da rede externa. Os(as) adolescentes da semiliberdade devem ser matriculados(as) preferencialmente nas instituições que estejam localizadas no território da Casa de Semiliberdade, podendo ser na modalidade Educação de Jovens e Adultos (EJA), em projetos específicos de aceleração ou em qualquer outra instituição que ofereça o ensino regular, observando-se as especificidades do caso.

Seja a medida atribuída a de internação, internação provisória, internação-sanção ou de semiliberdade é primordial que as equipes socioeducativas empreendam ações visando contribuir para um atendimento escolar mais qualificado e que de fato façasentido para o(a) adolescente.

Nessa perspectiva, a equipe técnica, em especial o(a) pedagogo(a), deve, por meio de atendimento, colher informações sobre a trajetória escolar pregressa do(a) adolescente e outras que poderão contribuir para ações mais assertivas e que proporcionem uma aprendizagem com mais qualidade. Cabe frisar que para os (as) adolescentes em cumprimento de medida de internação sem tempo determinado ousemiliberdade, tais dados poderão auxiliar no desenvolvimento de ações e encaminhamentos que constarão do Plano Individual de Atendimento, bem como poderãoassessorar na construção do caso.

Além disso, e até mesmo antes de providenciar a matrícula escolar do adolescente, o(a) pedagogo(a) da unidade deverá aplicar uma avaliação que vise mensurar o nível de conhecimento do(a) adolescente, o seu tipo de aprendizagem e identificar suas maiores dificuldades, habilidades e competências, favorecendo assim a realização de práticas pedagógicas que contribuam para uma aprendizagem significativa e gradativa, considerando o seu conhecimento prévio. Esse instrumento também subsidiará as ações iniciais do corpo docente, da supervisão e da direção escolar, assim como irá nortear as ofertas de oficinas/atividades dentro da rotina da unidade, fora do contexto da escolar.

Ainda no que toca à matrícula escolar, a sua efetivação deve ser garantida tão logo o(a)adolescente seja admitido na Unidade, devendo a equipe técnica iniciar as providências a fim de inseri-lo na escola. Para tanto, a Unidade Socioeducativa, ensejando a disponibilização da documentação escolar, deverá articular com a família do(a) adolescente a retirada do histórico na instituição escolar pregressa e entrega do documento na Unidade Socioeducativa.

Diante da impossibilidade de obtenção do referido documento pela família do(a)adolescente, a Unidade Socioeducativa deverá acionar as instituições escolares pregressas sinalizadas pela família e/ou pelo(a) adolescente, visando a regularização da documentação escolar.

Nesse sentido, importa ressaltar o papel fundamental da família ou referência familiar, que não se resume a contribuir na provisão da documentação escolar e ao fornecimento de informações sobre a vida escolar pregressa do(a) adolescente, mas vai além: por meio de sua participação em reuniões, feiras, eventos, a família poderá realizar o acompanhamento do desenvolvimento escolar e da rotina do(a) adolescente na Unidade Socioeducativa.

A vista disso, cabe ressaltar que as ações do(a) pedagogo(a) não se limitam àquelas destinadas à efetivação da matrícula e avaliação inicial, mas perpassam, durante todo o processo de socioeducação, pelo acompanhamento do desenvolvimento de cada adolescente no espaço escolar e, nesse sentido devem ser propostas estratégias que visem ressignificar a sua trajetória educacional, fortalecendo o vínculo com a educação, a melhoria da aprendizagem escolar, seja por meio de reforço, ações de incentivo à leitura, uso da biblioteca ou outras possibilidades.

Ao longo da construção dos caminhos da educação para o(a) adolescente em cumprimento de medida socioeducativa, é importante que o desenvolvimento desse eixo seja qualificado na rotina institucional por meio de oficinas cujas metodologias visem trabalhar pré-requisitos para o bom desempenho escolar, como: raciocínio lógico, letramento matemático, desenvolvimento da escrita, leitura, coordenação motora, ação pedagógica de pesquisa considerando os interesses dos(as) adolescentes, a fim de estimular o desejo pelo saber e pela escola.

O eixo educação pode ser desenvolvido pela comunidade socioeducativa por meio de oficinas de cartas, alfabetização e letramento, jogos de raciocínio lógico, construção de jornal mural, oficina de conhecimentos gerais e multidisciplinares, feiras de ciências, saraus literários de gêneros textuais diversos, seminários de pesquisa etc. É de extrema importância o uso de didáticas e ferramentas diferenciadas, que perpassem o ensino tradicional, utilizando recursos tecnológicos, visando o preparo desses(as) adolescentes para o mundo letrado em que estamos inseridos.

No rol de ações executadas pelo(a) pedagogo(a) também está incluída a participação em reuniões bimestrais e conselhos de classe, oportunidade em que poderá contribuir com pontos importantes sobre a trajetória escolar pregressa do(a) adolescente/aluno(a), e ainda trazer percepções sobre comportamento desse em outros espaços da Unidade, de maneira a possibilitar uma visão mais ampla do(a)adolescente na medida e assim a melhor compreensão sobre sua postura em sala de aula, diante de situações como indisciplina ou apatia, externadas pelo corpo docente.

Nesse viés, é basilar que haja o diálogo constante entre a Unidade Socioeducativa e a instituição escolar, no sentido de acompanhar o desenvolvimento do(a) adolescente e propor intervenções com intencionalidades pedagógicas mais assertivas. Tal ação não deve se dar apenas nas instituições escolares que atendem internamente os Centros Socioeducativos, mas também com a rede escolar externa, onde o(a) adolescente está matriculado.

Outrossim, também é fundamental a realização de reuniões periódicas com a participação não somente de representantes da escola, mas dos demais profissionais da equipe socioeducativa, visando o alinhamento do trabalho, o planejamento de ações educativas, bem como a realização de semanas temáticas, comemoração de datas festivas, como: reunião de pais, formatura, entrega de certificação, incluindo as datas comemorativas e temáticas propostas pela SUASE.

Outro ponto de extrema importância no eixo educação é a participação da família. As referências familiares precisam participar do processo de inserção do(a) adolescente na escola e na rotina da Unidade desde o início da medida, fornecendo informações sobrea vida escolar pregressa e as escolas onde o(a) adolescente já estudou, além de contribuir na provisão da documentação escolar. A Unidade Socioeducativa e a escola devem realizar um trabalho conjunto para promover a participação da família, de forma que ela possa acompanhar o desenvolvimento escolar do(a) adolescente. A equipe socioeducativa também deve realizar articulações com o território dos(as) adolescentes, criando estratégias para estreitamento dos laços e interação entre a equipe escolar e a comunidade local.

Buscando inserir a participação dos(as) adolescentes na construção deste Programa de Atendimento, o GT Protagonismo Juvenil buscou compreender junto aos(às) adolescentes o principal problema que se impõe à garantia do direito à educação, que segundo eles(as) é a fragilidade dos vínculos entre adolescentes e a escola do território de vivência. Relataram sobre as inseguranças ao retomar os estudos após odesligamento por sentirem dificuldade de acompanhar o conteúdo e por considerarem desafiador o relacionamento com os demais estudantes e a instituição escolar. Além disso, pontuaram temer episódios de violência ou de preconceito ao frequentarem a escola.

Ainda nas atividades do GT Protagonismo Juvenil foi possível perceber, a partir do relato de adolescentes sobre o afastamento da escola e da dificuldade de acompanhar os conteúdos ministrados, que questões relacionadas ao embaraço na aprendizagem são recorrentes. Foram relatados impasses com disciplinas mais teóricas e demandadasaulas mais dinâmicas e interativas que se relacionassem com questões práticas do dia-a- dia.

Esses pontos direcionam para a necessidade de construção de práticas pedagógicas mais aderentes, interessantes e motivadoras tanto no espaço escolar quantonas demais atividades pedagógicas, além da promoção de ações de inclusão e participação dos(as) adolescentes no contexto escolar, como por exemplo: atuação como monitores(as), indicação de representante de turma, assembleias, grêmio estudantil, entre outras ações.

A vista disso, e como estratégia para promover uma comunicação eficaz entre escola e a equipe socioeducativa, a SUASE, as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação realizam parcerias e encontros periódicos. O diálogo entre as instituições é, pois, essencial para que as Unidades consigam efetivar a matrícula dos(as) adolescentes e legitimar o direito à educação.

Sob essa perspectiva, as articulações visam à aproximação entre escola e medida socioeducativa e, neste cenário, ganha destaque a figura do(a) pedagogo(a), que é o profissional que atua como referência institucional do Eixo Educação. Assim, além de acompanhar o(a) adolescente durante o cumprimento da medida, realizando atendimentos individuais, participando dos estudos de caso e da construção da rotina institucional, se apresentando nos espaços coletivos, como assembleias, grupos e demais ações pedagógicas que ocorrem na Unidade, o(a) pedagogo(a) permanece disponível para responder, quando solicitado, às demandas da instituição de ensino.

Anualmente, os(as) adolescentes em cumprimento de MSE de internação têm a oportunidade de realizar as provas do Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos para Pessoas Privadas de Liberdade (Encceja Nacional PPL) e do Exame Nacional do Ensino Médio Para Pessoas Privadas de Liberdade e Jovens Sob Medida Socioeducativa (ENEM-PPL).

O Encceja é uma oportunidade para que aqueles(as) que não tiveram oportunidade de concluir seus estudos na idade apropriada para cada nível de ensino (no mínimo, 15 anos completos para o Ensino Fundamental, e no mínimo, 18 anos completos para o Ensino Médio, na data de realização do Exame), possam obter a certificação para cada nível de ensino.

Já o ENEM PPL tem como principal finalidade a avaliação individual do desempenho do participante ao final do ensino médio, podendo os resultados individuais serem utilizados como mecanismo de acesso à educação superior ou em processos de seleção. Cumpre esclarecer que também há a possibilidade de participação de estudantes matriculados no 1º ou 2º ano do Ensino Médio, que comparecerão como treineiros, estando submetidos às mesmas regras que os demais participantes, exceto quanto à divulgação dos resultados e não poderão utilizá-los para ingresso ao ensino superior ou processos de seleção.

A participação em ambos os exames é voluntária e gratuita. A inscrição dos(as) adolescentes que desejarem participar deverá ser efetivada pelo responsável pedagógico, indicado por cada Unidade. As provas são realizadas dentro das Unidades Socioeducativas com cronograma definido em edital.

Visando qualificar os(as) adolescentes inscritos para participação nos referidos exames, as Unidades devem se organizar de forma a ofertar aulas preparatórias, apoio pedagógico qualificado e contínuo, podendo inclusive contar com o auxílio de parceiros externos.

As propostas construídas pela comunidade socioeducativa e os currículos trabalhados pelas instituições escolares devem ter papéis complementares para a garantia do direito à aprendizagem, assegurando, assim, que os(as) adolescentes e jovens desenvolvam competências, com conceitos e procedimentos que potencializam os conhecimentos, habilidades cognitivas e socioemocionais, atitudes e valores para enfrentarem os desafios da vida cotidiana, com vistas ao pleno exercício da cidadania edo mundo do trabalho. Espera-se, portanto, que a trajetória escolar das juventudes em cumprimento de medidas seja uma ferramenta de transformação social.

Para além de todas as ações fundamentais para promoção do eixo educação descritas

anteriormente, é imprescindível que as Unidades Socioeducativas estejam constantemente na busca de parceiros e em articulação com as redes de educação, a fim de estimular o debate, o protagonismo juvenil e o enriquecimento das ações pedagógicas ofertadas pela Unidade.

No eixo escolarização meu objetivo é estudar para mudar de vida e ter novas oportunidades na vida. Eu não gosto muito de estudar, mas gosto de Educação física, futebol e matemática, mas não gosto de inglês. A escola ajuda muito, pois aí eu não fico na rua. Lá eu tenho uma boa relação com todo mundo, os professores e os outros alunos, é bem tranquilo lá. Acho que o apoio da família também ajuda muito, porque aí nós não faltamos de aula e conseguimosoportunidades. Aqui na medida, acho que vai ser bom que eu vou conseguir concluir o ensino médio e eles podem me auxiliar a conseguir uma vaga de emprego. (relato de adolescente em cumprimento de MSE durante oficinas do GT Protagonismo Juvenil, 2022).

É premente ressaltar, também, a importância dos encaminhamentos/articulações realizados pela equipe socioeducativa visando o pós-medida, que poderão propiciar a continuidade de ações, favorecendo o acolhimento do(a) adolescente nas redes do território onde residirá após o desligamento. A seguir, iremos dialogar sobre o EixoProfissionalização que deve ser qualitativamente articulado com o desenvolvimento educacional dos(as) adolescentes, visando sanar as defasagens e ampliar as habilidades para acesso e permanência nas possibilidades que forem oportunizadas no cumprimento da medida. A educação e a profissionalização para os(as) adolescentes e jovens é uma necessidade essencial ao pleno exercício da cidadania.

7.2 PROFISSIONALIZAÇÃO

Meu objetivo é mudar de vida, por isso acho importante realizar algum curso profissionalizante enquanto estiver aqui na Casa [de Semiliberdade], cumprindo medida e também quando sair daqui né, continuar estudando, trabalhando e ser melhor. Acho que para entrar no mercado de trabalho eu tenho que estudar mais e fazer mais cursos. Sempre aprender mais. (relato de adolescente em cumprimento de MSE durante oficinas do GT Protagonismo Juvenil, 2022).

A garantia dos direitos à educação e à formação profissional aos(às) adolescentes e jovens é uma responsabilidade constitucional. Reconhece-se de antemão que refletir sobre a individualidade dos sujeitos é primordial para o seu desenvolvimento pleno, a partir de suas subjetividades.

Nesse viés, a profissionalização é um direito a ser assegurado aos(às) adolescentes e um eixo estratégico da socioeducação, devendo ser implementada mediante a execução dos seguintes parâmetros:

  • Desenvolvimento de competências e habilidades por meio de ações concretas, como, por exemplo, oficinas profissionalizantes que despertem o interesse do(a) adolescente para o mundo do trabalho;
  • Promoção de ações que propiciem conhecimento e conscientização sobre os direitos e deveres de adolescentes e jovens trabalhadores(as);
  • Educação profissional por meio de cursos de formação inicial e continuada, mediante parceria com órgãos do Sistema “S” (SENAI/SENAC), com instituições privadas, filantrópicas ou com programas governamentais;
  • Inserção e permanência dos(as) adolescentes no mercado de trabalho, especialmente no trabalho protegido ou em estágios remunerados, por intermédio de convênios ou de parcerias, como os programas de aprendizagem;
  • Desenvolvimento e incentivo à prática empreendedora e atividades de geração de renda, como possibilidade de ingresso no mundo do trabalho;
  • Oferta de oportunidades de profissionalização e de trabalho aos(às) adolescentes com deficiência, em observância ao Decreto nº 3.298 de 20/12/1999;
  • Consolidação de parcerias com as Secretarias do Trabalho com órgãos similares, com a finalidade de cumprimento do art. 69 do ECA.

A construção de parcerias é a base para a consolidação da rede necessária para a efetivação do eixo profissionalização, sobretudo para encaminhamentos externos. Para isso, é essencial que sejam apresentadas as especificidades do público e da Unidade Socioeducativa aos parceiros, traçando-se estratégias de acolhimento para tornar esses encaminhamentos efetivos e assertivos.

A atuação da equipe socioeducativa, independentemente de parcerias externas, deve estar em consonância com as diretrizes do trabalho - a Metodologia do Atendimento Socioeducativo da SUASE - exequíveis pela qualificação dos profissionais, por sua atuação em vários campos do saber, que se constituem numa diversidade de possibilidades, podendo ocorrer por meio dos atendimentos técnicos individuais, atendimentos em grupo, oficinas, cursos, palestras, visitas guiadas (exceto na internação provisória) entre outras.

A chegada do(a) adolescente à Unidade inaugura o processo de compreensão de sua trajetória de vida. Nessa perspectiva, o histórico ocupacional contribui como ponto de partida, qualificando a construção do PIA com informações sobre as áreas de interesse, habilidades e necessidades identificadas quanto à profissionalização.

O eixo promove o acesso à formação básica para o trabalho e a formação profissional e é executado observando-se disposições metodológicas que se ancoram no tripé: Orientação Profissional; Inserção em Cursos Profissionalizantes e Encaminhamento para o Mercado de Trabalho. Insta salientar que esse percurso formativo sustenta-se por meio do acompanhamento do(a) adolescente realizado pela equipe socioeducativa, em todas as suas etapas.

7.2.1 Orientação Profissional: despertar para o mundo do trabalho

A Orientação Profissional parte do pressuposto de que a maioria dos(as) adolescentes ainda não se decidiu quanto ao futuro profissional. Essa etapa se constitui no processo que impulsiona a busca de informações e de solução de dúvidas, desconstruindo (pré)conceitos sobre profissões e o mercado de trabalho, e possibilitando autoconhecimento e reflexão sobre a formação da identidade profissional. A equipe socioeducativa e os parceiros da rede são facilitadores, auxiliando o(a) adolescente a se perceber e a se reconhecer como sujeito capaz de fazer escolhas.

Na esteira da orientação profissional, os programas de pré-qualificação profissional, ofertados pela rede parceira, visam a formação e a integração social dos(as) adolescentes, preparando-os(as) para processos seletivos de ingresso no mercado de trabalho. As entidades profissionalizantes adotam metodologias próprias, que devem ser consideradas e analisadas quanto à sua pertinência para o público do Sistema Socioeducativo. Atualmente, a SEJUSP é uma das signatárias do Acordo de Cooperação Técnica nº. 089/2019, que institui o Programa de Incentivo à Aprendizagem de Minas Gerais - Descubra!.7Assim, é uma responsabilidade da SUASE realizar a inserção dos(as) adolescentes nos programas de pré-qualificação antes do encaminhamento para as vagas em cursos ou em programas de aprendizagem.

7Trata-se de uma aliança estratégica que congrega esforços de onze instituiçõese pretende promover o acesso de adolescentes e jovens em condição de vulnerabilidade social, especialmente em cumprimento ou egressos de medidas socioeducativas, em situação de acolhimento institucional ou resgatados de situação de trabalho infantil, a programas de aprendizagem e a cursos de qualificação profissional. (MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS. Acordo de Cooperação Técnica Nº 082/2019).

A pré-qualificação é voltada para o desenvolvimento de competências comportamentais em um processo crescente e continuado de reconhecimento e construção da identidade pessoal, social e profissional, integrando à vida e ao trabalho autoconhecimento, controle emocional, reconhecimento de valores, de talentos e de competências.

As Unidades Socioeducativas conseguem desenvolver esse processo formativo com enfoque na preparação de adolescentes e jovens para o mundo do trabalho. A SUASE conta, desde 2014, com alguns parceiros que ofertam capacitações aos servidores/colaboradores, as quais contemplam todas as Unidades do estado, no formato presencial ou à distância. A partir da capacitação recebida, profissionais das Unidades se tornam os aplicadores dos cursos, assinando termo de voluntariado.

Durante todo o ano ocorre a execução do(s) curso(s) dentro das Unidades e tanto os(as) trabalhadores(as) quanto os(as) adolescentes são certificados. A metodologia do programa adotado pode ser ampliada e adaptada às necessidades dos(as) adolescentes. Anualmente, ao final da execução, é realizado evento de avaliação e promoção dos trabalhos desenvolvidos nas Unidades Socioeducativas. A partir de 2022, com a chegada de auxiliares educacionais na composição da equipe socioeducativa, a formação foi direcionada, preferencialmente a estes, realizando ainda uma roda de conversa para partilha das experiências com adolescentes em cada Unidade.

7.2.2 Inserção em curso profissionalizante

O papel da equipe socioeducativa é primordial no processo de inserção do(a) adolescente nos cursos de formação básica ou profissional, pautando-se sempre pelas escolhas, áreas de interesse e projeto de vida do(a) adolescente em busca de uma inserção qualificada e sustentável.

A avaliação da equipe técnica e de segurança, para a inserção em cursos internos ou externos à Unidade, deve seguir alguns critérios básicos tais como idade e escolaridade exigidas; documentação para matrícula; carga horária; o momento em que o(a) adolescente se encontra dentro do processo socioeducativo; o conteúdo programático e a metodologia; o regimento de cada entidade profissionalizante; dentre outros.

O agendamento de visitas presenciais para apresentações prévias e familiarização do espaço onde o(a) adolescente realizará as atividades profissionalizantes também é de suma importância para a efetivação das articulações realizadas pela equipe socioeducativa. A equipe deverá acompanhar os encaminhamentos externos à Unidade, de acordo com o Regimento Interno e demais orientações metodológicas.

Concomitante às visitas, as equipes podem trabalhar questões relativas à autoestima, o respeito aos outros e a si mesmo, o reconhecimento das potencialidades e do bem-estar pessoal, bem como o sentimento de pertencimento concernente ao novo espaço que esse(a) adolescente passará a frequentar.

A intencionalidade do trabalho das equipes deve comprometer-se com aconstrução de um projeto de vida pelos(as) adolescentes que considere a profissionalização como um dos pilares fundamentais desse planejamento futuro, dissociado da ideia da inserção em ações profissionalizantes apenas como uma parte do processo de encerramento da medida socioeducativa. Tal entendimento pode impactar sobremaneira nesse sentimento de pertencimento, e consequentemente na criação de vínculos permanentes do(a) adolescente com o mundo do trabalho.

Outros aspectos importantes a serem observados pelas equipes, enquanto meios de promoção desse sentimento de pertencimento:

  • Acolhimento do local: a maneira como a instituição recebe e acolhe o público do socioeducativo, considerando todo o contexto implícito e suas especificidades (defasagem escolar, falta de contato com o mundo do trabalho, entre outros), dentro de uma perspectiva de inclusão e aproximação;
  • Linguagem e gradação de tarefas: considerar as habilidades e conhecimentos próprios de cada adolescente, com o intuito de permitir sua evolução e crescimento pessoal dentro de suas limitações;
  • Estabelecimento de regras e limitações: trabalhar o respeito às regras institucionais e limitações de circulação no espaço, compreendendo seu papel enquanto sujeito de direitos e deveres, utilizando uma linguagem clara e assertiva;
  • Compreensão de como o(a) adolescente se percebe em relação ao espaço, às pessoas e às relações que estabelece.

A SUASE agrega diversas parcerias com entidades públicas e privadas para a oferta de cursos profissionalizantes diversificados dentro ou fora das Unidades Socioeducativas. Os cursos são voltados para capacitações específicas e operacionais, formação inicial e continuada e, também, cursos técnicos de longa duração.

As modalidades de cursos profissionalizantes são:

  • Cursos livres: preparam para o exercício de uma função específica no mercado, têm menor carga horária, maior flexibilidade de idade e escolaridade;
  • Cursos de Formação Inicial e Continuada (FIC): objetivam iniciar, atualizar ou aprofundar habilidades técnicas em uma área específica do conhecimento;
  • Cursos técnicos: cursos de nível médio que têm o objetivo de capacitar com conhecimentos teóricos e práticos em diversas atividades do setor produtivo. Um de seus propósitos é o acesso imediato ao mercado de trabalho.
  • Cursos de graduação: o diploma de ensino superior é conferido ao estudante que completa a sua formação, que também recebe um título, a depender do curso escolhido, de Licenciatura, de Bacharelado ou de Tecnólogo.

7.2.3 Encaminhamento para o mercado de trabalho

O encaminhamento para o mercado de trabalho deve ser, prioritariamente, um desdobramento da orientação profissional.

O momento do encaminhamento do(a) adolescente às vagas no mercado formal de trabalho deve ser uma construção para o caso, sendo avaliada a pertinência e o interesse de cada sujeito. As equipes técnicas realizam os encaminhamentos considerando o desejo, o perfil do(a) adolescente e os critérios estabelecidos pelos parceiros, sendo certoque a inserção de adolescentes no mercado de trabalho pode ocorrer nas seguintes condições:

  • Aprendiz: compreende a contratação de jovens de 14 (quatorze) a 24 (vinte e quatro) anos para capacitação profissional (prática e teórica), em regime especial de trabalho, por tempo determinado, garantidos todos os direitos trabalhistas e previdenciários. Ocorre a contratação por meio de entidades de aprendizagem devidamente cadastradas nos órgãos competentes com regulamentação pela Lei da Aprendizagem (Lei nº 10.097/2000);
  • Adolescente Trabalhador: compreende a contratação do trabalhador jovem a partir dos 16 (dezesseis) anos com contrato individual de trabalho, regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas - CLT, garantidos todos os direitos trabalhistas e previdenciários sob o regime de contratação CLT, sendo vedados o trabalho em locais insalubres, penosos e perigosos; o trabalho realizado em locais prejudiciais à formação e ao desenvolvimento físico, psíquico, moral e social do(a) adolescente; o trabalho noturno (entre 22 horas e 5 horas do dia seguinte); bem como trabalhos realizados em horários e locais que não permitam frequência à escola.
  • Jovem Trabalhador: contratação de jovens a partir de 18 (dezoito) anos completos, regulamentada pela CLT.
  • Estágio: segundo a Lei do Estágio (Lei n° 11.788/2008).

Durante as atividades desenvolvidas pelo GT Protagonismo Juvenil, os(as) adolescentes demonstraram interesse nos cursos profissionalizantes, sinalizando acreditar que, ao possuírem um certificado de conclusão da formação profissional, diminuem as chances de sofrerem preconceito e aumentam as possibilidades de inserção no mercado formal de trabalho.

Relataram, ainda, que os cursos que mais lhes despertam interesse são aqueles que ensinam ofícios específicos, como as profissões relacionadas à construção civil, pintor de paredes, servente e eletricista. Além disso, foram citados os cursos de qualificação em padeiro, em cabeleireiro e em mecânico. Ademais, foi possível notar que as carreiras artísticas e ligadas aos esportes chamam a atenção dos jovens, que citaram as profissões de cantor, de jogador de futebol e de jogador de futsal.

Acho importante realizar cursos profissionalizantes, pois isso vai contribuir para a minha vida e para a minha medida. Acredito que sim, relacionadas à minha cor e minhas tatuagens. Quando eu sair da Unidade eu me vejo um cidadão de bem, com planos de trabalhar e ganhar bem. Acho que a equipe tem que continuar a fazer o que já fazem, que é correr atrás de profissionalização, de cursos pra mim etal. Já estou realizando cursos profissionalizantes aqui na Unidade que está me preparando para a entrada no mercado de trabalho. Acho muito importante receber informações acerca dos direitos e deveres dos trabalhos na adolescênciae também para quando eu ficar de maior. (relato de adolescente em cumprimento de MSE durante oficinas do GT Protagonismo Juvenil, 2022).

As ações do eixo profissionalização são mais efetivas quando a equipe socioeducativa, a instituição formadora, a escola e a família estão em sintonia, acompanhando objetiva e constantemente o desenvolvimento do(a) adolescente,apoiando- o(a) e incentivando-o(a) frente aos impasses e aos avanços do processo.

Cabe à Unidade Socioeducativa realizar o acompanhamento periódico de adolescentes inseridos em cursos ou que estejam trabalhando, incentivando a construção de conhecimento, auxiliando nos estudos, localizando dificuldades e sanando dúvidas. O acompanhamento da equipe socioeducativa envolve ações in loco e contatos remotos com as instituições formadoras para tratar de aspectos como: pontualidade, frequência, participação, interesse, acesso ao material de apoio pedagógico, as habilidades e dificuldades identificadas.

Toda a equipe de atendimento deve se envolver no acompanhamento, e não apenas o(a) pedagogo(a) ou terapeuta ocupacional. A Direção de Atendimento (na MSE de internação) e a Direção Geral (na MSE de semiliberdade) são responsáveis porconduzir o acompanhamento e por definir parâmetros para a participação da equipe no processo. A equipe de segurança socioeducativa também participa dos momentos de avaliação e no desenvolvimento das ações de garantia da segurança e no acompanhamento diário, atuando como incentivadora a partir do potencial educativo que possui.

O acompanhamento presencial do(a) adolescente durante as atividades deve ser realizado, primordialmente, pelo Auxiliar Educacional. Caso seja realizado pela equipe de segurança, é desejável que os Agentes de Segurança Socioeducativa que acompanharão as atividades sejam aqueles que já se envolvam nas ações do eixo profissionalização. Ressalta-se, assim, a importância de que o corpo diretivo da Unidade esteja alinhado na construção dos encaminhamentos de profissionalização.

As instituições formadoras devem propiciar ao(à) adolescente ambiente acolhedor e que oferte condições para desenvolver potencialidades, discutir e esclarecer dúvidas, com espaço para o diálogo e a consolidação de saberes. O alinhamento entre a equipe socioeducativa e a instituição formadora é essencial, sendo desejável a construção de espaços permanentes de diálogo interinstitucional.

Compete à escola subsidiar os(as) adolescentes na aquisição de habilidades que os(as) façam aptos ao pensamento crítico e capazes de resolver problemas de forma inteligente e proativa. Reitera-se, pois, a importância do alinhamento entre a Unidade Socioeducativa e a escola no processo de profissionalização, pois a instituição escolar contribui para a superação de dificuldades acadêmicas vivenciadas durante os cursos.

As referências familiares também devem participar das ações do eixo profissionalização. A visita domiciliar se constitui como importante ferramenta para a mobilização da família, pois possibilita o entendimento sobre o contexto sociofamiliar do(a) adolescente e sobre quais articulações serão assertivas na condução do caso. A partir do vínculo com a referência familiar, a equipe deve envolvê-la nas etapas doprocesso de inserção profissional.

A continuidade das ações profissionalizantes no território de origem dos(as) adolescentes deve ser construída antes do encerramento da medida. Assim, discussões e encaminhamentos da equipe socioeducativa em conjunto com o Poder Judiciário, com atores da rede do município, com famílias e com o Programa de acompanhamentoaos(às) adolescentes desligados (Se Liga) são ações necessárias, com vistas a garantir o acesso a programas de emprego e de renda em seu território e a continuidade de ações já iniciadas ao longo do cumprimento da medida socioeducativa.

7.3 ESPORTE, CULTURA E LAZER

Já fomos em vários lugares legais aqui na Casa [de Semiliberdade]. Gosto muito de futebol e acho que posso exercer esse direito em toda a comunidade. Gosto muito de música (funk e pagode) e de cinema. Gosto de esportes também, todos. Acho que a equipe pode nos levar para participar de mais atividades esportivas, de cultura e lazer. (relato de adolescente em cumprimento de MSE durante oficinas do GT Protagonismo Juvenil, 2022).

O esporte, a cultura e o lazer constituem-se direitos fundamentais previstos expressamente no ECA e que devem ser garantidos às crianças e aos(às) adolescentes pela família, pelo Poder Público e pela sociedade, bem como ser assegurados àqueles(as) que se encontram em cumprimento de medidas socioeducativas, conforme art. 124, inciso XII, do Estatuto (BRASIL, 1990).

7.3.1 Esporte

A medida socioeducativa é um momento propício ao desenvolvimento das vivências esportivas, não somente por garantir a prática, mas também por se constituir enquanto espaço de implicação e de intervenção no processo de responsabilização do(a) adolescente.

O público das medidas socioeducativas, em geral, é marcado pela precariedade de acesso às práticas esportivas e pela escassez de locais apropriados a tais atividades. Além disso, não raro sua trajetória de vida é atravessada por vulnerabilidades e limitações, o que implica, no campo do esporte, em desconhecimento acerca das modalidades existentes e dos benefícios para a saúde física e mental. Observa-se, ainda, adolescentes sem qualquer tipo de experiência em práticas esportivas, sobretudo com limitações cognitivas, emocionais e motoras.

É importante conceber o esporte para além da promoção da saúde e do uso de técnicas, localizando-o na perspectiva de formação humana. Nesse sentido, o esporte propicia a incorporação de múltiplas atitudes como o trabalho em equipe, a cooperação, a disciplina para alcançar objetivos, a compreensão e a incorporação de regras e de (auto)superação de dificuldades.

A prática esportiva, além de favorecer as potencialidades humanas, permite a construção de intervenções no processo de responsabilização, oportunidade em queVOLPI (2011) ressalta tanto no que diz respeito à superação da condição de exclusão, quanto ao “[...] acesso à formação de valores positivos de participação na vida social.” (VOLPI, 2011, p.21)

O esporte é, portanto, indispensável ao processo de socioeducação e exige uma construção com o(a) adolescente no PIA. A inclusão e a manutenção do(a) adolescente em práticas esportivas devem ser fruto da construção e do estudo de cada caso, assim como objeto das avaliações periódicas ao longo do cumprimento da medida socioeducativa. Isso possibilita ao(à) adolescente ressignificar sua forma de apresentar-se nos espaços da prática esportiva, de modo que reflita sobre sua trajetória e possa se responsabilizar pelos atos infracionais cometidos, construindo assim, novos projetos de vida (VOLPI, 2011).

Caso o(a) adolescente incida em transgressão disciplinar (leve e média) no transcurso da MSE, o acesso às atividades do eixo Esporte deverá ser mantido, sendo vedada a aplicação de ato sancionatório que o interrompa por completo e devendo a construção de como se dará a participação do(a) adolescente ser realizada mediante a avaliação da comissão disciplinar.

Nas Unidades de gestão direta as atividades esportivas são executadas por meio de parceria com Organização da Sociedade Civil (OSC) e nas Unidades de gestão híbridae cogestão são executadas por profissionais contratados de acordo com previsão no instrumento jurídico que estabelece a parceria com a SUASE.

Neste sentido, cumpre salientar que, ao longo dos últimos meses os auxiliares educacionais tem se destacado na execução dos eixos das medidas. São os profissionais que, através de suas expertises e/ou experiência de vida, assim como, norteados pelo Manual de Oficinas e das oficinas validadas pela DFP, qualificam o planejamento, execução e avaliação dos resultados das oficinas e atividades relacionadas ao eixo. Sendo imprescindível realizar articulações necessárias, acionandoas ferramentas municipais, estaduais e privadas ligados ao esporte para a inserção dos(as) adolescentes nos espaços de pertencimento em seus territórios.

O Eixo Esporte contempla a prática de diversas modalidades esportivas, a avaliação física, as oficinas transversais, as palestras temáticas, os torneios internos, as atividades externas, os exercícios individuais e coletivos que devem ser desenvolvidos, observando- se os seguintes critérios:

  • Frequência mínima recomendada de 2 (duas) a 3 (três) vezes por semana;
  • Tempo mínimo de prática esportiva orientada: 50 (cinquenta) minutos/aula por turma;
  • Execução por profissional com formação em Educação Física, dada a sua relevância nos estudos de casos, na elaboração do PIA e nos relatórios de reavaliação da medida;
  • O planejamento das oficinas esportivas deve aplicar as práticas esportivas conforme a faixa etária do(a) adolescente/jovem, visando, sobretudo, o desenvolvimento das aprendizagens motoras, táticas e socioemocionais por meio de diferentes modalidades esportivas, colaborando, desse modo, na sua formação integral;
  • Aplicação de ações complementares que visam ao engajamento dos(as) adolescentes na prática esportiva e não esportivizada (esta última destituída de regras, prática simplesmente pela prática), acessibilidade aos locais e aos eventos esportivos, relação com o corpo e desenvolvimento dos temas transversais.

O acesso ao esporte no Sistema Socioeducativo possui, pois, caráter altamente educativo, promovendo o desenvolvimento das potencialidades humanas, a melhoria da condição física e da qualidade de vida. As atividades ocorrem, também, no período escolar, enquanto componente curricular obrigatório da educação básica nas aulas de Educação Física.

7.3.2 Cultura

A Constituição de 1988, em seu artigo 215, estabelece que é dever do Estado garantir a todos os cidadãos o pleno exercício dos direitos culturais e o acesso às fontes da cultura nacional. Preconiza, ainda, que o Poder Público deve apoiar e incentivar a valorização e a difusão das manifestações culturais, bem como proteger as manifestações das culturas populares, indígenas, afro-brasileiras e de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional (BRASIL, 1988).

A cultura é, assim, parte indissociável da medida socioeducativa e se trata de uma dimensão ampla e complexa do ser humano, que perpassa desde o entendimento como transformação do mundo natural até a compreensão como arte e expressão das subjetividades, dos sentimentos e das sensações humanas.

Partindo da compreensão de que “por natureza o homem é um ser cultural” (RABUSKE, 1999, p. 56), as equipes socioeducativas devem acolher as manifestações culturais das adolescências, buscando compreender os contextos culturais e coletivos que marcam a história que precede a medida, possibilitando formas de discussão de problemas sociais, de aspectos das juventudes e de reflexões acerca de desigualdades.

Ao mesmo tempo, a Unidade Socioeducativa precisa promover atividades culturais como fomento e fortalecimento da cultura brasileira em suas mais diversas matrizes, bem como possibilidade de inclusão e de desenvolvimentos cognitivo e intelectual.

Na promoção das diversas modalidades culturais as equipes devem organizar maneiras de ampliar a conexão do(a) adolescente com a arte, promovendo possibilidades de interatividade com os(as) artistas e obras. Com este propósito, a realização de roda de conversa ou de ações em formato de oficina ou de workshop sobre o fazer cultural ou as formas de expressão artística possibilitam ao(à) adolescente novos olhares para além daquele de espectador/consumidor.

As ações culturais também podem ser realizadas em parceria com a escola, reconhecendo a importância desta aliança. Ao desempenhar o papel de ensinar e de socializar e ao buscar ampliar o processo ensino/aprendizagem tendo como ferramentas as manifestações culturais, a escola contribui ativamente no processo socioeducativo. CANDAU e ANHORN (2000) afirmam que "[...] hoje se faz cada vez mais urgente a incorporação da dimensão cultural na prática pedagógica". Assim como a escola, aUnidade Socioeducativa tem em seu fazer uma prática pedagógica pautada em uma perspectiva multicultural, inclusiva, plural e democrática (CANDAU e ANHORN, 200, p;2)

Cabe ressaltar a função da arte e das expressões culturais como facilitadoras para discussão de estigmas, de estereótipos e de preconceitos nas mais diversas áreas, contribuindo para a compreensão das diversidades de opiniões e favorecendo a tolerância e o respeito, que são grandes desafios da humanidade.

Por ser eixo norteador da medida, a realização de atividades culturais deve estar prevista no PIA, considerando sua singularidade: as vivências anteriores, habilidades, os interesses e os desejos e as possíveis descobertas durante a medida. A definição de atividade cultural externa leva em consideração esses mesmos aspectos já citados e exigem discussão e construção prévia entre a equipe socioeducativa e o(a) adolescente.

A cultura e a arte têm grande influência na formação do ser humano e pode potencializar o trabalho socioeducativo, na medida em que, mais do que uma reprodução de valores morais e estéticos, viabiliza inclinações individuais anteriormente pouco exploradas, suscita novas percepções do mundo e das relações e aprimora a busca pelo conhecimento de si.

Uma prática socioeducativa que torna possível o rompimento com a prática infracional passa pela garantia de direitos e pela realização de ações que ensejam novas possibilidades de ser e estar no mundo. A cultura e a arte são ferramentas que podem incentivar, de forma singular, cada adolescente na construção de novos percursos.

7.3.3 Lazer

O lazer é um elemento cultural presente nas relações humanas e um espaço privilegiado para a manifestação do lúdico na sociedade, ou seja, uma possibilidade de expressão da vida na cultura. É a apropriação de um tempo e de um espaço dirigidos para a prática da liberdade de escolha, um desfrutar gratuito de algo que traz alegria conectada ao desejo de viver intensamente o momento que propicia melhor qualidade de vida (MARCELLINO, 2001; SAMPAIO; SAMPAIO, 2018; OLIVEIRA et al, 2020)

Segundo Arraz (2019), o acesso ao lazer é assegurado a todo cidadão brasileiro com propósito de garantir condições materiais entendidas como fundamentais ao pleno gozo dos seus direitos, denominados direitos sociais. E isso independentemente da sua condição como indivíduo.

O lazer consiste em uma ocupação significativa do tempo com atividades prazerosas, às quais o sujeito pode entregar-se de livre vontade para repousar, para divertir-se, para recrear-se e para entreter-se ou, ainda, para ampliar sua informação ou formação desinteressada, sua participação social voluntária ou sua criatividade, após livrar- se ou desembaraçar-se das obrigações profissionais, familiares e sociais.

Diante da amplitude da definição de lazer, pensa-se a sua prática na medida socioeducativa como um momento de livre escolha frente às possibilidades de atividades oferecidas aos(as) adolescentes para que eles(as) possam praticar atividade física, leitura, jogos, brincadeiras, atividades recreativas, entretenimento, práticas artísticas, culturais e ócio criativo.

O objetivo desse eixo [Esporte, Cultura e Lazer] é trazer novos conhecimentos, para que eu possa usar meu direito na comunidade. Aqui na Semi, a equipe me auxilia fornecendo materiais e informando quando e onde ocorrerão as atividades.(relato de adolescente em cumprimento de MSE durante oficinas do GT Protagonismo Juvenil, 2022).

7.4 SAÚDE

O acesso à saúde é importante, é fácil e satisfatório. O psicólogo atende minhas demandas de saúde, ele me escuta e procura atendimento no Centro de Saúde. Eu faço uso de medicação (...), sou atendida no CEPAI (Cersami) Centro Sul. (Adolescente em cumprimento de MSE na CSL Santa Amélia, 2022)

A atenção integral à saúde do(a) adolescente que se encontra em cumprimento de medidas socioeducativas é fundamentada na CRFB/88 e no ECA que, em seu art. 7º, estabelece: “a criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência” (BRASIL, 1990).

A Lei nº 12.594/2012 (SINASE) também trata, em seu capítulo V, da atenção integral à saúde de adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa. Já no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) destaca-se a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes em Conflito com a Lei, em Regime de Internação e Internação Provisória (PNAISARI). A PNAISARI apresenta as diretrizes para o cuidado integral à saúde dos(as) adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa no âmbito do SUS, tendo como objetivo principal garantir e ampliar o acesso aos cuidadosem saúde deste público.

Ademais, a PNAISARI orienta que a atenção integral à saúde dos(as) adolescentes seja realizada, prioritariamente, na rede de saúde do município em que os Centros Socioeducativos ou as Casas de Semiliberdade se localizam. Dessa forma, é preconizado que todas as Unidades contêm com uma equipe de Atenção Primária à Saúde de referência para garantir a inserção dos(as) adolescentes na rede de saúde e o acesso ao cuidado integral, que deve ser ofertado, prioritariamente, extramuros.

De acordo com a PNAISARI e os princípios do SUS,todo município onde há uma Unidade Socioeducativa tem responsabilidade sanitária pelos(as) adolescentesque ali se encontram em cumprimento de semiliberdade e internação, devendo garantir-lhes o acesso à saúde. Desta feita, para auxiliar no direcionamento das ações, o município pode optar pela habilitação à PNAISARI que acarretará em um incentivo financeiro, por meio de repasse fundo a fundo,do Ministério da Saúde ao município. Para habilitação e implementação é necessário fazer um diagnóstico de saúde e instituir o Plano Operativo Municipal, que deve ser revisado a cada quatro anos, e o Plano Anualde Ação, que contém metas e pactuações entre a Atenção Primária à Saúde e as Unidades Socioeducativas do município.

7.4.1 Ações para garantia da saúde integral dos(as) adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa

a) Atendimento inicial e acolhimento

O acompanhamento dos(as) adolescentes inicia-se com o acolhimento pelas equipes de enfermagem, no caso dos Centros Socioeducativos, e pelas equipes técnicas, no caso das Casas de Semiliberdade, e tem prosseguimento nos Centros de Saúde ou nas Unidades de Atenção Primária à Saúde de referência no território.

A cada adolescente deve ser garantida, ao menos, uma consulta integral de saúde na Atenção Primária, viabilizando o seu cadastro na Unidade de Saúde e a confecção do Cartão Nacional SUS para garantir o acesso a todos os serviços e às ações de saúde, de acordo com suas necessidades.

Cabe ressaltar que é de responsabilidade da Unidade Socioeducativa garantir o acesso dos(as) adolescentes às ações de assistência, de prevenção e de promoção de saúde na rede.

b)Saúde bucal

A assistência em saúde bucal deve ser garantida a partir do acesso às ações e aos serviços de saúde do SUS. Dentre as ações de saúde bucal a serem garantidas aos(às) adolescentes estão as ações de prevenção, de diagnóstico e de tratamento de doenças orais.

A fim de qualificar as ações de promoção da saúde bucal no âmbito das Unidades Socioeducativas de Minas Gerais, foi elaborado o Protocolo de Assistência à Saúde Bucal no Sistema Socioeducativo do Estado de Minas Gerais (2018).

Alguns Centros Socioeducativos possuem consultórios odontológicos, com equipe de odontologia formada por dentistas e por auxiliares de saúde bucal. Nesses casos, os profissionais de odontologia compõem a equipe técnica da Unidade, adequando seus atendimentos de acordo com a lógica da Atenção Primária à Saúde e articulam as ações mais complexas de saúde bucal com a rede de saúde pública de cada município.

c)Saúde mental

No que tange à assistência em saúde mental, a PNAISARI direciona o desenvolvimento de ações de promoção de saúde mental, prevenção e cuidado dos transtornos mentais, ações de redução de danos e cuidado para pessoas com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas para a Rede de Atenção Psicossocial - RAPS.

O cuidado em saúde mental dos(as) adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa deve ser ofertado nos equipamentos da RAPS e ser orientado pelos princípios e pelas diretrizes colocados nos artigos 60 e 64 do SINASE (BRASIL, 2012), na Política Estadual de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas de Minas Gerais (MINAS GERAIS, 2016) e nas demais diretrizes federais, estaduais e municipais vigentes.

A garantia desse acompanhamento é regida pela lógica do SUS e, para isto, é necessário que as equipes socioeducativas acolham as demandas dos(das) adolescentes por meio de escuta qualificada, a fim de que sejam efetuados os encaminhamentos para a rede de saúde de acordo com a complexidade de cada caso.

É necessária, ainda, a articulação intersetorial para a discussão e a construção do Projeto Terapêutico Singular (PTS) dos(as) adolescentes. Além disso, as demandas podem ser trabalhadas em parceria com os profissionais de referência em saúde mental previstos na PNAISARI, no caso dos municípios habilitados.

Ressalta-se que, conforme o artigo 7º, inciso III da PNAISARI, o objetivo específico dessa Política é incentivar a articulação dos Projetos Terapêuticos Singulares, que são elaborados pelas equipes de saúde, aos Planos Individuais de Atendimento (PIAs) dos(as) adolescentes em cumprimento de medida, de modo a atender as complexas necessidades deste público (BRASIL, 2017).

Nessa perspectiva incentiva-se alinhamento e diálogo constante entre as equipes técnicas das Unidades Socioeducativas e a participação em discussões de caso com a rede de saúde mental e matriciamentos, quando houver.

d)Plano de Prevenção ao Suicídio nas Unidades Socioeducativas de Minas Gerais

Ainda considerando os aspectos referentes à saúde mental, é imprescindível discutir sobre a prevenção ao suicídio e a valorização da vida daqueles(as) que vivenciam a privação de liberdade. Nesse sentido, foi elaborado o Plano de Prevenção ao Suicídio nas Unidades Socioeducativas de Minas Gerais (2020), que se propõe a contribuir com asações cotidianas do atendimento socioeducativo.

Trata-se de um instrumento de trabalho para as equipes que atuam nas Unidades Socioeducativas, auxiliando e contribuindo com o fazer profissional daqueles que lidam com os(as) adolescentes que vivenciam situações de violências autoprovocadas (ideação suicida, autoagressão/automutilação, ato preparatório,tentativa de suicídio e o suicídio consumado) no contexto do acautelamento.

O Plano tem como objetivo efetivar a prevenção e o fortalecimento de fatores de proteção, bem como orientar todos(as) os(as) profissionais atuantes nas Unidades Socioeducativas do Estado de Minas Gerais sobre os conceitos, fluxos e orientações metodológicas em relação aos casos de violências autoprovocadas, especialmente, a ideação suicida e as tentativas de autoextermínio no âmbito do atendimento aos(às) adolescentes.

e)Saúde sexual e saúde reprodutiva

As ações em Saúde Sexual e Saúde Reprodutiva são pautadas no âmbito do SUS e devem considerar a diversidade de orientações sexuais e de identidade de gênero, visando a garantia do cuidado em saúde, livre de toda forma de preconceito e discriminação. As equipes técnicas e de saúde devem ofertaraos(às) adolescentes em atendimento socioeducativo o acesso à promoção e ao cuidado integral à sexualidade e ao planejamento familiar por meio de orientação individual e/ou em grupo sobre osmétodos contraceptivos, a gestão de risco, a oferta e dispensa de insumos de prevençãoe testes rápidos de Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs).O teste rápido de HIV e outras ISTs são disponibilizados nas Unidades Básicas de Saúde, nos serviços ambulatoriais conveniados ao SUS e também nos Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA), que estão distribuídos em alguns municípios. O CTA, para além da testagem de ISTs, promove a garantia de diagnósticos precoces, atividades educativase intervenções individuais ou com grupos vulneráveis, a fim de realizar uma reflexão sobre os riscos, práticas seguras e mudança de comportamento.

Também é importante garantir às adolescentes gestantes, puérperas e mães em cumprimento de medida socioeducativa o acompanhamento do pré-natal, a vinculação aos serviços de parto e de puerpério, e o aleitamento materno seguindo as diretrizes vigentes no SUS — além da garantia da convivência entre mãe e filho nos primeiros meses de vida da criança. No caso de adolescentes parturientes e lactantes que permanecem na medida socioeducativa de internação,deve-se adotar a Metodologia de Atendimento para Adolescente Mãe com Criança até os Seis Meses de Idade (2016) e a utilização do Espaço Mamãe-Bebê que existe no Centro Socioeducativo São Jerônimo.Já na medida socioeducativa de semiliberdade, as adolescentes grávidas, puérperas, lactantes e com filho com menos de seis meses, segundo Regimento Único da Semiliberdade (2018),poderão sair da unidade, até mesmo nos sete primeiros dias de cumprimento de medida de semiliberdade, para as seguintes atividades, mediante avaliação da equipe e ciência do corpo diretivo:I - encaminhamentos referentes a pré-natal ou pós-parto;II - cuidados médicos voltados a filhos recém-nascidos de até 6 (seis) meses de idade;III - aleitamento materno e coleta de leite.

f)A prevenção e controle de agravos de saúde

A prevenção e o controle de agravos é um dos eixos prioritários abordados pela PNAISARI. Neste aspecto, é importante que as Unidades Socioeducativas realizem monitoramento das principais questões de saúde dos(as) adolescentes atendidos(as) visando embasar ações de prevenção e cuidado.

As ações desenvolvidas também devem considerar o controle de agravos previstos pela Portaria do Ministério da Saúde nº 2.472, de 31 de Agosto de 2010 (ou outra que a substitua), que versa sobre a relação de doenças, de agravos e de eventos em saúde pública de notificação compulsória em todo o território nacional e estabelece fluxo, critérios, responsabilidades e atribuições aos profissionais e serviços de saúde. Assim, caso sejam identificados algum desses agravos nas Unidades Socioeducativas, é necessário realizar o oportuno encaminhamento dos(as) adolescentes aos serviços de saúde da Atenção Primária, a fim de garantir tanto a assistência quanto a notificação no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN).

No âmbito da SUASE, qualquer agravo em saúde que acometa os(as) adolescentes, bem como os casos de violências autoprovocadas devem ser comunicados imediatamente (ou no prazo máximo de 24 horas) à Diretoria de Atenção à Saúde, através do formulário padronizado de Informe de Agravos de Saúde. Posteriormente, o fato e seus encaminhamentos devem ser registrados por meio de Relatório Circunstanciado, remetido à SUASE e, quando necessário, ao Poder Judiciário e Promotoria da Infância e Juventude.

g)Oficinas e educação em saúde: ações coletivas

As oficinas de saúde compõem a Metodologia de Atendimento Socioeducativo e têm como objetivo a promoção de saúde e a orientação aos(às) adolescentes sobre as questões relacionadas aos cuidados com a própria saúde.

É preconizado como indicador que todos(as) os(as) adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa participem ao menos de uma oficina de saúde no mês. Para a elaboração do Cronograma Anual de Oficinas Temáticas de Saúde é importante que as Unidades Socioeducativas promovam a participação dos profissionais da rede municipal de saúde, profissionais da escola, bem como outros parceiros (Instituições de Ensino Superior, por exemplo).

A aproximação com a rede local de saúde no momento de construir e de executar as oficinas fortalece a relação das Unidades e dos(as) adolescentes com a rede de saúde. Para estimular e reforçar o vínculo dos(as) adolescentes com os serviços de saúde é possível, na semiliberdade e na internação, que os(as) adolescentes sejam inseridos(as) em atividades promovidas pela Atenção Primária na própria Unidade Básica de Saúde ou em outros espaços externos aos de cumprimento da medida socioeducativa.

Outro eixo da PNAISARI que pode ser abordado de forma coletiva, por meio de ações de educação em saúde, são os direitos humanos, a promoção da cultura de paz, a prevenção de violências e a assistência às vítimas.

Com relação ao(à) adolescente vítima de violência, a PNAISARI prevê a Notificação de Violência Interpessoal e Autoprovocada, com base nas normativas do Ministério da Saúde que versam sobre o tema, além do encaminhamento para atendimento na rede de saúde.A fim de orientar os profissionais atuantes nas Unidades Socioeducativas do Estado de Minas Gerais sobre a temática foi elaborado o documento instrutivo: Notificação de Violência Interpessoal/autoprovocada no Sistema Socioeducativo: Orientações Gerais (2019).

A notificação compulsória das violências constitui-se como instrumento epidemiológico, feito em uma ficha específica disponibilizada pelo Ministério da Saúde, que visa coletar dados e gerar informações sobre as diferentes formas de violências que atingem a população. Portanto, a notificação compulsória não tem caráter de denúncia, mas possibilita a vigilância das situações de violências enquanto agravos à saúde, promovendo atenção integral às pessoas em situação de violência, protegendo e garantindo direitos por meio da articulação das redes de atenção e de proteção.

Ressalta-se que todos os profissionais da equipe técnica das Unidades Socioeducativas devem notificar casos suspeitos ou confirmados de violências interpessoais e autoprovocadas. As notificações devem ser realizadas sempre que os profissionais tiverem conhecimento dos casos, ainda que já tenham ocorrido posteriormente ao acautelamento. Nesse sentido, os casos de violências envolvendoadolescentes deverão ser notificados também ao Conselho Tutelar e/ou às autoridades competentes, em formulário próprio, conforme exigência do artigo 13 do ECA.

h)Atenção às urgências e emergências em saúde

A PNAISARI prevê o acesso dos(as) adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa à assistência de média e de alta complexidade na rede de atenção do SUS, incluindo o acesso aos cuidados em saúde nos pontos de atenção da Rede de Urgência e Emergência.

A fim de orientar os profissionais atuantes nas Unidades Socioeducativas do Estado de Minas Gerais sobre as condutas e os encaminhamentos a serem adotados nas eventuais situações consideradas como urgência e/ou emergência em saúde que possam se apresentar na rotina das Unidades Socioeducativas, foi elaborado o documento Protocolo para Primeiros Socorros nas Unidades Socioeducativas (2019).

A partir de todo o exposto, buscou-se salientar que a saúde integral é um direito fundamental a ser garantido aos(às) adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas. É de extrema importância que as equipes responsáveis pela socioeducação tenham conhecimento das legislações mencionadas nesse tópico, dos fluxos de saúde pertinentes à organização de cada município e dos princípios do SUS, para que, em um ambiente tão complexo, seja possível desenvolver ações de promoção e prevenção em saúde.

7.5 FAMÍLIA E RELAÇÕES SOCIAIS E COMUNITÁRIAS

Quando eu cheguei aqui no CSE, pelo fato, pelo crime que eu cometi na rua, eu cheguei aqui rebelde, não respeitava normas, nem regras, nem mesmo nemminha família, né? Até minha mãe e minha família já tinham perdido as esperanças pelo fato de eu estar quase na maior idade, né? [...] Passaram os dias,recebi a visita da minha mãe, até minha mãe comentou com ela (técnica), né, que já não tinha mais esperança, achava que já tinha acabado, que eu só ia ficar nisso. [...] Mas hoje, eu vejo o efeito que a medida vem fazendo na minha vida, hoje eu já consigo comunicar, olhando nos olhos da pessoa... (Adolescente em cumprimento de MSE no CSE Pirapora, 2022)

A convivência familiar e comunitária é um direito que deve ser garantido às crianças e aos(às) adolescentes, conforme preconizado na legislação brasileira. O ECA estabelece, em seu art. 19, o direito de crianças e de adolescentes serem criados e educados prioritariamente no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, devendo ser assegurada a convivência familiar e comunitária em ambiente quepossa garantir seu desenvolvimento integral.

Quanto aos(às) adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa, o Estatuto é expresso ao garantir que devem permanecer em Unidades na mesma localidade ou naquela mais próxima ao domicílio de sua família ou responsáveis. Além disso, o art. 124 do ECA determina que ao(à) adolescente em privação de liberdade deve ser garantido o direito de receber visitas, ao menos semanais, e de corresponder-se com seus familiares e amigos.

Na mesma perspectiva, a Lei do SINASE destaca, em seu art. 35, os princípios que regem a execução das medidas socioeducativas e dentro os quais está o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários no processo socioeducativo (BRASIL,2012).

O conceito de família adotado pela SUASE e reafirmado neste Programa de Atendimento corrobora com o acolhido pelas demais políticas públicas que reconhecem a diversidade de arranjos familiares e os aspectos relacionais e afetivos, extrapolando o conceito de família pautado unicamente na consanguinidade. Compreende-se, pois,“a família como núcleo social básico de acolhida, convívio, autonomia, sustentabilidade e protagonismo social.” (BRASIL, 2005).Por conseguinte, o trabalho com as famílias precisa agregar o conceito de vínculo na construção das propostas socioeducativas.

Vínculo é entendido como o estabelecimento de uma ligação e precisa ser compreendido não pela via biológica, mas pela via da subjetividade das relações, de forma que proporcione a identificação das conexões construídas pelos(as) adolescentes pelo afeto, pela dependência, pelo diálogo, pela troca de saberes, pelo processo de construção identitária ou pelas mais diversas formas de interações entre os sujeitos. O vínculo é, pois, um dos pilares das relações familiares e sociais e do trabalho com famílias e referências socioafetivas no socioeducativo, haja vista que sua manutenção, fragilização ou rompimento influenciam, diretamente, na capacidade protetiva das famílias e na forma como o(a) adolescente responde à medida socioeducativa.

Dessa compreensão constrói-se o conceito de referência familiar, que se define como a pessoa que possui vínculos constituídos com o(a) adolescente e que se apresenta disponível ao acompanhamento do processo socioeducativo, se comprometendo como corresponsável pela medida e como referência de apoio, afeto e responsabilidade para o(a) adolescente durante e após o cumprimento da medida socioeducativa.

O SINASE incorpora a perspectiva da matricialidade sociofamiliar ao incluir, no atendimento socioeducativo, o Eixo Convivência Familiar e Comunitária, de modo que essa dimensão é um componente que deve permear todo o atendimento socioeducativo.

Durante a execução das medidas socioeducativas é necessária a realização de ações que promovam vínculos entre adolescentes e suas referências familiares, visando a garantia de suporte a este(a) em seu processo de responsabilização, bem como a devida proteção e reinserção qualificada na comunidade de origem a partir da extinção damedida. É um desafio cotidiano garantir a participação das famílias na medida e na consecução dos objetivos do PIA, por isso, construir estratégias em que as famílias se sintam apoiadas, incluídas e acolhidas, pode incrementar o vínculo dessas com o(a) adolescente e com a própria medida socioeducativa.

Nessa perspectiva, a Metodologia de Atendimento às Famílias do Sistema Socioeducativo de Minas Gerais (2017) apresenta o rol exemplificativo de ações a serem desenvolvidas com as referências familiares e socioafetivas dos(as) adolescentes, relacionando os dispositivos e os espaços institucionais de acompanhamento aos quais as equipes devem recorrer para desenvolver as ações do Eixo Convivência Familiar e Comunitária.

As ações para a família objetivam, portanto, a manutenção e o fortalecimento dos vínculos por meio de espaços de convivência entre adolescente e referências familiares, além do diálogo com a equipe socioeducativa, buscando tratar demandas individuais e coletivas e, assim, construir estratégias alinhadas ao PIA. Tais ações consistem em:

  • Atendimento Técnico;
  • Grupos e Eventos;
  • Visita do adolescente à família;
  • Visita domiciliar e comunitária;
  • Visitas da família ao adolescente; e
  • Articulação de Rede.

A privação e a restrição da liberdade limitam o direito do(a) adolescente à convivência familiar. Por isso, é essencial que, além das ações supra, as Unidades cristalizem na rotina institucional outras atividades que favoreçam a manutenção e o fortalecimento dos vínculos familiares e socioafetivos, minimizando os efeitos danosos do distanciamento durante a medida. Nessa perspectiva, torna-se essencial a garantia de:

  • Contato telefônico com a família, no mínimo, semanal;
  • Corresponder-se com familiares e amigos, resguardada a avaliação prévia do conteúdo das correspondências; e
  • Contato por videochamadas8 para a família, independentemente do recebimento de visita presencial na Unidade e da ligação telefônica semanal.

8Videochamadas:ação iniciada durante a pandemia de Covid-19, como alternativa às restrições de contato impostas no período de intensa disseminação da doença. Mostrou-se notadamente potente na promoção

Essas ações são extremamente importantes, especialmente para adolescentes que cumprem medida socioeducativa em Unidades distantes de sua comarca de origem. Ressalta-se que o planejamento e as definições objetivas acerca da oferta das videochamadas são atividades autônomas das Unidades Socioeducativas, que devem considerar os recursos materiais, tecnológicos e humanos dos quais dispõem, assim como as particularidades dos casos, de maneira que a oferta seja condizente com a realidade da Unidade e responda às peculiaridades de cada adolescente, conforme demandas identificadas no PIA.

Importante destacar, ainda, que a família e as referências socioafetivas dos(as) adolescentes devem participar da construção do PIA e da execução de todos os demais eixos norteadores das medidas socioeducativas, de modo que as atividades escolares, profissionalizantes, esportivas, culturais e de lazer, as ações e os acompanhamentos em saúde, bem como toda e qualquer prática pedagógica devem buscar envolver as famílias, favorecendo o estreitamento dos vínculos e ampliando o caráter protetivo e a sustentabilidade das ações durante o cumprimento da medida socioeducativa e após o retorno do(a) adolescente ao seu território de vivência.

Durante as atividades desenvolvidas pelo GT Protagonismo Juvenil, os(as) adolescentes indicaram os vínculos afetivos e a elaboração de projetos de vida como potenciais fatores de proteção para a não vinculação com a prática infracional. Nesse viés, Costa & Assis (2006) apontam que a ausência de projeto de vida relaciona-se à vulnerabilidade de adolescentes em conflito com a lei, pois estes estão expostos a mais riscos e, consequentemente, têm fragilizada ou mesmo extinta a perspectiva de futuro. (COSTA & ASSIS, 2006).

No que se refere às relações estabelecidas com familiares, de acordo com o GT Protagonismo Juvenil, foi possível perceber a importância que os(as) adolescentes conferem à família e a preocupação com o sofrimento dessa no transcurso do dos vínculos e na minimização dos efeitos do distanciamento social, de maneira que sua incorporação ao rol de ações permanentes das Unidades Socioeducativas passou a ser recomendada e reconhecida institucionalmente pela SUASE no ano de 2022. cometimento do ato infracional até a aplicação da medida socioeducativa e o seu cumprimento. A maioria dos participantes indicou a família como primordial no processo socioeducativo, sendo o afastamento ou a ausência de vínculos familiares elencados como aspectos negativos. Identificou-se na fala dos(as) adolescentes a família enquanto fator de proteção social e afetiva que pode auxiliá-los(as) a romper com a trajetória infracional, o que coaduna com a perspectiva metodológica objetivada pelo trabalhodesenvolvido com as famílias no estado de Minas Gerais.

Dessa maneira, ao reconhecer os(as) adolescentes enquanto protagonistas, não se deve perder de vista o papel que a família ocupa na construção das suas identidades sociais antes, durante e após o cumprimento da medida socioeducativa. Para tanto, deve ser fomentada a participação das referências familiares, levando em consideração seus saberes e suas construções sociais.

7.5.1 Interface com a Política de Assistência Social e articulação de rede

 Eixo Convivência Familiar e Comunitária, como já afirmado, atravessa todo o processo de socioeducação do(a) adolescente e não pode ser objeto de ações e de intervenções apenas no contexto de privação ou de restrição de liberdade. Nessa perspectiva, ao identificar fragilidades e potencialidades dos(as) adolescentes e de suas famílias, a equipe de atendimento deve acionar e articular junto à rede socioassistencial do território de vivência do(a) adolescente, de modo a fomentar a promoção e a garantia de direitos ao grupo familiar, visando ao fortalecimento dos vínculos familiares e sociais.

Neste sentido, é ponto de trabalho para as equipes de atendimento o investimento nas construções em rede e no compartilhamento das responsabilidades com as demais políticas públicas, especialmente a Política de Assistência Social no que tange ao trabalho de fortalecimento de vínculos.

A execução do Eixo Convivência Familiar e Comunitária experimenta limitações que, dentre outros aspectos, se localizam: na dificuldade de implicação da família; na fragilização dos vínculos; na perenidade do processo de violação de direitos; ou na ausência de atuação da rede de atendimento local. Essas limitações tornam essencial a abordagem dos casos pelo viés intersetorial.

A incompletude institucional é princípio fundamental a ser considerado na construção dos casos e deve impulsionar as Unidades Socioeducativas nas ações e nas articulações com outras políticas públicas e a sociedade civil. Isso significa reconhecer que os Centros Socioeducativos e as Casas de Semiliberdade não podem e não devem abarcar todas as demandas dos sujeitos com recursos intra institucionais e que precisam buscar, externamente, outros atores que possam atender às demandas que extrapolam o campo de atuação da socioeducação.

Os programas de execução de atendimento socioeducativo deverão ser articulados com os demais serviços e programas que visem atender os direitos dos adolescentes [...]as políticas sociais básicas, as políticas de caráter universal, os serviços de assistência social e de proteção devem estar articulados aos programas[...] visando assegurar aos adolescentes a proteção integral. (BRASIL, 2006, p.29)

Dentre os objetivos propostos para as medidas socioeducativas no parágrafo 2º do art. 1º da Lei nº 12.594/2012 encontra-se no inciso II “[...] a integração social do adolescente e a garantia de seus direitos individuais e sociais, por meio do cumprimento de seu plano individual de atendimento [...]”. Considerando-se que o público das medidas, frequentemente, possui uma trajetória de vida marcada por violações, é essencial que a garantia de direitos seja trabalhada na perspectiva integral e não apenas sob o recorte pontual da medida socioeducativa. Nesse sentido é que o princípio da incompletude institucional agrega significado e a articulação de rede se consolida como processo de trabalho inerente ao atendimento socioeducativo (BRASIL, 2012).

A articulação de rede se constituiu como instrumento de trabalho e desafio cotidiano, dado que a construção dos casos em rede não é uma tarefa simples, mas essencial, haja vista que Um dos grandes objetivos da medida é viabilizar um processo de inclusão social e que possa fortalecer o adolescente na sua vida em liberdade”. (SOUSA et.al, 2018, p.30).Diante disso, é necessário atentar-se para o fato de que a medida é pontual na vida dos(as) adolescentes e,ao pensar-se na construção do trabalho em rede, que consolide proteção e apoio adequado, é imprescindível que isto ocorra tendo em perspectiva o retorno do(a) adolescente ao território de origem.

A maior parte do público das medidas socioeducativas possui histórico de desenlace com as políticas sociais e, quando se identifica algum vínculo, muitas vezes eleé marcado por desgastes e por conflitos em razão da prática infracional e de seus efeitos na comunidade e nos serviços. Por isso, a articulação de rede demanda tempo e investimento, pois exige, necessariamente, a sensibilização dos atores para atuar nos casos.

A articulação de rede potencializa as ações de cada ator e promove, em seu curso, a formação dos envolvidos, dado que nos espaços de construção coletiva é indispensável que cada ator apresente sua área de atuação, assim como conheça as especificidades do trabalho dos demais. Nessa perspectiva, mostra-se empiricamente potente o trabalho de articulação de rede realizado in loco, seja nas visitas da equipe de atendimento aos equipamentos do território, seja nas visitas dos atores às Unidades Socioeducativas. Tal estratégia permite que toda a rede conheça a infraestrutura disponível para o atendimento ao(à) adolescente e/ou à família. Ademais, a articulação de rede precisa ocorrer em nível institucional, de forma que a rotatividade de profissionais não comprometa a capacidade de engajamento e de resposta de seus atores.

A Metodologia de Articulação da Rede e Garantia de Direitos da SUASE (2017) consolidou orientações para as equipes socioeducativas no que concerne ao processo de articulação de rede. Com objetivos concatenados, o documento da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social de Minas Gerais (SEDESE), intitulado Recomendações para o Atendimento e Acompanhamento Socioassistencial das Famílias e Adolescentes em cumprimento de Medidas Socioeducativas de Internação e Semiliberdade e Egressos (2021) orienta as equipes da Política de Assistência Social, destacando que a atuação da rede do território do(a) adolescente não cessa ou fica suspensa com a aplicação da medida socioeducativa, mas precisa articular-se com a atuação da equipe socioeducativa com vistas a garantir o atendimento em conformidade com a demanda que o caso apresenta(MINAS GERAIS, 2021).

Famílias e adolescentes precisam ser acolhidos tanto na medida quanto na rede, recebendo atendimento e apoio adequado enquanto sujeitos de direitos. A construção da rede deve ocorrer para o caso, visto que os sujeitos possuem conexões que devem ser consideradas. Os encaminhamentos precisam ser discutidos e construídos com o(a) adolescente e com a família, potencializando o protagonismo, o empoderamento e a autonomia para que possam sustentar o acompanhamento mesmo após a medida. Esse é um ponto de especial atenção, principalmente quando o(a) adolescente é oriundo(a) de outra comarca, pois é essencial que as articulações contemplem o território de origem e o pertencimento do(a) adolescente.

A articulação da rede tem especial relevância nos casos de adolescentes que não possuem referência familiar, oriundos(as) de acolhimento institucional, com trajetória de vida nas ruas ou com vínculos familiares fragilizados ou rompidos. São casos complexos e que exigem o acionamento dos serviços socioassistenciais do território do(a) adolescente (Acolhimento Institucional, CRAS, CREAS, Conselho Tutelar etc.) para garantira manutenção dos vínculos sociocomunitários e construir a possibilidade do retorno protegido ao território após o desligamento. A rede atuará não apenas como fonte de informações, mas como partícipe da construção do caso e garantidora de direitos.

No que toca à especificidade da internação provisória, salienta-se que a atuação da equipe de atendimento deve estar voltada para a compreensão do território e para o mapeamento dos equipamentos e dos serviços dos quais a rede local dispõe, avaliando- se a pertinência de sugerir, no relatório multidisciplinar, a aplicação de medidas protetivas cabíveis ao caso, considerando-se, para tal, as ofertas identificadas durante as articulações.

7.5.2 Interface com as Medidas Socioeducativas em Meio Aberto

A interface entre as medidas socioeducativas de privação e de restrição de liberdade com as medidas em meio aberto (liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade) constrói-se a partir do diálogo, buscando a compreensão dos alcances e dos limites das medidas anteriormente aplicadas ao(à) adolescente e das estratégias, exitosas ou não, que nortearam a condução do caso. Isso é importante para que a equipe da Unidade Socioeducativa identifique o que foi efetivo e construa possibilidades de abordagem a partir da experiência do meio aberto. Da mesma forma, nos casos em que os(as) adolescentes são progredidos da internação ou da semiliberdade para as medidas em meio aberto, é importante garantir que os encaminhamentos construídos não se percam no decurso entre a decisão judicial e o início do efetivo cumprimento da medida em meio aberto.

Nas duas possibilidades evidencia-se a necessidade de que as equipes das diferentes medidas estabeleçam canais de comunicação e de construção que viabilizem o acesso às informações e a consolidação de saberes sobre os casos. Nesse sentido, referenciam-se o estudo de caso e as ações de contrarreferenciamento comoinstrumentos a serem priorizados, dado que a circulação da palavra e a horizontalidade das relações podem promover cooperação e alinhamento, mantendo em perspectiva a busca da melhor forma de conduzir e de construir o caso para viabilizar o fortalecimento do(a) adolescente e sua família.

No caso específico da internação provisória, a conexão com o meio aberto é necessária para fomentar, além da busca por informações acerca do(a) adolescente e sua trajetória no território, as suas dificuldades e potencialidades, de modo que a equipe de atendimento possa receber subsídios para construir intervenções e encaminhamentos, tais como a sugestão de medidas protetivas que estejam alinhadas às necessidades dos(as)adolescentes atendidos(as).

Comentario

8.DIREITO À ASSISTÊNCIA RELIGIOSA

A CRFB/88, no artigo 5º, VI, estabelece ser inviolável a liberdade de consciência e de crença, assegurando o livre exercício dos cultos religiosos e garantindo, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias. Ao(à) adolescente privado(a) de liberdade, o ECA preconiza, em seu artigo 124, o direito de receber assistência religiosa, segundo a sua crença e desde que assim o deseje. Assinala, ainda, no artigo 94, inciso XII, que as entidades que desenvolvem programas de internação têm por obrigação, dentre outras, “propiciar assistência religiosa àqueles que desejarem, de acordo com as suas crenças”. (BRASIL, 1990).

As Unidades Socioeducativas devem, pois, oportunizar a assistência religiosa como garantia de direito do(a) adolescente privado(a) ou restrito(a) de liberdade. Importante ressaltar que a participação — ou não — em ações de assistência religiosa não constitui elemento para avaliação de seu processo de socioeducação. Desse modo, não se pode confundir o exercício do direito à assistência religiosa com qualquer dos eixos norteadores das medidas socioeducativas, de modo que deve ser garantida àqueles que espontaneamente a buscam, sem qualquer imposição, obrigação ou pactuação coma equipe socioeducativa.

Assim, é de suma importância que seja garantida a não-participação àqueles(as) adolescentes que por quaisquer motivos não demandaram o suporte religioso e, por outro lado, garantir o acesso aos(às) adolescentes que assim desejarem e que se encontram impossibilitados de buscar a assistência religiosa por meios próprios, por se encontrarem privados de liberdade.

Para a execução adequada das ações de assistência religiosa, as Unidades Socioeducativas devem se pautar no disposto nos Documentos Orientadores para oDireito do(a) Adolescente à Assistência Religiosa(2017) para os Centros Socioeducativos e as Casas de Semiliberdade, que apresentam de forma detalhada as atribuições da equipe socioeducativa para organização das parcerias com voluntários e instituiçõesreligiosas, realização de reuniões com assistentes religiosos para orientação e alinhamento quanto às especificidades das Unidades Socioeducativas e cuidados exigidos em casos de saúde mental, além de outros aspectos relevantes para a garantia deste direito.

Balizadas pelo princípio da laicidade do Estado, as Unidades Socioeducativas não devem privilegiar qualquer denominação religiosa em detrimento de outras. Além disso, devem promover ações e práticas pedagógicas de valorização da cultura de paz, da tolerância e do respeito à diversidade, realizando a busca ativa de instituições religiosas que possam ofertar a devida assistência ao(à) adolescente, mediante demanda. A prática cotidiana mostra que, em geral, as Unidades Socioeducativas são mais acionadas por instituições de denominação evangélica ou católica, contudo, cabe à equipe socioeducativa estar atenta a demandas diversas dos(as) adolescentes, acolhendo, informando e garantindo a oferta por meio de parceiros que possam realizar a assistência religiosa pretendida, observando-se as diretrizes da SUASE.

De modo geral, para que o direito à assistência religiosa do(a) adolescente seja garantido, respeitando-se o princípio da laicidade do Estado, a Unidade deverá: estabelecer rotina de reuniões com as instituições confessionais cadastradas, buscando alinhamento e monitoramento das atividades realizadas; garantir que todas as religiões cuja fé seja professada pelos(as) adolescentes possam ter acesso à Unidade; garantir que a participação do(a) adolescente seja voluntária; ter clareza de que a Unidade não oferta assistência religiosa, mas, sim, propicia o acesso àqueles(as) que assim desejem.

Já na acolhida do(a) adolescente, a equipe de atendimento deve esclarecer-lhe sobre esse direito e verificar a existência de demanda, acolhendo suas crenças e buscando compreender se há um vínculo com instituições religiosas ou vivências no campo da espiritualidade. É fundamental transmitir ao(à) adolescente que a Unidade respeita e acolhe todas as expressões religiosas, bem como a ausência dessas.

Compete à Direção de Atendimento dos Centros Socioeducativos e à Direção Geral nas Casas de Semiliberdade coordenar as ações de assistência religiosa e articular junto à Direção de Segurança o que for necessário e, juntos, designar os profissionais que acompanharão as ações no momento de sua execução pelas instituições religiosas.

Essencial destacar que a equipe socioeducativa deve zelar pela preservação do projeto terapêutico de adolescentes que apresentam questões em saúde mental e aderem a práticas religiosas, cuidando para que não haja interferência no tratamento, esclarecendo à instituição parceira acerca dessa diretriz.

Outro ponto que exige a atenção da equipe socioeducativa refere-se à identidade de gênero dos(as) adolescentes, especialmente de adolescentes transgêneros, que devem ser respeitados(as) e acolhidos(as) conforme sua autodeclaração, sendo proibida qualquer ação, intervenção e/ou manifestação em atividade de assistência religiosa que contenham caráter discriminatório ou que acabe por julgar ou confrontar o(a) adolescente acerca de sua identidade de gênero. É responsabilidade da Unidade Socioeducativa orientar as instituições parceiras nesse sentido e zelar pela erradicação de tais práticas noambiente da socioeducação.

É vedada a realização no interior das Unidades Socioeducativas de rituais próprios de determinada religião, de intenso significado de conversão, que devem ser restritos aos espaços físicos das instituições confessionais (templos, igrejas etc.) e locais considerados sagrados, tais como: batismo, unções, aspersões, desobsessões, descarregos e outras ações semelhantes.

No que se refere à semiliberdade, além das diretrizes já dispostas acima, a equipe socioeducativa deve, sempre que possível, utilizar os recursos existentes na comunidade para a garantia de direitos, o que inclui a assistência religiosa. Desse modo, devem-se priorizar articulações que favoreçam o exercício do direito à assistência religiosa nos espaços comunitários de cada adolescente e sua família, conforme preconiza o Documento Orientador para o Direito do Adolescente à Assistência Religiosa da Semiliberdade (2017). Quando a ação acontecer no interior da Casa de Semiliberdade, a equipe socioeducativa deve indicar espaço físico adequado à participação daqueles que manifestam interesse e, também, permitir a não-participação daqueles(as) que assim desejarem, devendo ser ofertadas a esses(as) últimos outras atividades.

Por fim, importa destacar que cabe às Unidades Socioeducativas, em sua laicidade, acolher todas as religiões, promover o respeito a toda crença e àqueles que não professam religião ou crença, bem como primar para que a conduta ética seja marca de cada trabalhador(a) e parceiro(a) que atua no Sistema Socioeducativo.

 

Comentario

9. JUSTIÇA E PRÁTICAS RESTAURATIVAS

 

Responsabilizar é um preceito pedagógico, diria eu, do percurso restaurativo. Olhar em profundidade para o que se sucedeu, olhar sem julgar, olhar, ver, escutar, ouvir e falar, reconhecer, sentir dor, sustentar o que passou, sustentar com quem efetivou, com quem sofreu. Suportar.Sobre-Portar. Ar. Arquejar. Respirar. Presença. (VIDAL, 2020, p.20 apud ORTH; GRAF, 2020).

A Justiça Restaurativa teve como catalisadores e propulsores importantes movimentos nos campos da Criminologia Crítica, do Abolicionismo Penal, da Vitimologia e do Comunitarismo. Ganha especial atenção a partir do reconhecimento de sua relevância nos processos consentâneos à pacificação das disputas e dos mecanismos extrajudiciais de resolução de conflitos. Cabe ressaltar que essa filosofia, em constante construção, tem ampliado suas fronteiras e, assim, possibilitado atuações antes impensadas.

Na Justiça Juvenil, o entendimento da criança e do(a) adolescente como sujeito de direitos em condição peculiar de desenvolvimento vem permitindo a adoção de novas compreensões acerca do ato infracional e do(a) autor(a) de ato infracional redirecionando o foco para a responsabilização. Isso possibilitou a ampliação do diálogo no sentido de pensar uma Justiça Restaurativa Juvenil na medida em que a Lei do SINASE (BRASIL, 2012) estabeleceu, no art. 35, inciso III, como um princípio da execução das medidas socioeducativas “a prioridade a práticas ou medidas que sejam restaurativas e, sempre que possível, atendam às necessidades das vítimas” (BRASIL 2012).

A noção de socioeducação traduz a mudança ocorrida na evolução histórica do direito juvenil, no qual a ação exclusivamente sancionatória, característica do viés retributivo-repressor, abre campo para ações de caráter educativo-socializador (SILVA, 2006). Responsabilizar é criar obrigações em razão de um fato. Não se resume à natureza sancionatória da medida socioeducativa, mas consiste em contribuir para que o sujeito se aproprie de sua ação transgressora, reconhecendo sua prática como decisão pessoal e percebendo as consequências dela resultantes, seja para vítima ou para ele mesmo. (Saraiva et al, 2011). Neste sentido, a Justiça Restaurativa enquanto eixo epistemológico reitera o novo foco das normativas na medida em que se propõe a representar, a partir dos valores que sustentam sua prática. Trata-se de um novo paradigma pautado na corresponsabilidade, na reparação dos danos, no atendimento às necessidades de todos os envolvidos, na informalidade, na voluntariedade, na imparcialidade, na participação, no empoderamento, na consensualidade, naconfidencialidade, na celeridade e na urbanidade (Resolução 225 de maio de 2016 do CNJ).

Dessa forma, busca-se superar a lógica retributiva e linear de simplesmente imputar uma punição a uma ação considerada como inadequada ou criminosa, como prevê o Direito Penal. Nesse sentido, a partir de valores que privilegiam a troca de experiências, a compreensão mútua, a escuta, a promoção de uma nova resposta, a construção de um novo saber próprio e restaurativo, o foco passa a ser a participação ativa de todos os envolvidos no processo de compreensão de uma situação-problema,sua origem, os danos causados e os eventos desencadeantes e potenciais.

Tal compreensão permite ampliar a noção da rede, da interligação de tudo e de todos, do real sentido de comunidade e da própria responsabilização (SILVA e MAIA, 2014). Neste sentido, a Justiça Restaurativa se apresenta como estratégia salutar nos objetivos do Programa de Cultura de Paz (UNESCO, 1992) previstos na Declaração e Programa de Ação sobre a Cultura de Paz.

O redirecionamento do foco para a responsabilização não se faz afastado do reconhecimento de violências estruturais que se manifestam em ações individuais, coletivas e institucionais manifestadas em violação de direitos fundamentais e relações hegemônicas de poder. Sob as lentes da Justiça Restaurativa, é possível resgatar lugaresde fala e adotar referenciais que dialoguem com a realidade brasileira e latino-americana tornando-se imprescindível garantir acesso à justiça e promover justiça social.

Assim, pensar uma Justiça Restaurativa Juvenil é considerar o perfil da população socioeducativa brasileira, bem como suas características étnico-raciais e sócio-político- culturais que deflagram políticas segregatórias, patriarcais e racistas que, no seio de políticas públicas, apontam o liame existente entre o estrutural e a violência. Considerando tais aspectos, foi instituído o Programa de Justiça Restaurativa do Sistema Socioeducativo de Minas Gerais, denominado Núcleo de Orientação Institucional e Solução de Conflitos nas Unidades Socioeducativas (ÉNOIS).Resultado do Grupo de Trabalho destinado a promover estudos e propostas de reestruturação do Sistema Socioeducativo que se reuniu em 2016, o ÉNOIS tem como objetivo instituir o Programa de Justiça Restaurativa nas Unidades Socioeducativas de internação e de semiliberdade do Estado de Minas Gerais (SEJUSP, 2018) por meio do compromisso com a construção consciente e atenta ao contexto social mineiro e brasileiro de uma Cultura de Paz.

9.1    PRÁTICAS RESTAURATIVAS NO CONTEXTO DA SOCIOEDUCAÇÃO

Esse jeito de trocar ideia é bem melhor.... cada um pode falar a vontade sem ninguém ficá interrompendo ou zuando o outro. (adolescente em cumprimento de MSE no CSE Ribeirão das Neves, 2022).

De acordo com Nunes (2018), as Práticas Restaurativas se configuram em “procedimentos e atividades proativas que podem colaborar para a prevenção e resolução positiva de conflitos em geral” (NUNES, 2018). Tais procedimentos, na medida em que criam espaços seguros para o diálogo, favorecem a conexão entre as pessoas e a construção de relacionamentos saudáveis e de comunidades pacíficas, ampliando a ideia de reparação dos danos para a busca da restauração do senso e do acesso à justiça.

Neste sentido, as Práticas Restaurativas podem se operacionalizar de diferentes formas sem, no entanto, afastar-se dos princípios e dos valores da Justiça Restaurativa, cujo processo envolve todas as partes interessadas (vítima, ofensor e comunidade) na busca pela resolução do conflito e/ou da reparação do dano causado.É a partir da identificação de cada um desses atores e de sua participação no processo que asPráticas Restaurativas poderão apresentar diferentes conformações podendo ser parcial, potencial ou totalmente restaurativa.

No contexto do Sistema Socioeducativo, os processos que visam fomentar responsabilização junto aos(às) adolescentes são considerados, quase que em sua totalidade, parcialmente restaurativos, uma vez que não envolvem a vítima ou a comunidade alvo do dano causado pelo ato infracional. Há precedentes, porém, em que a singularidade do caso permitiu pensar em processos que se configurassem em totalmente restaurativos. Ademais, ao considerar transgressões e conflitos que ocorrem no seio da Comunidade Socioeducativa, é possível pensar em processos potencial ou totalmente restaurativos, uma vez que todos os envolvidos pertencem a esta comunidade.

Diante da complexidade e das diferentes configurações das Práticas Restaurativas, é importante ressaltar que tais processos exigem a formação e a qualificação contínua de facilitadores que estejam habilitados a implementar e a conduzir com cuidado, respeito e atenção processos consensuais de resolução de conflitos conforme Resolução 225/2016 do CNJ. Não observadas tais prerrogativas, incorre-se no risco de que as Práticas resultem em acirramento dos conflitos, desempoderamento de seus participantes e violências, culminando, assim, na descaracterização dos princípios e valores da Justiça Restaurativa.

9.2    CÍRCULOS DE CONSTRUÇÃO DE PAZ E SOCOEDUCAÇÃO

Que dia vai tê aquela roda? Depois cê me chama pra participar? Aquela que a gente é todo mundo igual, dá uma desabafada e depois dá uma alivio no coração.(Jovem em cumprimento de MSE no CSE Santa Clara, 2020)

Dentre as Práticas Restaurativas, o Círculo de Construção de Paz é a metodologia mais amplamente adotada no contexto da socioeducação no Brasil. Os Círculos descendem, originalmente, dos Círculos de Diálogo dos povos indígenas da América do Norte sendo, no entanto, uma prática comum entre povos indígenas e originários em várias partes do mundo até os dias de hoje. Enquanto metodologia estruturada por Kay Pranis (2008), a proposta se funde, na atualidade, aos conceitos de democracia e de inclusão da sociedade contemporânea, acolhendo a diversidade, a divergência e o conflito, vislumbrando-os na perspectiva do respeito e da dignidade de cada indivíduo, na valorização das contribuições diversas, na conexão, na expressão autêntica e na oportunidade de dar vez e voz a cada um.

No contexto da socioeducação, os Círculos são espaços potenciais de diálogo e de aprendizado, na medida em que podem abordar diferentes temas (tais como bullying, racismo, transfobia, adolescência e juventude, mercado de trabalho, trabalho em equipe, normativas do trabalho socioeducativo), bem como construção de acordos de convivência, de celebração de aniversários, de desligamentos e de conquistas diversas e, ainda, de abordagem do conflito ou da conduta nas dependências das Unidades Socioeducativas. Além disso, o Círculo incentiva o protagonismo do(a) adolescente na medida em que lhe confere voz, vez e autonomia nos processos decisórios.

9.3. AMPLIANDO A COMPREENSÃO DE COMUNIDADE SOCIOEDUCATIVA

Eu entrei no Sistema [Socioeducativo]em 2017 e eu nunca participei disso, dessa conversa [Círculo de Construção de Paz]. Eu sempre vi preocupar só com adolescente e pouco com o servidor. Em 6 anos de sócio,é a primeira vez que eu participo dessa conversa e espero que tenha mais porque coloca empatia dentro da gente pra conviver com nossos colegas na Unidade.(Agente de Segurança Socioeducativa do CSE Santa Clara, 2022)

Enquanto paradigma que se embasa na interdependência e na interconexão entre as pessoas, os grupos e as instituições, a Justiça Restaurativa reitera seu enfoque na construção de comunidades saudáveis e pacíficas. Torna-se, portanto, salutar compreender as Unidades Socioeducativas e o Sistema Socioeducativo como Comunidade.

Cabe ressaltar que a construção de comunidades pretendida e apoiada pela Justiça Restaurativa não desconsidera os conflitos advindos da convivência comunitária. Ao contrário, adota a perspectiva do conflito enquanto fenômeno inerente à condição humana e, por isso, uma oportunidade de perceber o que eles desvelam. Nessa perspectiva, os conflitos podem assumir diferentes desfechos que estarão condicionados ao modo como serão compreendidos, considerados e acolhidos: ora poderão contribuir para o desenvolvimento pessoal e comunitário; ora poderão assumir proporções indesejáveis culminando em danos ao trabalho e às relações interpessoais.

A convivência comunitária precisa estar no plano de cuidados de todos e, para potencializar os melhores encaminhamentos, há a necessidade de instrumentos de comunicação qualificada, não violenta e de mediação de conflitos, cenário igualmente aberto às Práticas Restaurativas. Essas favorecem a reinauguração do diálogo respeitoso, horizontal e colaborativo, visam estabelecer a harmonia possível do ambiente comunitário sem silenciar as questões passíveis de tratativas pelos atores envolvidos e fomentam a participação de todos enquanto interessados no desenvolvimento comum.

Desse modo, promover a participação dos(as) adolescentes – que também integram essa Comunidade e nela exercem papéis –, é privilegiar ações que promovem a autonomia e o protagonismo, encorajam novos aprendizados de convivência favorecendo a construção e o fortalecimento de vínculos familiares, territoriais e sociais que potencializam o exercício de uma cidadania plena. Nesse sentido, enxergar os(as) adolescentes por meio de lentes restaurativas, é fomentar espaços que favoreçam a expressão, a responsabilização, a construção identitária e o fortalecimento do sentimento de pertencimento à comunidade na medida em que passam a perceber suas necessidades sendo consideradas e respeitadas pelos demais.

9.4. CONTEXTO E APLICABILIDADE DAS PRÁTICAS RESTAURATIVAS

Em conformidade com o SINASE, a adoção de Práticas Restaurativas no contexto da socioeducação deve ser encorajada, fomentada e inserida na rotina institucional. Para tanto, é possível se valer do escopo de procedimentos e diretrizes já preconizados no Atendimento Socioeducativo e nestes implementar ações de cunho restaurativo. Tais como:

a) Assembleias: enquanto instrumento que visa ampliar o protagonismo e a participação do(a) adolescente nas decisões afetas à rotina, pode-se realizar a assembleia associada à metodologia dos Círculos de Construção de Paz, fomentando a instauração do diálogo horizontal e respeitoso entre todos os atores que compõem a comunidade socioeducativa.

b) Atendimento coletivo, eixos da MSE e atividades: os princípios e os valores da Justiça Restaurativa buscam enfocar a responsabilização numa perspectiva ampla e participativa. Dessa forma, os Círculos de Construção de Paz, em suas várias modalidades, podem apoiar as ações previstas no PIA, ampliar a compreensão sobre oseixos e fomentar envolvimento do(a) adolescente no cumprimento de sua medida socioeducativa.

c) Comissões disciplinares: a comissão disciplinar é a instância deliberativa na qual, por meio do diálogo e da adoção de um paradigma restaurativo, podem ser pensadas práticas e ações que ampliem as possibilidades de responsabilização que, não raro, ficam restritas quando se adota apenas um paradigma punitivo-retributivo.O Regimento Único, pautado no SINASE, aponta para a possibilidade de substituição de uma sanção disciplinar por práticas restaurativas e pedagógicas.Nesse sentido, é importante avaliar o potencial restaurativo da situação que ensejou a convocação da Comissão. Essa avaliação deve ser realizada por servidor(a) habilitado(a) em facilitar Círculos de Construção de Paz, conforme Resolução nº 225/20169, que junto aos demais integrantes da Comissão fomentará a construção de uma proposta que favoreça a responsabilização e a atenção aos pontos desvelados pelo conflito, conduta desviante ou situação-problema.

d) Rede e incompletude institucional: a partir da compreensão da corresponsabilidade pela socioeducação, se faz imperioso construir com a comunidade externa (rede socioassistencial, de saúde, instituições públicas e do terceiro setor, escolas, instituições profissionalizantes e outros) estratégias que viabilizem o diálogo, a compreensão dos papéis e das atribuições de cada ator, de modo que os acordos e as parcerias poderão favorecer o alcance dos resultados almejados e sinalizados no PIA, o rompimento com a dinâmica infracional e a construção de novos projetos de vida.Esse diálogo pode ser encorajado pela instauração de um espaço seguro, protegido e horizontal possibilitado pelos Círculos de Construção de Paz.

9 A Resolução nº 225 de 31 de Maio de 2016 do Conselho Nacional de Justiça que dispõe sobre a Justiça Restaurativa no âmbito do Poder Judiciário determina que as Práticas Restaurativas sejam conduzidas por facilitadores capacitados em técnicas autocompositivas e consensuais de resolução de conflitos próprios da Justiça Restaurativa. Em decorrência disso, a SUASE tem investido em formações que visam ampliar o número de facilitadores e capacitações continuadas que possam subsidiar a atuação desses nas Unidades Socioeducativas.

Ressalta-se que tais exemplos são meramente ilustrativos e não taxativos, de modo que a comunidade socioeducativa deve ampliar seus olhares e suas práticas pedagógicas e restaurativas em todos os campos e áreas possíveis e viáveis, visando expandir as possibilidades de construção de autonomia, de protagonismo e de responsabilização dos(as) adolescentes e a corresponsabilização da família e das instituições.

Comentario

10. SEGURANÇA SOCIOEDUCATIVA

O artigo 112 do ECA, em seu inciso VI, denomina a Unidade Socioeducativa como estabelecimento educacional, o que pressupõe que as ações nela desenvolvidas precisam ser dotadas de caráter pedagógico. No entanto, a privação ou a restrição de liberdade se dá por imposição de uma decisão judicial a um indivíduo, enquanto resposta do Estado e da sociedade ao ato infracional praticado. As medidas socioeducativasintegram, portanto, uma dimensão sancionatória e, também, uma dimensão pedagógica.

Nesse contexto, é dever do Estado assegurar que o(a) adolescente, ao longo do cumprimento da medida socioeducativa, esteja resguardado e em segurança, como estabelece o ECA em seu art. 125: “É dever do Estado zelar pela integridade física e mental dos internos, cabendo-lhes adotar as medidas adequadas de contenção e segurança. (BRASIL, 1990).É nessa perspectiva, pois, que se desenha o exercício da Segurança Socioeducativa nos Centros Socioeducativos e nas Casas de Semiliberdade de Minas Gerais.

Toda e qualquer ação exercida pelos profissionais que atuam em Unidades Socioeducativas deve estar referenciada nos atos normativos e nas diretrizes técnicas e metodológicas consolidadas na legislação e nos documentos orientadores nacionais e estaduais. No campo de atuação da Segurança Socioeducativa, além do ECA, do SINASE, da Política de Atendimento Socioeducativo e do Regimento Único dos Centros Socioeducativos e das Casas de Semiliberdade, destacam-se as Normas e Procedimentos de Segurança do Sistema Socioeducativo de Minas Gerais (NORPSS) (MINAS GERAIS, 2022), que foram consolidadas pela SUASE e se encontram vigentes em todas as Unidades Socioeducativas do Estado.

As NORPSS têm como finalidade nortear ações operacionais que perpassam o trabalho das equipes de segurança, abarcando as atividades por elas desenvolvidas de modo a assegurar o funcionamento das Unidades Socioeducativas e a plena execução dos parâmetros pedagógicos das medidas socioeducativas. Desse modo, a Segurança Socioeducativa, assim como o Atendimento Socioeducativo, faz-se presente enquanto meio para se alcançar os objetivos da socioeducação, o desenvolvimento dos eixos norteadores, a promoção de processos reflexivos do(a) adolescente que favoreçam o autoconhecimento, o protagonismo, a responsabilização e a garantia de direitos humanos fundamentais.

Para tanto, é dever da SUASE dar ampla divulgação e capacitar as equipes socioeducativas no tocante às diretrizes teóricas, técnicas, metodológicas e procedimentais da Segurança Socioeducativa. A condução, a orientação e o monitoramento nessa seara são de competência da Diretoria de Segurança Socioeducativa (DSS) da SUASE. Nas Unidades Socioeducativas a gestão da segurança compete à Direção de Segurança, que deve zelar pelo planejamento preventivo das ações, pelo monitoramento da rotina institucional e pela resposta qualificada aos eventos imediatos. Com esse intuito, o diálogo, a comunicação não violenta, a mediação de conflitos e as práticas restaurativas são o principal instrumento de trabalho das equipesde segurança, sendo que a intervenção por meio de contenção física (devidamentefundamentada) deve ser adotada somente após esgotadas as outras formas de intervenção.

O atendimento socioeducativo aos(às) adolescentes em internação, semiliberdade, internação-sanção e internação provisória é executado em modelos de gestão diversos, sob a condução da SUASE,conforme apresentado no capítulo 3 deste Programa de Atendimento. Assim, a Segurança Socioeducativa descrita nas Normas e Procedimentos de Segurança do Sistema Socioeducativo de Minas Gerais (NORPSS) compreende as atividades exercidas pelo(a) agente de segurança socioeducativa, pelo(a) monitor(a) e socioeducador(a), em suas atribuições e contextos específicos, abrangendo todas as Unidades do estado.

Apesar de existirem atribuições específicas da equipe de segurança, toda comunidade socioeducativa é responsável por construir um ambiente seguro, que garanta condições para que os objetivos pedagógicos da medida se concretizem. Dessa forma, compreende-se que a segurança socioeducativa é interdisciplinar e precisa estar integrada às ações do atendimento técnico especializado.

A escuta e a orientação ao (à) adolescente, no espaço do atendimento, fomentam reflexões sobre sua conduta disciplinar e facilitam a compreensão do objetivo das intervenções e do papel de cada ator envolvido na socioeducação. Ademais, o trabalho alinhado entre as equipes de atendimento e de segurança potencializa o processo vivido pelo (a) adolescente, no qual esse(a) se reconhece protagonista de sua história e corresponsável pelo ambiente em que está inserido(a).

Para executar a medida socioeducativa em conformidade com o proposto no SINASE, as Unidades precisam garantir que a rotina institucional contemple, dentre outras, as atividades escolares, pedagógicas, esportivas e culturais – internas e externas –, oportunizando ao(à) adolescente uma experiência que o(a) fortaleça em seus processos de escolhas, de modo a favorecer o rompimento com a prática infracional.É nesse ambiente e com esse propósito que o profissional da segurança socioeducativa intervém coletiva e individualmente. É também nesse ambiente que a postura atenta e observadora dos profissionais de segurança pode identificar indícios de irregularidades que demandemque as medidas preventivas sejam reforçadas prevenindo os eventos de segurança.

10.1. GERENCIAMENTO DE CRISE NA SEGURANÇA SOCIOEDUCATIVA

As MSE de restrição e de privação de liberdade impõem uma realidade adversa ao ritmo de vida desejado pelo sujeito adolescente. A limitação do espaço e a obrigatoriedade da rotina institucional somam tensão às relações. Associam-se a isso os conflitos decorrentes das relações interpessoais, as frustrações de expectativas diversas e a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, gerando-se um ambiente que favorece a ocorrência de crises e de situações limite.

Nessa senda, a crise é um tipo de ocorrência de alta complexidade e pode ser definida como todo fato de origem humana ou natural que, alterando a Ordem Pública, supere a capacidade de resposta dos esforços ordinários e/ou extraordinários de órgãos de defesa social, exigindo a intervenção por meio de estruturação de ações e/ou de operações especiais típicas da polícia ou do bombeiro-militar, com o objetivo de proteger, socorrer o cidadão e restabelecer a ordem (SANTOS, 2008).

Já situação limite é toda manifestação contrária às normas e às regras estabelecidas pelos Centros Socioeducativos e pelas Casas de Semiliberdade, podendo ser de natureza pacífica, por meio de reivindicações, ou violenta, com ações e consequências imprevisíveis (MINAS GERAIS, 2016, p.533).

As crises e as situações limite exigem a atuação qualificada dos profissionais em geral e, em especial, da equipe de segurança socioeducativa, que tem presença constante junto ao(à) adolescente, sendo responsável pelo monitoramento da circulação interna e pela execução da rotina institucional. São os profissionais dessa equipe que, de imediato, acolhem as demandas do(a) adolescente, assim como atuam na vigilância e na fiscalização, valendo-se da intervenção verbal, da orientação direta e de imposição de limites para constituir-se como figura de autoridade frente aos(as) adolescentes. Nesse sentido, cabe à equipe de segurança socioeducativa zelar pela ordem e pela disciplina no ambiente institucional, o que implica uma atuação qualificada em busca da soluçãopacífica ou menos danosa para o conflito.

As crises e as situações limite no ambiente socioeducativo podem ocorrer em resposta a tentativas de mediações que não obtiveram êxito na resolução cooperativa de conflito, por equívoco do profissional ou da equipe diante de um contexto específico, ou pela ação deliberada de adolescente(s) com o intuito de subverter a ordem. Ademais, as crises podem ocorrer, também, em consequência da efetividade da intervenção qualificada e assertiva desenvolvida pela Unidade, considerando que o desenvolvimento das ações de responsabilização do(a) adolescente e o encontro desse(a) com os limites podem desencadear descontentamentos, conflitos e eventos de segurança.

A CRFB/88, no art. 144,afirma que a segurança pública é um dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, devendo ser exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio (BRASIL, 1988). No que concerneaos(às) adolescentes, o art. 227 traz expressamente que o Estado tem o dever deassegurar-lhes o direito à vida, à dignidade e ao respeito, além de colocá-los(as) a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988).

Está posta, assim, a responsabilidade do Estado de responder, em primeira instância com a equipe de segurança socioeducativa local e, se necessário, com oemprego de grupamento especializado e força policial, à necessidade de estabelecimentoda ordem e da garantia da segurança na Unidade Socioeducativa.

As ações da Segurança Socioeducativa compreendem duas vertentes de atuação importantes para a execução da medida socioeducativa. A primeira atuação é a preventiva, ou seja, com o foco nas intervenções socioeducativas por meio do diálogo e da observância aos procedimentos operacionais padrões que visam garantir o cumprimento da rotina institucional, com pleno atendimento aos eixos da Medida Socioeducativa preconizados na Política de Atendimento da SUASE. A segunda atuação da Segurança Socioeducativa é aquela decorrente de evento de segurança de média e dealta complexidade.

As ações preventivas são rotineiras e acontecem em situação de normalidade, porém há sempre o risco de eventos de segurança considerados simples se transformarem em eventos de segurança de média e de alta complexidade extremamente críticos. Quando deflagradas situações críticas de média e de alta complexidade, há necessidade de intervenção por meio do uso da força. Os Agentes de Segurança Socioeducativos desempenham suas funções desprovidos de qualquer tipo de equipamento de proteção individual e de recursos para controle de motins, de rebeliõesou de qualquer ato violento.

Considerando a necessidade de uma atuação especializada e qualificada da equipe de segurança frente aos eventos de segurança de média e de alta complexidade nos Centro Socioeducativos do Estado de Minas Gerais, evitando o acionamento deoutras forças de segurança do Estado, que desconhecem o ambiente socioeducativo, foi criado o Grupo de Ações Rápidas (GAR) por meio da Resolução SEJUSP nº 228/2021.

O GAR é composto por uma equipe de agentes de segurança socioeducativa qualificados e equipados para a realização de intervenções durante motins, rebelião e outros eventos de segurança de média e de alta complexidade, objetivando cessar as ações que coloquem em risco a integridade dos(as) adolescentes, dos servidores e/ou profissionais e a depredação do patrimônio. Além disso, faz parte da atuação do GAR: realizar escoltas de adolescentes envolvidos em facções e/ou ameaçados em trânsitos externos para atendimento de saúde, audiências, atendimentos junto aos órgãos do Sistema de Justiça, bem como em eventos familiares, tais como funerais e sepultamentos; realizar escolta intermunicipal e interestadual de adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa; realizar movimentação de grupos de adolescentes entre as Unidades e/ou eventos que exijam ações estratégicas de segurança; prestar apoio, quando devidamente demandado pela autoridade competente, junto às Unidades Socioeducativas em eventos de segurança, contendo as ações dos adolescentes de modo a controlar a emergência, bem como apoiar nos procedimentos de revista nos alojamentos, adolescentes e demais locais da Unidade.

A atuação do GAR nas intervenções que demandem o uso da força deve ser pautada no emprego de técnicas e de Instrumentos de Menor Potencial Ofensivo, em conformidade com o Decreto que dispõe sobre o uso de Equipamentos de Proteção Individual e Instrumentos de Menor Potencial Ofensivo, observando criteriosamente os princípios da legalidade, da necessidade, da razoabilidade e da proporcionalidade do uso progressivo da força, de modo a preservar vidas e minimizar danos às integridades físicae moral das pessoas envolvidas.

Para garantir capacidade de resposta adequada à complexidade das situações, a DSS possui equipe permanente e diuturna em atuação no Centro Integrado de Comando e Controle (CICC).

O CICC possui recursos tecnológicos e infraestrutura para favorecer a efetividade no monitoramento de eventos e na gestão de crises. A equipe de segurança em exercício no CICC auxilia na confecção de REDS e na articulação/monitoramento de escoltas e de outros temas estratégicos da segurança junto às Unidades Socioeducativas.

A equipe atua em tempo integral, 24 (vinte e quatro) horas por dia e 07 (sete) dias por semana visando prestar o apoio necessário diante de situações de urgência e de emergência, seja pelo acionamento dos Diretores das Unidades, seja pela identificaçãode informações atípicas na rotina durante análise das informações diárias prestadas pelas Unidades.

Há um fluxo diário de encaminhamento de informações referentes a cada plantão entre os gestores das Unidades Socioeducativas e a equipe do CICC, informando quantitativo de servidores presentes, situação dos adolescentes e situações atípicas na rotina. Essas informações prestadas diariamente pelas Unidades são analisadas e qualificadas, estando a equipe do CICC apta a realizar as devidas orientações e o acionamento de outros órgãos e de forças de segurança para apoio, suporte e intervenção necessária. Destacam-se, aqui, acionamentos realizados com maior frequência: Companhia Energética de Minas Gerais S.A. (CEMIG), em situações de falta de energia elétrica; Companhia de Saneamento de Minas Gerais (COPASA), em casos defalta de água; Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG), para atuação em eventos de segurança, confecção de REDS nas Casas de Semiliberdade e nas UnidadesSocioeducativas diante das naturezas do REDS que não contemplam o sistema socioeducativo, apoio em escolta de alta complexidade; Guarda Municipal de Belo Horizonte (GMBH) para apoio em encaminhamento e em escolta de adolescente que possua risco à sua integridade física devido a ameaças externas, estando a equipe responsável pelo monitoramento das escoltas intermunicipais e interestaduais.

A equipe da SUASE no CICC realiza, também, suporte à Diretoria de Gestão de Vagas e Atendimento Jurídico, analisando as documentações de solicitação de vagas em observância aos critérios para atendimento às solicitações, deferindo ou não o pleito, atuando diariamente integrada às demais forças de segurança e órgãos externos envolvidos na medida socioeducativa, produzindo Boletins Extraordinários em eventos de segurança de relevância, bem como eventos envolvendo Agentes de Segurança Socioeducativos para serem remetidos os Boletins ao Diretor da DSS.

Essas ações são orientadas pela Diretriz Integrada de Ações e Operações (DIAO), que tem por finalidade padronizar a atuação integrada dos diversos atores das forças de segurança para potencializar a capacidade de resposta às crises e às situações limite, estabelecendo estrategicamente uma lógica de acionamento conforme a especificidades dos eventos, bem como otimizar e disciplinar o uso dos recursos disponíveis para as intervenções (MINAS GERAIS, 2017).

Retomando, por fim, a perspectiva de Segurança Socioeducativa adotada pela SUASE, faz-se essencial destacar que abarca um conjunto de ações preventivas, pautadas no diálogo, na comunicação não violenta, na mediação de conflitos, nas práticas pedagógicas e restaurativas, bem como nas ações necessárias de contenção visando a salvaguarda da integridade física de adolescentes, de trabalhadores e de terceiros. Além disso, importante destacar a relevância de participação das equipes de segurança nas discussões e nas construções dos casos junto às equipes de atendimento e corpo diretivo, de modo a promover a atenção integral aos(às) adolescentes que se encontram em cumprimento de medida socioeducativa, por meio da compreensão acerca das potencialidades, das vulnerabilidades e das singularidades do público atendido.

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11. INTELIGÊNCIA SOCIOEDUCATIVA

O Decreto Estadual nº 48.659/2023, que dispõe sobre a organização da SEJUSP, prevê, em seu art. 88, inciso VI, que a SUASE tem por competência implementar,coordenar, salvaguardar e compartilhar a produção de informações de Inteligência no âmbito do Sistema Socioeducativo, de forma integrada e observando as diretrizes da Subsecretaria de Inteligência e Atuação Integrada da SEJUSP.

Dando cumprimento a este dispositivo legal foi instituída a Agência Central de Inteligência Socioeducativa (ACIS), regulamentada pela Resolução SEJUSP nº 211/2021, que desempenha a atividade de Inteligência no âmbito do Sistema Socioeducativo.

A ACIS está voltada para atender a três níveis de atuação:

  • Estratégico: aquele cujo produto fornece subsídios à tomada de decisões críticas para o aprimoramento do Sistema Socioeducativo como um todo.
  • Tático: diz respeito a determinada área de resultados e não à organização como um todo e, portanto, trabalha com decomposições dos objetivos, das estratégias e das políticas estabelecidas no nível estratégico.
  • Operacional: objetiva auxiliar a tomada de decisões de natureza executiva relativas à atividade-fim das Unidades Socioeducativas, subsidiando a tomada de decisão frente a possíveis ocorrências negativas que possam comprometer o trabalho socioeducativo.

O processo decisório de gestão socioeducativa referente ao planejamento, à execução e ao acompanhamento das atividades-fim da SUASE requer informações precisas e oportunas. Nesse sentido, a Inteligência Socioeducativa é um instrumento eficiente para auxiliar o trabalho preventivo intramuros e extramuros realizado pelasequipes das Unidades Socioeducativas, visando evitar as ocorrências negativas.

Nesse sentido, iniciou-se em 2022 e encontra-se em fase final a implantação de 11 (onze) Núcleos de Inteligência no âmbito de Unidades Socioeducativas escolhidas estrategicamente. Ademais, foi planejada a implantação de Núcleos em mais 13 (treze) Unidades em 2023.

Importante destacar que a análise e os produtos de Inteligência constituem apenas um dos diversos meios informacionais que influenciam o processo de tomada de decisão, de maneira que seus relatórios podem apresentar-se mais ou menos importantes para certas decisões de gestão.

A ACIS desenvolve, também, atividade de Inteligência de Segurança Pública no combate ao crime organizado, fundamentada em doutrinas nacional e estadual. Nesse sentido, emprega estratégias, táticas e técnicas procurando identificar, entender e revelar aspectos ocultos da atuação envolvendo facções criminosas ou que comprometam o atendimento socioeducativo que seriam de difícil detecção pelos meios tradicionais de trabalho.

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12. COMISSÕES DISCIPLINARES

A comissão disciplinar é a instância decisória instituída pelos respectivos Regimentos das medidas de internação e de semiliberdade, com o intuito de resguardar a adequação, a proporcionalidade e a excepcionalidade na aplicação de medidas disciplinares aos(às) adolescentes, sempre que cabível.

A comissão disciplinar se personifica no conjunto de profissionais da Unidade Socioeducativa que realizam a escuta do(a) adolescente acerca dos fatos em apuração e deliberam se haverá a adoção de medidas disciplinares, bem como acerca daquelas mais adequadas, quando este for o caso. Conforme os Regimentos, o conjunto de profissionais que formam a comissão disciplinar deve ser composto por 3 (três) representantes da equipe socioeducativa, a saber: 1 (um) representante da equipe de segurança, necessariamente ocupante da função de supervisor, de coordenador ou de subcoordenador de segurança; 1 (um) representante da equipe técnica, preferencialmente do jurídico; e 1 (um) terceiro componente que poderá ser de qualquer uma das equipes daUnidade.

A instauração de comissão disciplinar ocorre mediante a ocorrência de uma conduta tipificada previamente como falta disciplinar no Regimento Interno, sendo assegurado ao(à) adolescente a oportunidade de ser ouvido(a) e de esclarecer o fato. Ressalta-se que diante de suposta prática de transgressão disciplinar por um(a) adolescente, é fundamental que a pessoa que presenciou ou tomou conhecimento do ato o descreva em formulário próprio de forma objetiva e completa, apresentandoinformações suficientes para a apuração.

Nesse sentido, o registro da suposta transgressão para instauração de comissão disciplinar deve apresentar alguns elementos básicos, a saber: narrar o que ocorreu; onde ocorreu; data e horário do fato; quem atuou diretamente ou de forma colaborativa ao fato; a quem se dirigiu a ação; os resultados da ação; como o relator se deparou com a informação/situação; quais medidas foram adotadas; quais as respostas imediatas à sua abordagem ao(à) suposto(a) autor(a); a quem está sendo direcionada a notificação.

O(A) adolescente a quem é atribuída a prática de falta disciplinar deve ser imediatamente notificado(a) por meio de formulário previsto no Regimento, sendo-lhe assegurada a oportunidade de ampla defesa e contraditório em comissão disciplinar, inclusive com a participação do defensor público ou do advogado constituído. Há, no Regimento Interno, a previsão de prazo para a realização das comissões disciplinares, cuja expiração implica em suspensão imediata de qualquer restrição que a notificação tenha gerado.

A comissão disciplinar, assim como a medida socioeducativa, possui natureza híbrida, agregando o caráter sancionatório e, também, o caráter pedagógico, devendo esse último prevalecer em toda e qualquer prática de socioeducação. Desse modo, o formato e a execução da comissão disciplinar, bem como as medidas disciplinares adotadas, precisam ter caráter educativo na trajetória do(a) adolescente.

Dentro do procedimento, deve ser garantido ao(à) adolescente a ciência acerca do ato que lhe está sendo atribuído; a notificação acerca da suposta transgressão; a oitiva acerca dos fatos de forma respeitosa, em ambiente seguro e adequado, de modo que possa apresentar sua versão acerca do ocorrido, podendo solicitar a inclusão de testemunhas durante o processo.

Os integrantes da comissão disciplinar deverão deliberar sobre a aplicação ou não de medidas disciplinares, identificando e dando ciência ao(à) adolescente quais sanções lhe serão aplicadas. Tais sanções deverão ser pautadas primordialmente pela natureza pedagógica da socioeducação. É garantido ao(à) adolescente o direito de recorrer formalmente à Direção Geral da Unidade Socioeducativa quando discordar da decisão da comissão. Apresentado o recurso, conforme previsão regimental, o(a) Diretor(a) Geral deve fundamentar resposta e apresentá-la formalmente ao(à) adolescente e à comissão.

A ação de comunicar uma suposta falta disciplinar por parte de qualquer servidor e a instauração de uma comissão disciplinar não pode ser mecânica e tampouco protocolar, dado que o rito desencadeado, com previsão de recursos e de outros procedimentos, pode envolver toda a comunidade socioeducativa e seu efeito reverberar ao longo do tempo.

A comissão disciplinar é um espaço de importantes construções entre equipe socioeducativa e adolescentes, cabendo aos profissionais da Unidade sinalizar ao(à) adolescente as oportunidades de aprendizado, de construção de saberes e de desenvolvimento de conhecimento, inclusive com a valorização, pela equipe, das vivências prévias à privação/restrição de liberdade, ao mesmo tempo em que se confirma,também, a função responsabilizadora e sancionatória da medida socioeducativa.

Nessa perspectiva, os profissionais que compõem a comissão disciplinar devem estar pautados na Metodologia de Atendimento Socioeducativo da SUASE e nos princípios e nas diretrizes que balizam a socioeducação, priorizando práticas e intervenções pedagógicas. Em verdade, antes mesmo de se configurar uma transgressão,o olhar atento, a escuta ativa e a presença educativa dos profissionais são essenciais para a prevenção de ações que culminem em faltas disciplinares. As equipes de segurança e de atendimento devem intervir de forma preventiva, por meio do diálogo, da comunicação não violenta, da orientação e de uma presença pedagógica.

A situação em que a escolha do profissional é pela intervenção via orientação, e não pela simples notificação do(a) adolescente para posterior comissão disciplinar, não se confunde com omissão ou negligência. Ao contrário, traduz o amadurecimento profissional das equipes socioeducativas e a compreensão da amplitude da missão institucional.

O estabelecimento de diálogos horizontalizados e a disponibilidade para participar do processo de cumprimento da medida socioeducativa junto ao(à) adolescente requer dos profissionais mais que a posição de isenção ao processo, de distanciamento e a adoção de uma postura procedimental. A equipe socioeducativa, partindo da compreensão do(a) adolescente enquanto sujeito de direitos – e não objeto da tutela e ação do Estado –, necessita construir intervenções de modo a promover reflexões, construções e pontes com o(a) adolescente.

Nesse contexto, encontra-se nas comissões disciplinares terreno fértil para a promoção de práticas restaurativas por meio de diferentes ferramentas que possibilitam um espaço de diálogo, contribuindo de forma efetiva para a reparação de danos e de vínculos, bem como a promoção de responsabilização, permitindo integração epacificação comunitária, construindo-se, portanto, alternativas para as soluções meramente punitivas e excludentes.

As práticas restaurativas, contudo, não são utilizadas em todos os casos. A comissão disciplinar deve avaliar o potencial restaurativo da falta cometida e, sendo considerado possível e positivo para o caso, a comissão o encaminhará ao facilitador de Justiça Restaurativa da Unidade Socioeducativa, para que esse possa dar encaminhamento ao processo restaurativo. Importante destacar que o processo restaurativo somente pode ser realizado quando as partes envolvidas, espontaneamente, assumem as suas responsabilidades nos acontecimentos e manifestam a sua concordância em participar da atividade.

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13. ESTRATÉGIAS DE PROTEÇÃO DA VIDA E PREVENÇÃO DA LETALIDADE DE ADOLESCENTES

Certos grupos societários são mais propensos a vivenciarem episódios de violência e de perderem suas vidas. No Brasil, tal fato decorre da formação sócio-histórica do país, com destaque para a escravidão e as suas marcas que até hoje podem ser sentidas e percebidas. Ao término do período escravocrata no Brasil, não houve um novo pacto social que incluiu os negros enquanto sujeitos de direito e concidadãos, impondo-se a seguinte pergunta: como lidar com essa parcela da população que até então era considerada apenas como força de trabalho braçal e vista como incapaz de desenvolver habilidades intelectuais? A dívida social da sociedade brasileira com os povos afrodescendentes e o racismo estrutural são, pois, questões que precisam ser consideradas e debatidas por toda a população, o que inclui os formuladores e executoresdas políticas públicas.

Outro marcador histórico importante é o autoritarismo do Estado brasileiro, com a herança da ditadura militar e a instituição de um Sistema de Justiça que criminaliza a pobreza e a cor da pele. Assim, o cenário que vem se consolidando nas políticas de segurança ainda acolhe práticas repressivas e de encarceramento das populações moradoras das periferias e das favelas, construindo uma imagem de que tais regiões são produtoras de violência e seus moradores agentes dessa produção (BRASIL, 2017, p. 74). O Atlas da Violência (2018) constata que a taxa de mortalidade entre jovens de 15 (quinze) a 29 (vinte e nove) anos no Brasil é 2 (duas) vezes maior do que entre pessoas de outras faixas etárias. Entre os anos de 2009 e 2019, o Brasil perdeu 333.330 (trezentos e trinta e três mil, trezentos e trinta) jovens assassinados (CERQUEIRA; et al, 2019). Esse número representa um jovem assassinado a cada 17 (dezessete) minutos. Outro dado importante é que os negros representam 77% (setenta e sete por cento) dos assassinados em 2019. Com isso, demarca-se que o perfil com maior probabilidade de morte violenta e intencional são homens jovens, solteiros, negros, com até 7 (sete) anos de estudo. Os homicídios respondem por 59,1% dos óbitos de homens entre 15 (quinze) a 19 (dezenove) anos no país.

Considerando-se o perfil do público atendido pelo Sistema Socioeducativo é possível constatar que ele não difere substancialmente do exposto pelo Atlas da Violênciae se vê atravessado, cotidianamente, pelos marcadores históricos mencionados, seja em liberdade ou no cumprimento de MSE.

Todas as circunstâncias e as informações que subsidiam o entendimento acerca de possíveis contextos de ameaças de morte precisam ser amplamente avaliadas e discutidas pelas equipes socioeducativas. Os riscos, que podem se configurar enquanto qualquer possibilidade conhecida ou desconhecida, e até mesmo incerta, acerca dasituação são constituídos por tudo aquilo que torna o sujeito mais vulnerável a determinados cenários de ameaça. Nesse caso, a ameaça se configura e ganha corpo a partir dos elementos que compõem os riscos existentes. Nesse sentido, os riscos podem estar associados ao fato de determinado grupo de adolescentes/jovens estar vinculado a determinada prática infracional, a determinado território ou a determinados grupos rivais.

Faz-se importante destacar, também, o conceito de risco social. Esse, amplamente utilizado pela Política de Assistência Social, se configura quando são identificados cenários de vulnerabilidade e/ou de violação de direitos. Para esse cenário o SUAS prevê estrutura própria de atuação, por meio da Proteção Social Básica e da Proteção Social Especial, além dos Conselhos Tutelares quando se trata de crianças e de adolescentes. Diante disso, nos casos em que se constata o risco social a atuação prioritária se dará viapolítica pública de assistência social, enquanto estratégia de atuação frente ao cenário identificado.

A Assistência Social enquanto política pública ganha notoriedade também como estratégia de proteção da vida dos adolescentes e dos jovens. Estruturalmente essa política está organizada de forma capilarizada nos territórios, atuando em uma perspectiva local, comunitária e, muitas vezes, preventiva. São, na maioria dos casos, os primeiros equipamentos a terem contato com as famílias e os jovens em situação de ameaça e onde são constituídos os vínculos iniciais entre os grupos familiares, as comunidades e as instituições estatais.

Tão logo as equipes socioeducativas tenham conhecimento de situações de ameaças e/ou de restrições de circulação dos(as) adolescentes e dos(as) jovens em determinados territórios, se faz necessário estabelecer estratégias para construir uma execução de medida segura. Para isso, e dependendo da extensão que essa ameaça possa adquirir, será necessário discutir os encaminhamentos de saúde e de escola, além das atividades externas, sem perder de vista a premissa da garantia de tais direitos no cumprimento da medida. Para isso, a equipe pode lançar mão dos estudos de casos em parcerias com atores externos e, assim, definir sua atuação.

As metodologias de execução das medidas de internação e de semiliberdade contemplam o Relatório de Ameaça, instrumento que pode ser utilizado para informar ao Poder Judiciário o que se sabe sobre a situação e, assim, solicitar avaliação do Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM). Tal informe passa objetivamente por mencionar quem está ameaçando a vida daquele sujeito, em queconsiste a ameaça, quais os motivos da mesma, em quais regiões ela pode estar localizada, o tempo dessa ameaça, o que já foi feito para cessá-la e se há riscos aos familiares. Tais pontos são norteadores, mas podem não estar integralmente claros para aequipe de atendimento e até mesmo para o(a) próprio(a) adolescente. Desse modo, ainda que nem todas as informações estejam claras, a Unidade fará o levantamento do máximo de dados possíveis para subsidiar o Poder Judiciário no acionamento do PPCAAM. Além das informações objetivas, o relatório também deve conter a percepção técnica construída a partir dos atendimentos com o(a) adolescente e a sua família, já que a sensação de insegurança nos territórios é sentida por eles(as).

No caso da medida de semiliberdade, o trabalho de aprofundamento e de pesquisa em relação aos riscos e às ameaças se dá em menor tempo. Em função das características próprias da medida, que prevê a execução dos eixos de forma prioritariamente externa, o levantamento de pontos que indicam supostas ameaças e/ou restrições de circulação precisam se iniciar tão logo os(as) adolescentes sejam admitidos.

Para tanto, é indispensável o contato com as equipes socioeducativas que conduziram o trabalho durante o acautelamento provisório, pois nesse período construções importantes foram iniciadas, além de realizar atendimentos individuais com os(as) adolescentes e priorizar os contatos presenciais com os familiares.

Muitas vezes, no momento de assumir a responsabilidade formal pelas saídas dos(as) adolescentes é que as referências familiares ponderam sobre situações que antes não foram mencionadas. Contudo, é preciso compreender que a existência de um possível risco não significa a inviabilidade total e completa do cumprimento da medida de semiliberdade, mas demanda um olhar mais próximo e cuidadoso dos trajetos que esse(a) adolescente percorrerá. Paralelo a isso é importante colher nos atendimentos os efeitos causados por tais arranjos e o próprio comprometimento do(a) adolescente frente aos mesmos. Nesse ponto, a participação da família ganha ainda maior notoriedade, pois ao longo do acompanhamento do(a) adolescente no cumprimento da medida no território os familiares conseguem perceber e noticiar questões relacionadas à circulação dos(as) mesmos(as).

Outro aspecto importante de ser observado pela equipe socioeducativa a cada nova admissão de adolescentes é o surgimento de agitação ou a tentativa de reprodução da lógica dos grupos e das relações sociais na Unidade. Esse movimento pode tornar a circulação de determinado adolescente ainda mais restrita e os desdobramentos na convivência com os demais se tornar, por vezes, insustentável.

Quando identificada ameaça que inviabiliza o cumprimento da medida ao ponto de não ser possível colocar em prática nenhuma estratégia segura para as saídas e as atividades externas, o Poder Judiciário deve ser novamente acionado por meio do instrumento Relatório de Ameaça. Em alguns casos, a Unidade Socioeducativa executora pode construir, junto à SUASE, outras possibilidades para o caso, como o cumprimento da medida em outra Unidade.

Importante mencionar que todo esse histórico de informações e de construções deve ser transmitido ao Poder Judiciário e, em caso de movimentação dos(as) adolescentes entre Unidades Socioeducativas, via estudo de contrarreferenciamento. Acada novo ator que ingressa na construção de novas possibilidades e a cada estratégia alinhada é necessário que estudos sejam realizados para que não haja sobreposição de ações, atravessamentos que possam prejudicar seu andamento e até mesmo colocar o(a) adolescente em risco.

É fundamental que as equipes socioeducativas compreendam que as estratégias de proteção da vida e de prevenção da letalidade devem ser construídas em rede. Nesse sentido, é importante destacar o Sistema de Garantia de Direitos (SGD) enquanto fator de proteção de adolescentes e de jovens.

Composto por atores cuja premissa de atuação está na promoção, na defesa e no controle da efetivação dos direitos da infância e da adolescência previstos no ECA, o SGD é formado por membros do Ministério Público, do Poder Judiciário, da Defensoria Pública, dos Conselhos Tutelares, dos Conselhos dos Direitos das Crianças eAdolescentes, dentre outros. Especial destaque precisa ser dado aos Conselhos Tutelares, que por sua atuação local conhecem os(as) adolescentes, os jovens e as suas famílias, se constituindo, inclusive, enquanto Porta de Entrada do PPCAAM para os casosque não estão vinculados a uma medida socioeducativa. O trabalho de valorização desses parceiros é tarefa importante para o Sistema Socioeducativo que, assim como as demais políticas públicas, pode ser integrado a um trabalho de rede mais consistente.

Outro ator de extrema importância para o Sistema Socioeducativo na temática da prevenção da letalidade de adolescentes é o Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte, instituído pela Lei Estadual nº 15.473/2005 e regulamentado pelo Decreto Estadual nº 44.838/2008.

O PPCAAM objetiva efetivar ações em articulação com o SGD para a preservação da vida de crianças e de adolescentes em situação de ameaça de morte. A entrada do PPCAAM no caso deve ser construída com o(a) adolescente e a sua referência familiar, já que a sua inclusão, em qualquer modalidade de proteção, pressupõe a retirada do sujeito do local de ameaça e o cumprimento de normas e regras próprias do Programa.

Na cartilha “Um novo olhar PPCAAM – Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte”, elaborada pelo Ministério dos Direitos Humanos em 2017, apontam-se os desafios relacionados a essa proposta, enquanto aquela que se apresenta como único recurso para a garantia de proteção a adolescentes e a jovens. Dentre eles destaca-se o processo de desterritorialização e de rompimento dos laços comunitários desses sujeitos, considerando a imprescindibilidade do distanciamento físico do território de origem dos(as) adolescentes e a referenciação identitária construída durante o tempo e na vivência das relações culturais, sociais, afetivas e até mesmo econômicas desses(as) adolescentes. Outro desafio que se apresenta é na manutenção dos vínculos familiares estando o(a) adolescente ou o jovem protegido(a) pelo Programa.

Ainda no que tange aos mecanismos de proteção, destaca-se a Política Estadual de Prevenção Social à Criminalidade (Lei Estadual nº 23.450/2019), desenvolvida pela Subsecretaria de Prevenção à Criminalidade (SUPEC) por meio de um conjunto de ações no campo da Segurança Pública e com foco na intervenção direta em fatores sociais relacionados à violência e à criminalidade. Iniciada em 2002, a Política atua na prevenção de violências e de criminalidades em determinados territórios e junto aos grupos mais vulneráveis a esses fenômenos, ofertando atendimento por meio de programas específicos, dentre os quais destacam-se aqueles destinados a adolescentes e a jovens eque mantém maior relação com o Sistema Socioeducativo:

  • Programa Se Liga: destinado ao atendimento de adolescentes e de jovens desligados das medidas socioeducativas de internação e de semiliberdade residentes em áreas de abrangência do programa. O acompanhamento se dá por meio de atendimentos individuais e da contínua articulação da rede social, buscando favorecer e fortalecer a construção de redes de proteção em todo do(a) adolescente ou jovem egresso.
  • Programa de Controle de Homicídios – Fica Vivo!: atua na prevenção e na redução de homicídios dolosos de adolescentes e de jovens de 12 (doze) a 24 (vinte e quatro) anos em áreas que registram maior concentração desse fenômeno. Por meio do programa são realizadas oficinas, projetos locais, atendimentos e promoção de Fóruns Comunitários. Além disso, possui frente de trabalho junto ao Policiamento Preventivo Especializado, realizado pelo Grupo Especializado em Policiamento de Áreas de Risco da Polícia Militar (GEPAR).
  • Programa Mediação de Conflitos: se propõe a contribuir para o fortalecimento e a mobilização comunitária, incentivo ao diálogo e ao capital social e favorece o acesso a direitos. A intenção é construir com os moradores uma segurança pública cidadã e promover meios pacíficos de resolução de conflitos a partir dos fundamentos da mediação comunitária, impactando na redução da violência letal.

Não raro, os(as) adolescentes e os jovens que cumprem as medidas socioeducativas passam a acessar boa parte das políticas sociais a partir do ingresso em uma Unidade Socioeducativa e se deparam, nesse momento, com diversos equipamentosque antes não faziam parte do seu universo. É pelo ato infracional, portanto, e por sua inclusão compulsória em uma política pública de atendimento socioeducativo que se tornam sujeitos de outras ações, estratégias e equipamentos públicos, marcados(as) pela trajetória infracional e os percalços que o(a) fizeram chegar até ali.

O atendimento técnico ganha notória importância no espaço socioeducativo, pois a partir dele e por ele as ações próprias da execução da medida ganharão sentido. A partir do estabelecimento de um espaço de escuta horizontal e ausente de preconceitos e de juízos de valores, a equipe de atendimento fará a leitura daquilo que é dito pelo(a) adolescente, incorporando a esse saber as demais informações colhidas e tratadas em outros espaços. O movimento de construção do atendimento é contínuo e se alimenta da troca daquilo que é composto por todos.

É a partir da escuta respeitosa e cuidadosa que o vínculo é formado e, com ele, questões antes não mencionadas podem ganhar corpo, como é o caso das ameaças. De forma equivocada, o(a) adolescente pode trazer consigo a compreensão de que dizer das ameaças pode significar o prolongamento da medida socioeducativa e a restrição de circulação em atividades externas. É no espaço e na liberdade que se oferta ao sujeito que as questões que atravessam suas vidas surgem. E, aqui, trata-se de um espaço e de uma liberdade direcionados, consistentes e propositivos, já que se está dizendo de uma construção dialógica e viva. Ao conhecer o(a) adolescente nos diferentes espaços será possível construir as estratégias para acessá-lo(a).

A adolescência tem um saber que lhe é próprioe que escapa ao discurso hegemônico do adulto. Tentar escutar o(a) adolescente como alguém que sabe o que é o melhor para ele(a) é, desde o início, deixar de escutar. É o sujeito que fala e aponta o caminho. Nessa perspectiva, cabe à equipe de atendimento uma postura de escuta ativa, de acolhimento e de abertura à construção com o(a) adolescente das estratégias possíveis e sustentáveis de segurança e proteção à vida.

Importante considerar que o discurso do adolescente, que por vezes apresenta uma lógica não linear, instrumentaliza a equipe socioeducativa a buscar e a construir o entendimento sobre a situação de ameaça. É nesse discurso que podem aparecer referências diversas, localizadas em pessoas ou em instituições que auxiliam nesse trabalho. Então, para além de realizar o mapeamento da rede local que atua no território de forma prévia, é preciso construir estratégias para que o(a) adolescente mencione tais referências e, com isso, trabalhar no sentido de compreender sua importância enquanto estratégia de proteção.

A iminência da morte atravessa o percurso desses(as) adolescentes. Nos atendimentos eles(as) relatam as perdas de amigos, de parentes e de pessoas próximas de formas violentas.Nesse contexto de histórias de vida que correm mais risco de morte é que se dá o trabalho das equipes socioeducativas, que, por sua vez, devem buscar construir com o(a) adolescente, a família, os atores e as instituições da rede de garantia de direitos estratégias e perspectivas de proteção e de segurança.

Identificados o risco e a ameaça de morte, inicia-se a mobilização da rede de proteção entre as diversas instituições e seguem-se os protocolos para assegurar que a informação sobre o risco alcance os demais atores. Contudo, conforme já destacado, é imprescindível que a construção das estratégias e das perspectivas de proteção e de segurança seja realizada com o(a) adolescente, de modo que faça sentido para ele(a), garantindo a efetividade e a sustentabilidade dos encaminhamentos.

Ante este cenário, é importante que as equipes socioeducativas se utilizem do espaço do atendimento para afirmar ao(à) adolescente a sua existência e o quão necessária e importante ela é. Consiste em transformar este espaço em um ambiente dialógico, instaurando um processo de construção de estratégias de forma horizontal, respeitosa e ancorada na realidade do(a) adolescente.

Para tanto, é preciso ter uma relação bem estabelecida entre o(a) profissional da equipe de atendimento e o(a) adolescente, e um espaço de atendimento que favoreça a confiança, o respeito aos saberes e às histórias de vida, conduzindo o sujeito à compreensão de que há outras possibilidades para além da decisão entre “matar ou morrer”. Para isso, mais uma vez frisa-se a importância do protagonismo enquanto ponto de trabalho da socioeducação.

A Unidade Socioeducativa deve ocupar o lugar de apoio nesse momento de construção, uma vez que o processo de aceitar a existência do risco e de reconhecer-se destinatário da necessidade da proteção pode ser difícil para o(a) adolescente. Nessa construção cabe à equipe de atendimento apresentar ao(à) adolescente as opções existentes dentro da política de proteção e de defesa de direitos e, diante do contexto, construir com ele(a) possibilidades de saídas seguras para a situação ameaçadora, fomentando sua autonomia e decisão perante situações que já se apresentam e outras que poderão surgir.

Importante destacar que as estratégias construídas à revelia dos(as) adolescentes incorrem, por vezes, em fracasso. Por isso é tão necessário localizar o(a) adolescente como potencial protagonista, reconhecendo que ninguém melhor do que ele(a) para dizer sobre a própria vida, incentivando sua participação na identificação dos desafios e na busca de soluções. Isso para que seja possível questionar o lugar que o(a) adolescente se encontrava e que o(a) direcionou ao ato, para, assim, seguir rumo à construção dealgo que o conecte à vida.

Nessa perspectiva, o atendimento socioeducativo atua na premissa garantidora dos direitos e afiançadora de seguranças buscando impactar nas vulnerabilidades que perpassam a vida desses jovens. É imperioso evocar este sentido e trabalhar no propósito de que os(as) adolescentes fiquem seguros, livres e possam se soltar desse emaranhado letal que conduz tantos adolescentes negros, pobres e moradores de periferias à morte precoce. Contudo, não se trata de responsabilizar somente o(a) adolescente por suas proteção e segurança. É imprescindível a construção e o fortalecimento de redes protetivas que envolvem a família, as referências afetivas e sociais do(a) adolescente, os atores e as instituições de seu território de vivência e as políticas públicas de saúde, de educação e de assistência social.

Comentario

14 . AVALIAÇÃO DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA

 

A visão da medida socioeducativa, eu acho que é um momento de reflexão pra cada adolescente que já passou na vida, porque ninguém sabe o que a gente passou na vida. Então talvez a pessoa cometeu aquele ato por a pessoa ter chamado ou opção que quis ou só ir por fazer,“ah eu sou aquela pessoa mesmo e vou fazer pra mostrar e aparecer”. Eu acho que a medida socioeducativa é assim, mas ela também, serve para reflexão, que agente aprende muitas coisas(...), a gente pensa nas melhoras do que a gente quer pra vida. (Adolescente em cumprimento de MSE no CSE São Jerônimo, 2022)

O ECA, em seu art. 121, §2º, estabelece que a medida socioeducativa de internação deve ser reavaliada periodicamente, com intervalo máximo de 6 (seis) meses, dando ciência à autoridade competente. O mesmo deve ser aplicado à medida de semiliberdade.

A Lei do SINASE (2012), na mesma perspectiva, estabelece que:

As medidas socioeducativas de liberdade assistida, de semiliberdade e de internação deverão ser reavaliadas no máximo a cada 6 (seis) meses, podendo a autoridade judiciária, se necessário, designar audiência, no prazo máximo de 10 (dez) dias, cientificando o defensor, o Ministério Público, a direção do programa de atendimento, o adolescente e seus pais ou responsável (BRASIL,2012).

Na execução das medidas socioeducativas de semiliberdade e de internação a equipe socioeducativa deverá elaborar os Relatórios de Avaliação de Medida para informar ao Sistema de Justiça sobre o cumprimento da medida pelo(a) adolescente, sobre o trabalho realizado pela Unidade e o planejamento das próximas intervenções, quando for o caso, a fim de garantir a qualidade e a brevidade da medida.

Para a escrita do relatório de Avaliação de Medida a equipe técnica deverá pautar- se em dados relevantes sobre a história do(a) adolescente e sobre o cumprimento da medida socioeducativa. Os relatórios de Avaliação de Medida são elaborados pela equipe de atendimento, com contribuição das informações das demais áreas (segurança, escola, parceiros). Os pontos relevantes do cumprimento da medida que devem constar em relatório serão identificados a partir dos atendimentos, dos estudos de caso e do PIA(informações relevantes da Avaliação inicial, do Plano de Intervenção e do Acompanhamento).

Na correlação com a proposta do PIA, a avaliação da medida socioeducativa de semiliberdade e de internação deve ser pautada nas propostas desenvolvidas com o(a) adolescente e a sua família e/ou as referências sociais e afetivas, sendo necessário abordar cada meta traçada estabelecida no Plano de Intervenção. É de extrema importância que os profissionais envolvidos na construção do relatório consigam expressar de forma clara os avanços apresentados pelo(a) adolescente ao longo do período que antecedeu a escrita do relatório. Da mesma forma, é necessário mencionar quais foram os pontos de impasse que surgiram no cumprimento dos objetivos declaradospelo(a) próprio(a) adolescente e quais foram as estratégias encontradas para superá-los, além de deixar transparecer a subjetividade do sujeito que está cumprindo a medida socioeducativa.

Considerando sempre que o(a) adolescente precisa ser protagonista de sua história, o processo de avaliação da medida socioeducativa deve ser, também, o momento em que ele(a) precisa ser chamado(a) a refletir e a avaliar o que já foi possível observar e contabilizar como avanços (metas cumpridas por completo ou parcialmente)ou pontos que ainda precisam ser fortalecidos, bem como aspectos que demandarão a construção de novas estratégias e metas para cumprimento dos eixos. Na perspectiva de fomentar as condições para que os(as) adolescentes se fortaleçam enquanto protagonistas de suas vidas e do cumprimento da medida socioeducativa, ele(a) deve ter ciência do que é tratado nos relatórios encaminhados ao Sistema de Justiça.

Desde a determinação pelo cumprimento da medida socioeducativa a família é chamada, de diversas maneiras, a participar do processo de responsabilização do(a) adolescente enquanto corresponsável pelo processo socioeducativo. Dessa forma, é imperioso que as referências familiares, sociais e afetivas sejam envolvidas no processo de avaliação da medida socioeducativa.

Ouvir o que a família tem a dizer sobre o processo socioeducativo e as suas percepções do cumprimento dos eixos da medida pelo(a) adolescente, além de ser uma forma de provocá-la sobre sua corresponsabilização é, também, o momento de compreender como o(a) adolescente apresenta para os familiares e a comunidade o que vem sendo trabalhado na Unidade Socioeducativa. Envolver os familiares neste processo pode ser uma forma de compreender aspectos do caso que possam ter passado despercebidos pela equipe socioeducativa ou que somente se apresentem no contato extramuros.

Outro aspecto que deve ser bem observado no processo de avaliação da medida é a percepção da equipe de atendimento acerca do caso a partir das contribuições de todas as áreas de conhecimento, garantindo uma construção multidisciplinar de cada caso. Na avaliação da medida a equipe precisa convergir quanto à centralidade do caso e compreender qual é o momento que o(a) adolescente vivencia na medida socioeducativa, considerando todas as suas singularidades.

No processo de avaliação da medida socioeducativa a equipe vai se deparar com algumas possibilidades, quais sejam: manutenção da medida socioeducativa; progressão para medida socioeducativa menos gravosa; ou desligamento da medida socioeducativa.

manutenção de medida deve ser considerada quando se verifica a necessidade de continuidade do(a) processo de responsabilização por meio da execução dos eixos norteadores da medida socioeducativa, indicando os pontos que ainda precisam ser trabalhados com o(a) adolescente, o planejamento das próximas intervenções, as possíveis correções de rumo e as repactuações, se necessário.

progressão de medida deve ser considerada quando verificadas a possibilidade e a necessidade de substituição da medida atual por outra menos gravosa, sendo importante salientar os avanços e os aspectos que ainda exigem intervenções, mas que podem, e devem ser realizadas em contextos menos restritivos.

Desse modo, a qualquer tempo a equipe de atendimento pode sugerir a progressão de medida, especialmente quando identificados avanços objetivos no que concerne aos eixos da medida, denotando que o(a) adolescente tem a capacidade de dar continuidade a seu processo de responsabilização em outra medida socioeducativa.

Ressalta-se que a progressividade entre as medidas socioeducativas não possui um padrão de gradação, sendo possível que elas ocorram tanto entre as medidas de meio fechado (da internação para a semiliberdade) quanto das de meio fechado para as de meio aberto (da internação para a liberdade assistida; da semiliberdade para a liberdade assistida). Salienta-se que a definição acerca de qual medida deverá ser aplicada em substituição à medida original é realizada com base nas especificidades do caso.

A construção da progressão deve ser iniciada antes do protocolo do relatório que irá sugerir tal encaminhamento. É necessário um trabalho prévio consistente para que a progressão, caso seja decretada pelo Poder Judiciário,ocorra de forma qualificada. Nesse sentido a equipe de atendimento deverá:

  • Realizar estudo de caso no qual se constate a existência de elementos capazes de sustentar a proposta de progressão da medida;
  • Realizar atendimento com o(a) adolescente e com a família, no qual sejam tratados os aspectos relativos à possibilidade de progressão e à continuidade do processo socioeducativo em outra medida;
  • Intensificar as ações de articulação de rede desenvolvidas no decorrer damedida, com vistas a promover o engajamento dos serviços e os equipamentos com o caso após a progressão da medida, especialmente dos serviços que executam a medida para a qual o(a) adolescente será progredido(a).
  • Elaborar relatório técnico que noticie ao Poder Judiciário os aspectos relevantes do cumprimento de medida, de forma a argumentar concretamente acerca da possibilidade de substituição da medida atual por outra menos gravosa, sinalizando claramente os avanços alcançados pelo(a) adolescente durante a medida, bem como os pontos que ainda precisam ser trabalhados na medida proposta.

Havendo o deferimento da proposta de progressão formulada pela equipe socioeducativa pela autoridade judicial, após a expedição da decisão de progressão de medida cabe à equipe socioeducativa promover as ações necessárias para:

  • Realizar a entrega do(a) adolescente à referência familiar ou à instituição responsável por acolhê-lo(a) após a medida, quando a medida aplicada for uma medida de meio aberto;
  • Proceder à transferência do(a) adolescente para a Casa de Semiliberdade, conforme liberação da Central de Vagas, quando da substituição da MSE de internação pela MSE de semiliberdade;
  • Desvincular o(a) adolescente formalmente da Unidade Socioeducativa;
  • Promover o contrarreferenciamento do caso junto à equipe da Unidade Socioeducativa de destino ou à rede do território do(a) adolescente no caso de progressão para medidas em meio aberto.

 

desligamento da medida deve ser considerado a partir de um retrospectohistórico de todo o percurso do(a) adolescente mediante o desenvolvimento dos eixos norteadores pactuados no PIA e de sua responsabilização subjetiva, demonstrando o cumprimento da medida. Ademais, é essencial considerar aquilo que o(a) adolescente relata como objetivo após sua saída da medida e os encaminhamentos que facilitarão o seu retorno ao território de vivência.

Judicialmente o desligamento consiste no momento em que o(a) adolescente é desvinculado da medida socioeducativa por decisão judicial, ou seja, é o momento em que a medida é oficialmente concluída, com a expedição de alvará de liberação do(a) adolescente. No âmbito da execução das medidas socioeducativas o desligamento é entendido como a culminância do processo de seu cumprimento, momento no qual se consolida o entendimento de que o(a) adolescente cumpriu as proposições dos eixos do PIA.

Importante considerar que a consolidação do entendimento pela equipe socioeducativa de que o(a) adolescente cumpriu a medida é amplo e está intimamente relacionado à responsabilização subjetiva, enquanto possibilidade de vivência de um processo pessoal e social de apropriação e/ou de compreensão acerca do ato praticado e das suas consequências lesivas.

Por isso, na execução da medida socioeducativa a individualização do processo socioeducativo visa que as intervenções alcancem os(as) adolescentes a partir de sua história de vida, daquilo que lhe é próprio e singular. O processo reflexivo é provocado a partir do ato e da trajetória infracional, mas não só por eles, pois se trata de um processo complexo e multifatorial ao qual cada adolescente apresenta uma condição diferenciada de compreensão e elaboração, construindo seu repertório de respostas às provocações técnicas.

Nesse sentido, é preciso considerar os casos em que respostas subjetivas não emergem, seja por limitações que se manifestam no campo da saúde mental, nos processos que dificultam o acesso e a garantia de direitos individuais e sociais, seja em função do prolongado decurso de tempo entre a prática infracional que levou à aplicação da medida e a efetiva vinculação do(a) adolescente à medida. Portanto, há que se considerar que o desligamento também pode ser entendido a partir de construções que perpassam a atuação e as ações de outras políticas públicas, sem que haja, necessariamente, o cumprimento pragmático de todos os eixos da medida socioeducativa. Ademais, considera-se que o processo de cumprimento de medida é, também, o processo de construção do desligamento do(a) adolescente, sendo que cada meta estabelecida e cada ação realizadas devem ter por objetivo promover as condições necessárias para que o(a) adolescente retorne ao seu território de vivência. Nesse sentido, o(a) adolescente precisa ser protagonista de seu processo e estar ciente de sua trajetória na medida socioeducativa. Ao construir o desligamento com o(a) adolescente, a equipe técnica deve retomar em atendimento seu percurso socioeducativo, sinalizando osavanços, os pontos de embaraço, as soluções construídas, de forma que ele(a) esteja ciente dos encaminhamentos e de sua situação processual.

Da mesma forma, a família deve ser inserida no processo, sendo participante ativa, devendo ser orientada acerca dos trâmites legais e das garantias às quais o(a) adolescente continuará ou passará a fazer jus após o desligamento. A equipe deverá instruir a família acerca dos trâmites necessários para a inserção do(a) adolescente em escola de seu local de moradia, com vistas a garantir a continuidade dos planos construídos durante a medida. É de extrema importância que a família favoreça a continuidade dos encaminhamentos junto com o(a) adolescente após o desligamento, pois isso possibilitará autonomia, protagonismo e prevenção a novas práticas infracionais.

Outro ponto de grande relevância é a vinculação do(a) adolescente aos serviços e aos equipamentos de seu território de origem, tecendo-se a necessária rede de proteção e de apoio para o sujeito, a qual será responsável pelo atendimento e pelo acompanhamento do caso, na perspectiva da garantia de direitos e da proteção integral, após a finalização da medida.

Neste sentido, para que ocorra o desligamento a equipe socioeducativa deverá:

  • Realizar estudo de caso no qual se constate a existência de elementos capazes de sustentar a finalização da medida;
  • Realizar atendimento com o(a) adolescente e com a família, no qual sejam tratados os aspectos relativos ao desligamento e aos encaminhamentos pós medida;
  • Articular ações específicas com o Programa de Acompanhamento ao Egresso das Medidas Socioeducativas de Internação e Semiliberdade de Minas Gerais – Se Liga, onde houver cobertura;
  • Intensificar as ações de articulação de rede desenvolvidas no decorrer damedida, com vistas a promover o engajamento dos serviços e dos equipamentos com o caso após a finalização da medida;
  • Elaborar relatório técnico que noticie ao Poder Judiciário os aspectos relevantes do cumprimento de medida, de forma a argumentar concretamente acerca de sua conclusão, tendo em vista os avanços alcançados pelo(a) adolescente.

Após a expedição da decisão de desligamento, cabe à equipe socioeducativa:

  • Promover as ações necessárias para realizar a entrega do(a) adolescente à referência familiar ou à instituição responsável por acolhê-lo após a medida,sendo    responsabilidade   da    Unidade   Socioeducativa   o    transporte    do(a) adolescente até seu domicílio ou Unidade de acolhimento;
  • Desvincular o(a) adolescente formalmente da Unidade Socioeducativa;
  • Promover o contrarreferenciamento do caso junto à rede do território do(a) adolescente.

Ao longo do processo de avaliação da medida socioeducativa, independentemente da conclusão da equipe socioeducativa (se pela manutenção, pela progressão ou pelo desligamento), deve ser dada ciência ao(à) adolescente e à sua família, de modo que compreendam o momento em que se encontra o processo de socioeducação e os encaminhamentos a serem adotados. Importante destacar que, embora a equipe socioeducativa tenha autonomia para propor a manutenção da medida, a progressão ou o desligamento do(a) adolescente, tal decisão é da competência da autoridade judicial.

14.1 AUDIÊNCIAS CONCENTRADAS

No âmbito do processo de avaliação das medidas socioeducativas de internação e semiliberdade, o Poder Judiciário pode adotar a prática de audiências concentradas conforme preconiza a Recomendação nº 98 de 26 de maio de 2021 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

As audiências concentradas, dentre outros objetivos, visam garantir a observância dos princípios da legalidade, excepcionalidade, proporcionalidade, brevidade, individualização, mínima intervenção, não discriminação do(a) adolescente e fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários na execução das medidas socioeducativas. Além disso, a audiência concentrada garante a participação do(a) adolescente, que tem a oportunidade de se manifestar diante do juiz, promotor e defensor público, favorecendo o protagonismo juvenil.

As audiências concentradas têm sido uma importante estratégia para garantia de maior agilidade no atendimento de adolescentes e jovens, além de qualificar o acompanhamento das medidas socioeducativas e promover a participação da rede e do Sistema de Garantia de Direitos nesse processo. A presença desses atores na audiência concentrada visa sua corresponsabilização, para que possam atuar como fatores de proteção e suporte para o(a) adolescente e sua família na continuidade do cumprimento da medida e após o desligamento.

Outro objetivo estabelecido pelo CNJ ao recomendar a prática de audiências concentradas consiste no fortalecimento da fiscalização das Unidades Socioeducativas pelo Sistema de Justiça, ao priorizar a realização das audiências nas dependências das Casas de Semiliberdade e Centros Socioeducativos.

A equipe técnica, sob a orientação da Direção de Atendimento, deve realizar os estudos de caso e elaborar os relatórios interdisciplinares com antecedência, para que sejam disponibilizados ao Sistema de Justiça para uma avaliação integral, considerando o cumprimento dos eixos previstos no PIA do(a) adolescente. Além disso, a equipe técnica pode ser chamada a participar em momentos específicos da audiência, a fim de esclarecer dúvidas, responder a perguntas adicionais e contribuir com a proposição dos encaminhamentos.

O corpo diretivo da Unidade deve envolver as equipes técnica, de auxiliares, de segurança, adolescentes, familiares e atores da rede na organização das audiências concentradas, por meio do compartilhamento de informações, de rodas de conversa e da construção de uma programação para o dia das audiências, de modo que toda a comunidade socioeducativa participe da preparação e organização do que cabe à Unidade. A Recomendação nº 98/2021 do CNJ enfatiza que familiares, adolescentes e jovens devem ser acolhidos em ambiente adequado antes do início das audiências de reavaliação para que recebam as orientações sobre a finalidade e o funcionamento das audiências concentradas em linguagem simples e acessível (art. 4º, §1º). Nesse sentido, é fundamental que o corpo diretivo e a equipe técnica dialoguem e informem ao(à) adolescente e sua família acerca dos objetivos da audiência concentrada e seu formato.

Além disso, a equipe deve acolher a ansiedade dos(as) adolescentes com a proximidade do momento, as expectativas quanto à avaliação da medida ou sobre como deve agir durante a audiência. Nesse sentido, a equipe técnica pode realizar atendimentos individuais e coletivos, com participação do(a) profissional analista técnico jurídico, rodas de conversa, oficinas de elaboração de cartas ou textos sobre o que gostaria de dizer no momento da audiência, entre outros dispositivos, conforme o caso.

A Unidade Socioeducativa deverá organizar estratégia de acolhida à família, aos atores da rede e do Sistema de Justiça, bem como preparar espaço adequado à realização da audiência, quando essas ocorrerem no interior do Centro Socioeducativo ou Casa de Semiliberdade.

Comentario

15. CONTRARREFERENCIAMENTO

O princípio da incompletude institucional impõe às medidas socioeducativas a necessidade de buscar, externamente, outros atores e políticas públicas para garantir o atendimento integral ao(à) adolescente, tendo como parâmetro a garantia dos direitos fundamentais.Dessa forma, como já apresentado neste Programa, a articulação de rede é uma premissa do trabalho socioeducativo e precisa ocorrer considerando-se os diversos campos da vida do(a) adolescente.

Com isso, durante o cumprimento de medida o sujeito adolescente acaba por estar referenciado à Unidade Socioeducativa que, para abarcar a complexidade dos casos, mobiliza serviços, equipamentos e instituições ligados ao território onde está localizada, os quais, muitas vezes, não coincidem com aqueles do território de origem dos(as) adolescentes.

Considerando-se a lógica da Proteção Integral, que permeia todas as ações destinadas ao público adolescente, é indispensável que as articulações de rede sejam intensificadas durante a preparação para o desligamento, no sentido de se construir o retorno do(a) adolescente ao território e, consequentemente, a transferência do atendimento para os serviços, os equipamentos e as instituições do seu local de moradia.

O conceito de contrarreferenciamento já é adotado em outras políticas públicas, como na Saúde, em que a referência e a contrarreferência são mecanismos “que favorecem a troca de informações na rede de atenção, o trânsito do usuário no sistema e a continuidade do cuidado, portanto é considerada uma potente ferramenta que promovea prática integral na saúde” (ANDRADE; FRANCISCHETTI, 2019).

Na política de assistência social, nas orientações técnicas destinadas às equipes dos CRAS, encontra-se que:

A função de referência se materializa quando a equipe processa [...] as demandas oriundas das situações de vulnerabilidade e risco social detectadas no território, de forma a garantir ao usuário o acesso [...] conforme a complexidade da demanda.

A contrarreferência é exercida sempre que a equipe do CRAS recebe encaminhamento do nível de maior complexidade (proteção social especial) egarante a proteção básica, inserindo o usuário em serviço, benefício, programa e/ou projeto de proteção básica. (MDS, 2009, p. 10)

A mesma essência do contrarreferencimento já adotado nas políticas públicas de Saúde e de Assistência Social respalda a adoção do conceito de contrarreferenciamento pelo Sistema Socioeducativo, compreendendo-o como a ação que viabiliza o retorno responsável e protegido do(a) adolescente ao seu território de origem, promovendo o trânsito das informações pertinentes sobre esse(a) e garantindo-se a continuidade do atendimento e a integralidade do cuidado na rede de proteção conforme as demandas do caso.

Em termos práticos, o contrarreferenciamento exige que a equipe socioeducativa se organize para:

  • Compilar as informações acerca do atendimento ofertado ao(à) adolescente durante o cumprimento de medida (na rede de educação, de saúde, de assistência social, profissionalização etc.);
  • Realizar estudos de caso e visitas institucionais com vistas a transmitir à rede do território as informações atualizadas sobre o(a) adolescente e a sua família, enfatizando as ações e os acompanhamentos que precisam ser continuados quando da finalização da medida;
  • Reafirmar para o(a) adolescente e a sua família o funcionamento da rede de proteção construída para o caso e, sempre que possível, articular o atendimento desses(as) nos momentos iniciais após o desligamento; e
  • Sistematizar as informações sobre as ações de contrarreferenciamento e enviá-las ao juízo que acompanha a execução das medidas socioeducativas sempre que solicitado.

O contrarreferenciamento visa, portanto, promover as amarrações necessárias para que as construções acerca de cada caso não se percam após o encerramento da medida socioeducativa, mas que sejam continuadas e fortalecidas por meio da rede do município.

As ações de contrarreferenciamento devem ocorrer imediatamente após o desligamento, devendo ser concluídas pela equipe de atendimento em, no máximo, até 10 (dez) dias após a decisão que determinar a extinção da medida socioeducativa.Tais ações devem ser compartilhadas com o programa de atendimento ao adolescente egresso Se Liga, quando o(a) adolescente residir em território atendido pelo programa.

Destaca-se a explícita necessidade de que as equipes das diferentes medidas possam estabelecer canais de comunicação e de construção que viabilizem a circulação das informações e a consolidação de conhecimento acerca dos casos. Nesse sentido, insta fazer referência ao estudo de caso como instrumento de trabalho a ser priorizado no processo de articulação entre as medidas, dado que, neste espaço, a circulação da palavra e a horizontalidade das relações promovem a cooperação e o alinhamento entre os diferentes atores. Necessário ter sempre em perspectiva a melhor forma de conduzir e de construir o caso, o que precisa se traduzir em ações e em intervenções que visem ao protagonismo, a responsabilização e a garantia de direitos aos(às) adolescentes. Ressalta- se que tais orientações também podem subsidiar a condução dos casos quando for aplicada medida socioeducativa em meio aberto.

Com relação à rede socioassistencial, faz-se importante mencionar o documento Recomendações para o atendimento e acompanhamento socioassistencial das famílias e adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas de internação, semiliberdade e egressos, elaborado pela SEDESE em outubro de 2021 e que visa auxiliar e apoiar os municípios na organização dos serviços socioassistenciais, de acordo com as legislações e normativas que regem o Sistema Único de Assistência Social - SUAS. As orientações se dão para o atendimento na rede socioassistencial das famílias e dos(as) adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas de internação e de semiliberdade e egressos do Sistema Socioeducativo, em especial os(as) que cumprem medida fora do seu município de origem e que, ao término, precisam retornar para o seu território de vivência e ali encontrar suporte e apoio para a continuidade de encaminhamentos e projetos iniciados durante o cumprimento da MSE.

As referidas Recomendações elaboradas pela SEDESE para os municípios vão ao encontro da perspectiva do diálogo intersetorial e interinstitucional necessário para o trabalho das equipes socioeducativas e reafirmam a importância do processo de contrarreferenciamento.

Com relação aos(às) adolescentes em cumprimento de internação provisória, é sabido que a imprevisibilidade temporal é fator a ser considerado em todos os processos que permeiam esse momento. Nesse sentido, o que se torna essencial é a identificação de direitos violados da família e do(a) adolescente, bem como suas demandas, sempre na perspectiva de fomentar a construção da autonomia e da fluidez do acesso desses sujeitos em relação à rede externa de atendimento. Ressalte-se que tais ações podem contribuir na construção de outros acompanhamentos mais robustos por parte das políticas públicas e que vão reverberar por período maior de tempo, inclusive para os casos em que houver posterior aplicação de medidas socioeducativas privativas ou restritivas de liberdade.

Nesse contexto, o relatório interdisciplinar é um dos instrumentos que materializa o trabalho desenvolvido pelas equipes que atendem adolescentes na internação provisória. Nele são registrados aspectos importantes, como a história de vida do adolescente, sua trajetória infracional, a forma como estabelece as relações sociais, o vínculo com a escola, com a família, com a profissionalização, as redes pelas quais o adolescente e a família percorreram, os atendimentos com a família, se há demandas para outros tipos de articulação, se houve visitas domiciliares ou das referências na Unidade, aspectos de saúde, relação com o esporte, a cultura e o lazer, e suas vivências, entre outros. Conforme previsão metodológica, seu prazo de entrega ao Poder Judiciário ocorre antes ou no momento da audiência do(a) adolescente.

Contudo, após efetuado o protocolo do relatório junto ao Poder Judiciário, as equipes permanecem em articulação com a rede, em contato com as famílias, promovendo a continuidade das ações iniciadas com o adolescente após a audiência, já que nem sempre a decisão judicial é imediata. Com isso pode restar prejudicado o registro dessas ações, já que as questões iniciais sobre o caso já constam no relatório interdisciplinar e nem sempre há a produção de relatórios complementares. Novos elementos podem surgir, a construção do caso adquire novos contornos, surgem novos recortes das histórias de vida, outras redes de apoio se apresentam, as dimensões subjetivas introduzidas nos atendimentos começam a fazer sentido para os sujeitos e a relação com as questões suscitadas podem se perder com a movimentação do(a) adolescente para uma Unidade Socioeducativa de internação ou de semiliberdade, caso não haja uma transmissão efetiva e responsável do caso. Desse modo, destaca-se a importância da constante atualização do prontuário do(a) adolescente da internação provisória, por meio do registro dos atendimentos, dos encaminhamentos e das articulações ocorridas após o relatório.

Com isso, o contra referenciamento aplicado ao contexto da internação provisória, é entendido enquanto ação que viabiliza a movimentação qualitativa do(a)adolescente à medida aplicada, promovendo o trânsito das informações pertinentes sobre o caso e garantindo-se a continuidade do atendimento e das intervenções, conforme as demandas do caso. Esse movimento deve considerar o respeito à autonomia de construção que as equipes que executam as medidas de internação e de semiliberdade possuem e a forma como se organizam ancoradas no arcabouço metodológico daquilo que é próprio de cada uma dessas medidas.

Desse modo, o contrarreferenciamento da internação provisória para outras equipes socioeducativas de internação ou de semiliberdade visa garantir a continuidade da construção sistêmica do caso e, em termos práticos, exige o desenvolvimento das seguintes ações:

  • Na data do recebimento da sentença, realizar atendimento individual com o(a) adolescente para informar sobre a aplicação da medida socioeducativa e o fluxo que se dará a partir daquele momento
  • Realizar contato telefônico com a referência familiar do(a) adolescente, informar sobre a aplicação da medida socioeducativa e que a equipe da Unidade de destino realizará contato para atendimento inicial;
  • Preencher Informe de Saúde dos(as) adolescentes que fizerem uso de qualquer medicação e tiverem quaisquer agendamentos e encaminhamentos na rede de saúde ou saúde mental. O Informe de Saúde deverá ser encaminhado junto ao(à) adolescente no momento da transferência;
  • Encaminhar o prontuário de saúde com todos os registros atualizados e organizados, bem como todas as receitas e as medicações já dispensadas junto ao(à) adolescente no momento de sua transferência. Diante da necessidade de contextualização do caso de forma emergencial, sob a perspectiva da saúde, cabe à Direção de Atendimento fazer contato imediato com a Unidade que receberá o adolescente;
  • Informar à Unidade de destino sobre o vínculo do(a) adolescente com programas de aprendizagem, cursos de formação profissional ou trabalho, na data da liberação da vaga ou dia útil subsequente;
  • Compilar as informações acerca do atendimento ofertado ao(à) adolescente durante a internação provisória (nas redes de educação, de saúde, de assistência social, de profissionalização, de esporte, cultura e lazer, de atendimento técnico etc.), principalmente aquelas informações que não constam no relatório interdisciplinar, e registrá-las no prontuário do(a) adolescente. Caso a transferências e dê antes da conclusão do registro, a equipe de atendimento da internação provisória poderá, se necessário, remeter relatório complementar à parte para a Unidade de destino até 05 (cinco) dias a contar da data do recebimento da sentença;
  • Realizar, em até 10 (dez) dias, a contar do recebimento da sentença, estudo de caso de contrarreferenciamento com vistas a transmitir à Unidade Socioeducativa de destino as informações atualizadas sobre o(a) adolescente, enfatizando as ações e os acompanhamentos que precisam ser continuados;
  • Sistematizar as informações sobre as ações de contra referenciamento e enviar ao juízo que acompanha a execução das medidas socioeducativas sempre que solicitado.
Comentario

16. ACOMPANHAMENTO AO(À) ADOLESCENTE EGRESSO(A)

 

O ECA, em seu artigo 94, estabelece como uma das obrigações das entidades que desenvolvem programas de internação que mantenham programas destinados ao apoio e acompanhamento de egressos. Na mesma perspectiva, a Lei do SINASE (2012) determina, como requisito obrigatório para inscrição do programa de atendimento, a previsão das ações de acompanhamento do(a) adolescente após o cumprimento de medida socioeducativa.

Em Minas Gerais o Programa Se Liga foi criado no ano de 2010 para realizar o acompanhamento dos(as) adolescentes egressos(as) das medidas socioeducativas de internação e de semiliberdade residentes nos municípios onde o Programa já foi implementado. Como acompanhamento entende-se tanto a dimensão do atendimento individual quanto a articulação contínua da rede social em torno do(a) adolescente.

Para além das diretrizes e normativas nacionais, a criação do Programa Se Liga se situou na tentativa de dar continuidade às conexões entre o(a) adolescente/jovem e a cidade após o cumprimento de medida. Assim, a provocação implícita ao nome “Se Liga” tem como perspectiva um convite ao(a) adolescente/jovem para se vincular a outros espaços, prescindindo do ato infracional e do cumprimento de medida socioeducativa.

O Programa tem como prerrogativa auxiliar os(as) adolescentes em seu processo de fortalecimento de vínculos comunitários, familiares e sociais, buscando, preferencialmente, utilizar os equipamentos disponíveis na rede de atendimento dos municípios. Assim, o Se Liga se constitui como um dispositivo de acesso à cidade e à rede de proteção social, estabelecendo-se como instrumento de construção no reencontro com a liberdade.

O Programa baseia-se na livre e na espontânea adesão do(a) adolescente/jovem, de 12 (doze) a 24 (vinte e quatro) anos, e no acompanhamento deste(a) por até 1 (um) ano, contado a partir da data de sua inclusão, buscando-se a integração do(a) egresso(a) do Sistema Socioeducativo à cidade, promovendo o acesso a direitos e, principalmente, a alternativas diferentes do ato infracional.

Constitui-se como a oferta de um dispositivo na cidade ao qual o(a) adolescente/jovem se vincula por inclusão voluntária e que tem por premissa acolher os impasses com a liberdade, construindo com ele(a) escolhas sustentáveis, de modo que possa, no futuro, prescindir desse acompanhamento.

Conforme previsto em sua Metodologia:

Apesar de intervir nos mesmos eixos que as medidas socioeducativas, o Se Liga não se constitui como uma continuidade destas, tanto por ser um Programa de livre participação, quanto por não ter como objeto de trabalho a responsabilização do adolescente por um ato infracional. (MINAS GERAIS, 2012).

Assim, o Programa atua de modo a corroborar com a manutenção das garantias viabilizadas no processo de cumprimento da medida socioeducativa, fortalecendo as escolhas do(a) adolescente/jovem. Cabe ressaltar que a adesão do(a) egresso(a) não se configura como condicionalidade para o seu desligamento da medida.

Um ponto importante na atuação do Programa é que as construções a serem realizadas sejam pautadas no interesse do(a) adolescente, de forma que se constituam como possibilidades para um novo uso de sua liberdade, sendo o trabalho em rede ponto crucial, pois sua atuação tem foco no que o(a) adolescente/jovem endereça ao Se Liga. Nessa perspectiva, o Programa se propõe a construir com os(as) adolescentes/jovens alternativas ao envolvimento com a criminalidade e que os(as) mesmos(as) consigam sustentar; favorecer o rompimento de estigmas e consolidar uma rede de proteção parceira, que possibilite a liberdade com participação e cidadania; e contribuir para a redução do índice de reincidência nas trajetórias infracionais e de risco dos(as) adolescentes/jovens.

O Se Liga possui dois eixos de atuação: o primeiro é o que acontece enquanto o(a) adolescente ainda está cumprindo a medida socioeducativa e o segundo é o acompanhamento realizado após o término do cumprimento das medidas de privação e de restrição de liberdade. Cada eixo se apresenta como estratégia de fortalecimento do vínculo do(a) adolescente com o Programa e de ampliação de possibilidades em sua trajetória, da seguinte forma:

  1. Adolescente em cumprimento de medidas socioeducativas de privação e de restrição de liberdade: a atuação do programa nesse momento possui caráter sensibilizador no intuito de despertar o interesse do(a) adolescente pelo Se Liga, de modo que, ao ser desligado(a) o(a) adolescente possa fazer a opção pela adesão ao Programa de maneira autônoma e consciente do que este pode lhe ofertar.

A articulação do Programa Se Liga com a Unidade Socioeducativa é o primeiro passo para que sejam possíveis tanto as intervenções propostas quanto o despertar de interesse dos(as) adolescentes/jovens pelo Se Liga. Ambas as instituições devem trabalhar em parceria, visando a inclusão do(a) adolescente/jovem ao Programa após seu desligamento. Assim, são ações vinculadas a esse eixo os estudos de caso, a apresentação do Programa, as atividades externas às Unidades Socioeducativas, a circulação, o atendimento individual e as ações com a família.

  1. Adolescente desligada(o) da Unidade Socioeducativa (término de cumprimento da medida socioeducativa): se outrora todo um trabalho foi construído com o(a) adolescente/jovem durante a medida, a fim de despertar seu interesse pelo Programa, após o desligamento as intervenções possuem outro direcionamento. Logo, a conclusão da medida socioeducativa é o ponto de partida para a construção das intervenções cabíveis a cada caso. Após a inclusão do(a) adolescente/jovem no Se Liga, as temáticas de intervenção são: profissionalização, educação, trabalho e renda, saúde, cultura, esporte, lazer e família.

O acompanhamento do Programa Se Liga aos(às) adolescentes/jovens egressos(as) das medidas socioeducativas ocorre por meio de atendimentos e de articulação da rede. Na perspectiva dos atendimentos busca-se, sucintamente, promover formas de encontro, de participação e de atendimento do público do Se Liga.

A partir do atendimento o Programa orientará suas ações em rede e de articulação com os demais serviços de atendimento a adolescentes e a jovens. O trabalho em rede pauta-se, desse modo, na compreensão da demanda do público e na possibilidade de ampliação e de fortalecimento da rede de proteção socio comunitária de cada adolescente e jovem atendido(a).

Os atendimentos do Programa aos(às) adolescentes/jovens egressos se dá por meio do acolhimento, dos atendimentos individuais e coletivos, da visita domiciliar, das oficinas, da circulação, da articulação de rede e do atendimento a familiares.

A gestão do Programa é realizada pela Subsecretaria de Prevenção à Criminalidade da SEJUSP, por meio da Diretoria de Proteção da Juventude, e é executada pela Organização Social Instituto Elo. Atualmente, a área de abrangência do Se Liga compreende os municípios de Belo Horizonte, de Betim, de Contagem, de Ibirité, de Juiz de Fora, de Muriaé, de Ribeirão das Neves, de Sabará, de Santa Luzia, de Sete Lagoas e de Vespasiano, atendendo adolescentes que residem ou que pretendem residir nessas localidades. Faz-se imprescindível a ampliação da abrangência de modo que o Programa Se Liga seja implementado em todos os municípios onde há Unidades Socioeducativas de internação e de semiliberdade.

Comentario

17. PREVENÇÃO E COMBATE À VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL

A violência institucional pode vitimar adolescentes nos Centros Socioeducativos e nas Casas de Semiliberdade, sendo responsabilidade das Unidades e da SUASE desenvolverem ações de prevenção e combate.

Compreende-se por violência institucional qualquer tipo de violência exercida no contexto das Unidades Socioeducativas, englobando manifestações físicas, verbais, psicológicas ou quaisquer outras formas de violação de direitos em desfavor dos(as) adolescentes. Entende-se também por violência institucional a não oferta dos direitos e dos serviços que devem ser garantidos aos(às) adolescentes ao longo do cumprimento da medida socioeducativa por ação ou omissão de profissionais que atuam nas Unidades Socioeducativas, bem como a violência estrutural consistente na superlotação e na não oferta de condições adequadas de habitabilidade.

Considera-se, ainda, violência institucional abusos cometidos em virtude das relações de poder desiguais entre adolescentes e profissionais das equipes socioeducativas, negligência, omissão ou violação de direitos humanos.

Desse modo, cabe aos gestores e às equipes socioeducativas zelar pela efetivação da garantia de direitos individuais e sociais de todos(as) os(as) adolescentes que se encontram em cumprimento de medida socioeducativa nos Centros Socioeducativos e nas Casas de Semiliberdade, sem discriminação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, gênero, raça, etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição pessoal de desenvolvimento e aprendizagem, condição econômica, ambiente social, região e local de moradia ou outra condição que diferencie as pessoas, as famílias ou a comunidade em que vivem.

O(a) adolescente deve ser respeitado(a) em sua integralidade, assegurando-lhe ambiente seguro e favorável à socioeducação, sobressaindo-se sempre a ação pedagógica em toda e qualquer situação.

Diante de suspeita ou de constatação de violência institucional todo e qualquer profissional que atua em Unidade Socioeducativa tem a obrigação de, imediatamente, levar ao conhecimento da Equipe Diretiva (Diretor Geral, de Segurança e/ou de Atendimento) para que sejam adotadas as providências cabíveis, a saber: acolher toda e qualquer informação acerca de suspeita ou de constatação de violência institucional; conferir se há testemunhas e realizar oitivas, coleta de informações, verificação das imagens das câmeras do circuito interno, encaminhamentos à equipe de saúde da Unidade ou para atendimento externo; e proceder o preenchimento da Ficha de Notificação de Violência Interpessoal e/ou Autoprovocada.

Se os gestores da Unidade entenderem pela não necessidade de REDS, deverão reduzir a termo e formalizar por meio de relatório circunstanciado, registro em livro de ocorrências, dentre outros, todos os procedimentos realizados.

Caso os gestores entendam pela necessidade de REDS, devem realizar os trâmites necessários, conforme orientação e treinamentos ministrados pela DSS, indicando o gestor da Unidade que acolheu a denúncia do profissional ou o adolescente como testemunha que tomou conhecimento dos fatos. Finalizado o REDS, o Diretor de Segurança deverá solicitar junto à Polícia Civil a guia de IML e proceder com o encaminhamento do(a) adolescente para realização dos exames devidos.

Todas as denúncias e os relatórios das apurações realizadas devem ser encaminhados à DSS que, em conjunto com as demais Diretorias da SUASE, traçará estratégias de enfrentamento, com intervenção direta em Unidades que apresentam reiterados episódios de suposta ou de comprovada violência institucional.

Diante de indícios de autoria e de materialidade de irregularidades no serviço público pode ser instaurada sindicância ou processo administrativo disciplinar – PAD, conforme preconiza o art. 220 da Lei Estadual nº 869/1952 – Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de Minas Gerais.

Quando inexistir indícios de autoria e de materialidade para a instauração imediata de sindicância ou de PAD, a notícia de irregularidade em Unidades Socioeducativas será objeto de análise preliminar, por meio de Verificação Preliminar das Informações (VPI), determinadas pela Coordenação do Núcleo de Correição Administrativa (NUCAD) da SEJUSP, conforme Resolução Conjunta CGE/SESP nº 03/2017.

As VPIs são realizadas no âmbito das Unidades Socioeducativas por comissões instituídas pelo Diretor Geral, sendo indicados de 2 (dois) a 3 (três) servidores de carreira da SUASE. Cabe à comissão levantar informações, analisar documentos, realizar oitiva de servidores, de adolescentes e de terceiros envolvidos e, ao final, confeccionar relatório técnico conclusivo indicando qual medida a comissão entende ser cabível ao caso (se instauração de procedimento apuratório ou arquivamento). Em seguida, o referido processo é encaminhado para a Central de Apuração de Informações (CAO) da DSS, que, por sua vez, realiza a análise dos documentos e das informações levantadas pela comissão da Unidade Socioeducativa.

Na hipótese da ausência de algum documento ou de informação relevante para o caso, a CAO remete o processo de volta para a Unidade, a fim de que haja a complementação pertinente. Retornando o processo com a complementação solicitada ou já instruído inicialmente com as documentações e as informações necessárias, a CAO remete o processo para a Controladoria Setorial da SEJUSP, a fim de que as providências cabíveis sejam tomadas.

Cabe às instituições que realizam gestão de Unidades Socioeducativas em parceria com a SUASE adotar procedimento análogo ao descrito neste Programa de Atendimento e remeter à SUASE destacando as medidas e providências adotadas.

Cabe aos Diretores das Unidades Socioeducativas construir com as equipes sob sua gestão as estratégias de prevenção à violência institucional e garantia dos direitos aos(às) adolescentes por meio de espaços de formação continuada, incentivo à participação dos(as) trabalhadores(as) em cursos voltados a temáticas afetas aos Direitos Humanos ofertados pela SEJUSP, realização de rodas de conversa, diálogo e círculos restaurativos, difusão da comunicação não violenta e da mediação de conflitos enquanto estratégias de intervenção, realização de oficinas temáticas com profissionais, atividades em grupo com adolescentes e famílias com o intuito de coibir práticas que violem os direitos dos(as) adolescentes e favorecer práticas pedagógicas.

Comentario

18. MONITORAMENTO    DA     EXECUÇÃO    DA     POLÍTICA     DE    ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO

O Painel SUASE é a ferramenta web utilizada para a coleta, o armazenamento, o processamento e a gestão dos dados gerados pelas Unidades Socioeducativas no Estado de Minas Gerais, sendo possível cadastrar os(as) adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa, bem como o registrar os atendimentos prestados e as atividades realizadas, compondo, assim, a base de dados que viabiliza a realização de consultas, de extração, de monitoramento e de análise das informações.

O sistema de informação contribui para a otimização dos esforços das Unidades Socioeducativas possibilitando os registros dos dados em tempo real e o acompanhamento da execução da política socioeducativa pela SUASE.As principais funcionalidades do Painel SUASE são: cadastramento das Unidades Socioeducativas, de usuários do sistema, de profissionais, dos(as) adolescentes e de solicitações de vagas; registro de atendimentos aos(às) adolescentes acautelados(as) e da movimentação10 destes; monitoramento em tempo real da lotação das Unidades; gestão das vagas, extração de dados e relatórios.

A Diretoria de Planejamento e Monitoramento Socioeducativo (DMS) da SUASE é responsável pelo desenvolvimento, gerenciamento, manutenção evolutiva e corretiva das ferramentas de coleta e armazenamento de dados, capacitação continuada, gestão e suporte aos usuários dos sistemas desenvolvidos. Realiza, também, a administração dos bancos de dados, modernização e aprimoramento contínuo dos módulos informatizados do sistema, além de gerar relatórios estatísticos para o atendimento de demandas internas e externas que subsidiam o monitoramento e a avaliação da política pública.

O monitoramento consiste nas análises quantitativa e qualitativa dos dados referentes ao atendimento ofertado aos(às) adolescentes, com a construção de relatórios

10 Movimentação: admissão, desligamento e transferências

analíticos e infográficos, elaboração de métricas e indicadores11, e acompanhamento dos indicadores e índices12.Com o monitoramento é possível realizar o levantamento, a organização e a disseminação de informações para o ciclo de gestão da política pública, a fim de subsidiar o aprimoramento de seu desenho e da gestão, garantindo a transparência da ação governamental e provendo evidências do mérito e da efetividade da política.

Na elaboração das diretrizes executivas da socioeducação em Minas Gerais são utilizados instrumentos permanentes de monitoramento e de avaliação que visam medir a eficácia e a eficiência do trabalho e sistematizar as informações necessárias para subsidiar o aprimoramento da política pública. O atendimento realizado pelas Unidades é mensurado por meio de índices e de indicadores de desempenho previstos no Programa de Análise e Gerenciamento do Sistema Socioeducativo de Minas Gerais, o SUASEPlan13.

Os Índices SUASEPlan avaliam qualitativamente o atendimento nas Unidades Socioeducativas, baseados nos eixos norteadores estabelecidos pelo ECA e pelo SINASE.A SUASE realiza o acompanhamento dos índices e indicadores elaborados de acordo com critérios técnicos e metodológicos, compreendendo:

·         Coleta dos Dados: as Unidades Socioeducativas realizam de forma tempestiva a inserção dos dados referentes aos atendimentos prestados compondo, assim, a base para o cálculo dos indicadores;

·         Monitoramento e Avaliação: a SUASE analisa a execução dos índices e indicadores das Unidades Socioeducativas, identificando não-conformidades e/ou a tendência de não execução;

11Indicadores: Valores quantitativos aferidos ao longo do tempo que permitem adquirir informações sobre atributos, características e resultados de um serviço, produto, sistema ou processo em específico. Servem de parâmetros de referências para medir a eficiência, eficácia e a efetividade de processos organizacionais 12Índice: Instrumento de tomada de decisão e previsão composto por um conjunto de indicadores

13O SUASEPlan baseia-se no monitoramento analítico e no método PDCA, ou seja, planejamento (Plan), execução (Do), verificação (Check) e atuação (Action). Esta metodologia amplamente conhecida em Administração possibilita ao gestor ter governabilidade das atividades que se encontram sob a sua responsabilidade.

·         Plano de Ação para Correção: em casos de não-conformidade na execução dos índices e indicadores, são construídos planos de ação em conjunto com a Unidade Socioeducativa. No plano de ação ocorre a delimitação do problema, dos prazos para sua resolução, bem como os responsáveis pela execução.

Destaca-se que o monitoramento e a avaliação da execução do atendimento socioeducativo são fundamentais para o aprimoramento e a qualificação da socioeducação enquanto política pública, permitindo efetivo acompanhamento das ações estratégicas, dos eixos norteadores e dos direitos que são legalmente garantidos aos(às) adolescentes. Para tanto, é essencial que os gestores de Unidades e as equipes socioeducativas, assim como o núcleo gerencial da SUASE, façam uso adequado e corrente das ferramentas de gestão e de monitoramento estabelecidas e promovam discussões e reflexões acerca do realizado, visando promover cada vez mais práticas pedagógicas, inovadoras e garantidoras de direitos na execução das medidas socioeducativas.

Comentario

19. DOCUMENTOS ORIENTADORES DA POLÍTICA DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO DE MINAS GERAIS

Em consonância com os dispositivos legais que normatizam e regulamentam as medidas socioeducativas, a SUASE constituiu seu arcabouço metodológico, o qual estabelece os parâmetros pedagógicos para a execução das medidas socioeducativas de semiliberdade, de internação, de internação sanção e de internação provisória em todo território mineiro. Assim, apresenta-se, brevemente, o rol dos documentos orientadores da Política de Atendimento Socioeducativo de Minas Gerais:

  • POLÍTICA DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO DE MINAS GERAIS (2012-

2013): Documento da SUASE que tem como objetivo traçar as diretrizes do trabalho com o adolescente autor de ato infracional.

  • METODOLOGIA DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE SEMILIBERDADE (2012-

2013): Orienta o atendimento ao adolescente em medida socioeducativa de semiliberdade em todo o Estado, conforme as determinações do ECA, em consonância com a Lei do SINASE e com os princípios extraídos da políticaestadual.

  • METODOLOGIA DE ATENDIMENTO DA INTERNAÇÃO PROVISÓRIA (2012):

Orienta o atendimento ao adolescente em medida de internação provisória em todo o Estado, conforme as determinações do ECA, em consonância com a Lei do SINASE e com os princípios extraídos da política estadual.

  • METODOLOGIA DA INTERNAÇÃO SANÇÃO (2012): Orienta o atendimento ao adolescente em medida de internação sanção em todo o Estado, conforme as determinações do ECA, em consonância com a Lei do SINASE e com os princípios extraídos da política estadual.
  • METODOLOGIA    DE    ATENDIMENTO    DA    MEDIDA    SOCIOEDUCATIVA   DE

INTERNAÇÃO (2012): Orienta o atendimento ao adolescente em cumprimento da medida de internação em todo o Estado, conforme as determinações do ECA, em consonância com a Lei do SINASE e com os princípios extraídos da política estadual.

  • METODOLOGIA PARA RELATÓRIOS (2012): Orienta quanto à construção técnica e redação dos documentos jurídicos (PIA e Relatórios) que compõem o processo de atendimento, de acompanhamento e de avaliação socioeducativa.
  • METODOLOGIA  DE  ATENDIMENTO  PARA  A  ADOLESCENTE  MÃE  COM CRIANÇA ATÉ OS SEIS MESES DE IDADE (2016): Orienta o atendimento à adolescente que esteja vivenciando a maternidade em período concomitante ao cumprimento das medidas de internação e de internação provisória no Centro Socioeducativo São Jerônimo.
  • MANUAL DE OFICINAS DAS UNIDADES SOCIOEDUCATIVAS (2013): Consolida orientações para nortear a condução do trabalho, aperfeiçoando e ampliando as possibilidades e a discussão sobre os temas abordados nas oficinas.
  • PORTARIA Nº 1.082, de 23 DE MAIO DE 2014: Redefine as diretrizes da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes em Conflito com a Lei, em Regime de Internação e Internação Provisória (PNAISARI).
  • DOCUMENTO ORIENTADOR PARA O DIREITO DO ADOLESCENTE A ASSISTÊNCIA RELIGIOSA INTERNAÇÃO E INTERNAÇÃO PROVISÓRIA (2017):

Consolida orientações acerca da oferta e da garantia do direito dos(as)adolescentes às atividades de Assistência Religiosa nas MSE de internação (sanção e por prazo indeterminado) e de internação provisória.

  • DOCUMENTO  ORIENTADOR  PARA  O  DIREITO  DO  ADOLESCENTE  A ASSISTÊNCIA RELIGIOSA SEMILIBERDADE (2017): Consolida orientaçõesacerca da oferta e da garantia do direito dos(as) adolescentes às atividades de Assistência Religiosa na MSE de semiliberdade.
  • REGIMENTO ÚNICO DOS CENTROS SOCIOEDUCATIVOS DO ESTADO DE MINAS GERAIS (2017): Institui, no âmbito da SUASE, o Regimento Único dos Centros Socioeducativos do Estado de Minas Gerais.
  • REGIMENTO ÚNICO DAS UNIDADES DE EXECUÇÃO DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE SEMILIBERDADE (2017): Institui, no âmbito da SUASE, o Regimento Único das Unidades de Execução da Medida Socioeducativa de Semiliberdade.
  • METODOLOGIA DE ATENDIMENTO ÀS FAMÍLIAS (2017): Institui metodologia de trabalho com as famílias dos(as) adolescentes em cumprimento das medidas socioeducativas de internação sanção, de internação provisória, de semiliberdade e de internação, visando delinear um trabalho consistente acerca dos vínculos familiares e comunitários e o acompanhamento da medida.
  • PIA – PLANO INDIVIDUAL DE ATENDIMENTO (2017): Apresenta a metodologia de construção do PIA enquanto instrumento metodológico que organiza o trabalho institucional a partir das considerações técnicas que destacam os aspectos fundamentais a serem priorizados na condução do atendimento com cada adolescente e que possibilita que o acompanhamento da medida socioeducativa aconteça a partir do que cada adolescente apresenta nos diversos espaços institucionais, nas atividades externas, no discurso que traz sobre si mesmo(a) e sobre sua relação com o outro nos espaços de convívio social.
  • FORMULÁRIO DO PLANO INDIVIDUAL DE ATENDIMENTO (2017): Documento padronizado para construção do PIA em todas as Unidades socioeducativas de internação e de semiliberdade.
  • CARTILHA UM NOVO OLHAR PROGRAMA DE PROTEÇÃO A CRIANÇAS E ADOLESCENTES AMEAÇADOS DE MORTE - PPCAAM (2017): Dá conhecimento aos parceiros da rede de proteção do PPCAAM e do Sistema de Garantia de Direitos (SGD), bem como orienta as equipes técnicas na atuação dos casos de proteção para que sejam conduzidos de maneira uniforme e segura.
  • PLANO DECENAL DOS DIREITOS HUMANOS DE CRIANÇAS EADOLESCENTES (2017-2027): guia para asseverar a transversalidade da pauta dos direitos da criança e do adolescente, envolvendo compromissos de várias áreas do Governo e da sociedade, norteando a implementação e o fortalecimento de políticas públicas que efetivamente protejam crianças e adolescentes.
  • METODOLOGIA DE ARTICULAÇÃO DA REDE E GARANTIA DE DIREITOS (2018):

Consolida orientações para que as equipes das Casas de Semiliberdade e dos Centros Socioeducativos de Internação Provisória e de Internação possam pautar suas ações, no que diz respeito à articulação da rede e à garantia dedireitos para encaminhamento qualificado tanto do adolescente quanto de seus familiares.

  • MANUAL DE NORMAS E ROTINAS CONSULTÓRIO ODONTOLÓGICO CENTRO SOCIOEDUCATIVO (2018): Orienta quanto às normas e às rotinas a serem observadas no atendimento odontológico realizado nos consultórios dos Centros Socioeducativos do Estado de Minas Gerais.
  • PROTOCOLO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE BUCAL NO SISTEMA SOCIEDUCATIVO DO ESTADO DE MINAS GERAIS (2018): Descreve o perfil e as principais habilidades e competências do Cirurgião Dentista na atuação em Unidades Socioeducativas de Minas Gerais, com intuito de direcionar as ações de saúde bucal aos adolescentes, desenvolvendo condições adequadas de trabalho e qualificando o atendimento socioeducativo prestado.
  • METODOLOGIA DE PROFISSIONALIZAÇÃO DO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO DE MINAS GERAIS (2018): Orienta acerca do desenvolvimento do eixo profissionalização no âmbito do sistema socioeducativo de Minas Gerais.
  • RESOLUÇÃO SESP Nº 18, DE 25 DE ABRIL DE 2018: Estabelece diretrizes e normativas para o atendimento e o tratamento da pessoa LGBT no âmbito do Sistema Socioeducativo do Estado de Minas Gerais.
  • FLUXO DE ENCAMINHAMENTO PARA ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL PARA ADOLESCENTES QUE RESIDEM EM BELO HORIZONTE (2017-2019): Traça estratégias para melhor condução dos casos de adolescentes, residentes em Belo Horizonte, em cumprimento de MSE de semiliberdade e internação, que não possuem referência familiar, indicando a necessidade de que na ocasião do desligamento da medida, ou da progressão para o meio aberto, ocorra o encaminhamento para o acolhimento institucional.
  • FLUXO  DE  ENCAMINHAMENTO  PARA  ACOLHIMENTO  INSTITUCIONAL ADOLESCENTES ACAUTELADOS EM BH (2019): Traça estratégias para melhor condução dos casos de adolescentes que cumprem medida socioeducativa de semiliberdade ou internação fora der sua comarca de origem e que não possuem referência familiar, indicando a necessidade de que na ocasião do desligamento da medida, ou da progressão para o meio aberto, ocorra o encaminhamento para o acolhimento institucional em sua comarca de origem.
  • TERMO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA ENTRE EMG/SEE E SESP/MG (2019):

Estabelece a cooperação mútua entre a SEE/MG e a SESP/MG para o atendimento dos adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação e de semiliberdade, por meio das ofertas de Educação Básica, deeducação integral e integrada para medida de internação e acompanhamentopedagógico para os(as) adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação provisória em todo Estado de Minas Gerais.

  • PROGRAMA DESCUBRA (2019). Cooperação Interinstitucional n° 82/2019: Institui o Programa Descubra, visando ao desenvolvimento de ações articuladas para ampliar as oportunidades de inclusão de adolescentes e de jovens em condição de vulnerabilidade, especialmente aqueles em cumprimento ou egressos de medidas socioeducativas, em situação de acolhimento institucional ou resgatados de situação de trabalho infantil, em programas de aprendizagem e cursos de formaçãoinicial e continuada (FIC) ou qualificação profissional, em todo o Estado de Minas Gerais.
  • PROTOCOLO PARA PRIMEIROS SOCORROS NAS UNIDADES SOCIOEDUCATIVAS

(2019): Orienta os profissionais atuantes nas Unidades Socioeducativas do Estado de Minas Gerais, sobre as condutas e encaminhamentos a serem adotados nas eventuais situações consideradas como urgência e/ou emergência em saúde que possam se apresentar na rotina das Unidades Socioeducativas de Minas Gerais.

  • NOTIFICAÇÃODEVIOLÊNCIAINTERPESSOAL/AUTOPROVOCADANOSISTEMA SOCIOEDUCATIVO: ORIENTAÇÕESGERAIS (2019): orienta os profissionais das Unidades Socioeducativas quanto ao preenchimento da Ficha de Notificação de Violência Interpessoal/Autoprovocada no Sistema Socioeducativo.
  • PLANO DE PREVENÇÃO AO SUICÍDIO NAS UNIDADES SOCIOEDUCATIVAS DE MINAS GERAIS (2020): Orienta os profissionais das Unidades Socioeducativas quanto à temática do suicídio na adolescência, especialmente de adolescentes em cumprimento de MSE de Internação, de Internação Provisória e de Semiliberdade.
  • PORTARIA SUASE Nº 15 DE 28 DE AGOSTO DE 2020: Dispõe sobre o fluxo de encaminhamento de adolescentes do sexo masculino para as Unidades de internação provisória de Belo Horizonte.
  • PROPOSTA  PEDAGÓGICA  PROJETO  PILOTO  DA  APAC  JUVENIL(2020):

Estabelece princípios de diretrizes que devem orientar o trabalho na APAC Juvenil de Frutal, nas modalidades internação provisória, medida socioeducativa de internação e medida socioeducativa de semiliberdade.

  • PROGRAMA SE LIGA (2021): Orienta a execução do trabalho no âmbito do Programa de Acompanhamento ao Egresso das Medidas Socioeducativas de Semiliberdade e de Internação em Minas Gerais.
  • RESOLUÇÃO SEJUSP Nº 211 DE 24 DE AGOSTO DE 2021: Dispõe sobre a Agência Central de Inteligência Socioeducativa da SUASE do Estado de Minas Gerais.
  • RESOLUÇÃO SEJUSP Nº 228 DE 14 DE SETEMBRO DE 2021: Dispõe sobre a criação do Grupamento de Ações Rápidas – GAR, do Sistema Socioeducativo de Minas Gerais, para intervenções em eventos de segurança de média e de alta complexidade nas Unidades de Privação de Liberdade subordinadas à SUASE da SEJUSP.
  • RESOLUÇÃO SEJUSP N° 334 DE 30 DE NOVEMBRO DE 2021: Dispõe sobre o uso de Equipamentos de Proteção Individual e Instrumentos de Menor Potencial Ofensivo, pelos Agentes de Segurança Socioeducativos integrantes do Grupamento de Ações Rápida – GAR, em eventos de segurança de média e de alta complexidade nas Unidades de Privação de Liberdade subordinadas à SUASE da SEJUSP.
  • RECOMENDAÇÕES PARA O ATENDIMENTO E ACOMPANHAMENTO SOCIOASSISTENCIAL DAS FAMILIAS E ADOLESCENTES EM CUMPRIMENTO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS DE INTERNAÇÃO, SEMILIBERDADE E EGRESSOS da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social – SEDESE (2021): orienta os municípios para o atendimento na rede socioassistencial, das famílias e adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas de internação e semiliberdade e adolescentes egressos do Sistema Socioeducativo, em especial os que cumprem medidas fora do seu município de origem e que ao término precisam retornar para o seu município.
  • RESOLUÇÃO CONJUNTA SEJUSP/TJMG/MPMG/DPMG/PCMG Nº 18, DE 15 DE DEZEMBRO DE 2021: Dispõe sobre a criação e a regulamentação da Central de Vagas no Sistema Socioeducativo do Estado de Minas Gerais, disciplinando procedimentos administrativos para o ingresso e a transferência de adolescentes em conflito com a lei nas unidades socioeducativas, e dá outras providências.
  • RESOLUÇÃO CONJUNTA SEE/SEJUSP/ Nº 09, DE 17 DE DEZEMBRO DE 2021:

Estabelece as normas conjuntas e as diretrizes para o processo de escolarização dos(as) adolescentes e dos(as) jovens em cumprimento de medida socioeducativa no Estado de Minas Gerais.

  • RESOLUÇÃO SEJUSP Nº 498, 1º DE JULHO DE 2022: Institui as Normas e Procedimentos de Segurança do Sistema Socioeducativo de Minas Gerais - NORPSS, no âmbito da SEJUSP.
  • NOTA TÉCNICA Nº 18/SES/SUBPAS-SRAS-DSMAD/2022: Informa sobre fluxo da Rede de Atenção Psicossocial para adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa e pessoas privadas de liberdade que apresentem sofrimento/transtorno mental e/ou devido a necessidades de uso prejudicial de álcool e de outras drogas. 
  • CARTILHA CONVITE À SOCIOEDUCAÇÃO (2022): Versa sobre temas relevantes na construção do trabalho na socioeducação, tendo como norte o Decreto 47867, de 19 de fevereiro de 2020, que fixa as atribuições específicas do cargo de Assistente Executivo de Defesa Social, no exercício da função de Auxiliar Educacional.
  • FLUXO DE ATENDIMENTO EDUCACIONAL E SOCIOASSISTENCIAL AOS ADOLESCENTES EGRESSOS DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS DE SEMILIBERDADE E INTERNAÇÃO E SUAS FAMÍLIAS (2022): Estabelece os parâmetros e procedimentos, pactuados entre a Prefeitura de Belo Horizonte e a Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo, para viabilizar a inserção e o acompanhamento do(a) adolescente e sua família na rede educacional e socioassistencial no município de Belo Horizonte.
  • PLANO DE PREVENÇÃO E ENFRENTAMENTO À TRANSFOBIA NO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO DE MINAS GERAIS (em revisão, publicação prevista para 2023): Estabelece diretrizes e plano de ação para qualificação do atendimento à população LGBT nas Unidades Socioeducativas de Minas Gerais.

Os documentos orientadores supra foram consolidados ao longo dos anos e são aprimorados sempre que necessário, considerando-se o caráter dinâmico do público ao qual as medidas socioeducativas se destinam e as inovações conceituais e legais que se impõem no cotidiano do trabalho.

Neste sentido, ressalta-se que tais documentos não são estáticos, sendo passíveis de revisões, de alterações e de atualizações a fim de promover adequações às novas realidades e agregar qualidade ao atendimento socioeducativo, tendo-se em perspectiva a centralidade dos aspectos pedagógicos e a garantia de direitos aos(às) adolescentes.

Comentario

20.ORIENTAÇÕES ÀS UNIDADES SOCIOEDUCATIVAS PARA ELABORAÇÃO DO PROJETO PEDAGÓGICO

A partir da legislação vigente, das diretrizes contidas neste Programa de Atendimento e em outros documentos orientadores da Socioeducação, as Casas de Semiliberdade e os Centros Socioeducativos devem elaborar, revisar e atualizar seu Projeto Pedagógico (PP).

A Unidade Socioeducativa é a base física para a organização e o funcionamento do Programa de Atendimento, com a especificação do regime de atendimento, ou seja, da medida socioeducativa a ser executada. Conforme já mencionado, em Minas Gerais, o CEDCA publicou a Deliberação nº 01 de 2022, que dispõe sobre a inscrição dos programas de atendimento de internação e de semiliberdade no referido Conselho, elencando documentos e requisitos indispensáveis para efetivação deste ato, dentre os quais se encontra a apresentação de Projeto Pedagógico específico.

Reconhecida a sua importância como orientador da ação socioeducativa, o PP é apresentado como documento próprio, ordenador de ações e de gestão do atendimento socioeducativo. Tem como objetivo estabelecer parâmetros para atendimento ao(à) adolescente, com ênfase nas ações que perpassam os eixos das medidas socioeducativas, indicando como devem ser as estratégias operacionais das equipes multidisciplinares, com o fim de alinhar os conceitos e as bases éticas e pedagógicas a serem adotadas pela comunidade socioeducativa.

Conforme prevê a Deliberação supracitada, esse documento deve conter, deforma clara e em consonância com os princípios do SINASE: os seus objetivos gerais e específicos; a previsão de revisão; os fundamentos teórico-metodológicos; a capacidade da unidade; o público alvo; especificidades do público atendido (recorte etário, sexo e gênero, perfil socioeconômico, raça/cor etc.); o planejamento de ações e de atividades; osrecursos humanos e financeiros; as questões regionais da unidade; a forma de monitoramento e avaliação dos resultados; o organograma; o fluxograma; rotina institucional contemplando as reuniões das equipes, os estudos de caso, a elaboração e o acompanhamento do PIA; etc.

Faz-se importante garantir a gestão participativa na construção do PP por meio de um processo democrático e que envolva a comunidade socioeducativa, especialmente o(a) adolescente e a sua família, assim como os parceiros externos que enriquecem e qualificam o atendimento. Constando a visão de todos, o PP deve ser construído a partir de um planejamento participativo e avaliativo, fortalecendo o papel da família no cumprimento da medida e valorizando as juventudes como sujeitos de direitos, incentivando o seu protagonismo.

Nesse sentido, encontra-se anexa14 uma proposta de aplicação dos Diagnósticos Situacionais, como uma possibilidade de subsidiar a Unidade Socioeducativa na inclusão e na participação desses atores no processo em que, por meio de um questionário, busca- se apuração dos resultados, sendo importante constar de que forma eles contribuíram na construção do PP.

Os requisitos relacionados ao PP, entre outros tantos, encontram-se detalhados nos documentos, como este Programa de Atendimento; nas Metodologias do Atendimento Socioeducativo dos regimes de Semiliberdade, de Internação, de Internação Sanção, de Internação Provisória; nos Regimentos Internos, na Metodologia do PIA; nas NORPSS; bem como nos demais documentos orientadores da execução das medidas no âmbito do Estado.

A elaboração do PP busca, então, instrumentalizar e operacionalizar a execução da medida socioeducativa de acordo com o Programa de Atendimento e as Metodologias da SUASE, prezando simultaneamente por um alinhamento conceitual e metodológico, além de ressaltar as especificidades da execução de cada Unidade Socioeducativa. Assim, esse documento traduz a identidade da instituição, sendo importante contemplar a autonomia da Unidade na construção e no apontamento da condução do trabalho realizado.

14 Anexo 1: Roteiro para construção do Projeto Pedagógico (PP)

Além disso, pretende-se planejar as ações a serem desenvolvidas garantindo avanços e abrindo espaço para propostas inovadoras; organizar a rotina das Unidades, fundamentada em ações e em projetos referenciados nos eixos da medida socioeducativa; consolidar o trabalho desenvolvido pela Unidade de modo a qualificar a articulação com a rede; apresentar as ações e as formas de atendimento para o fortalecimento dos vínculos familiares; assegurar a execução individualizada da medida socioeducativa por meio do PIA e fundamentar os métodos e as técnicas pedagógicas que favoreçam a garantia de direitos e a responsabilização do (a) adolescente.

Por fim, cada Unidade Socioeducativa deverá remeter o PP à SUASE a cada reavaliação, para fins de validação, seguindo o Roteiro para a Construção do Projeto Pedagógico, sendo necessário contemplar o prazo recomendado pela Deliberação para o envio ao CEDCA a cada 2 (dois) anos. Considerando esse prazo, é importante que as construções constantes no PP englobem ações e planejamento que contemplem todo o período até que seja construída a revisão do documento. Além disso, é importante que sejam estabelecidos fluxos e estratégias de monitoramento e de avaliação internos na instituição, buscando acompanhar se o PP atende às especificidades dentro da Unidade de forma integrada.

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